Microsoft Word Cait London Luciana


Forasteiro Sonhador

Cait London

Desejo Homem do Mês nº 30

Copyright © 1995 by Lois Kleinsasser

Originalmente publicado em 1995 pela Silhouette Books

Divisão da Harlequin Enterprises Limited.

Título original: Mr. Easy

Tradução: Cláudia Sant'Ana Martins

EDITORA NOVA CULTURAL

uma divisão do Círculo do Livro Ltda.

Alameda Ministro Rocha Azevedo, 346 - 2° andar

CEP 01410-901 - São Paulo - Brasil

Copyright para a língua portuguesa: 1995 CÍRCULO DO LIVRO LTDA.

Fotocomposição: Círculo do Livro Impressão e acabamento: Gráfica

Este livro faz parte de um projeto sem fins lucrativos.

Sua distribuição é livre e sua comercialização estritamente proibida.

Cultura: um bem universal.

Digitalização: Palas Atenéia

Revisão: Ana Cristina

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Ele encontrou a filha. Agora precisa de uma esposa!

O que Brad Remington não podia dizer: “Oi, sou o pai desaparecido há muito tempo. Tudo que lhe contaram a meu respeito é mentira!”

O que ele disse: “Oi, sou um forasteiro na cidade. Prazer em conhecê-la.”

Proibido de ver a filha desde o nascimento, Brad finalmente a encontrou. Por enquanto, porém, resolveu manter sua identidade em segredo. É que sua filha vivia sob as asas protetoras de Samantha Ames, que não o deixava se aproximar de nenhuma das duas!

CAPÍTULO UM

Pescaria com mosca artificial e mulheres são duas coisas que exigem paciência", pensou Brad enquanto amarrava habilmente uma linha vermelha encerada em torno do anzol. O terceiro sábado de maio, abertura da temporada de pesca da truta, era a época perfeita para testar sua nova isca artificial: as trutas preferiam iscas que se parecessem aos insetos do rio.

Mulheres sensíveis, emotivas e protetoras como Samantha Jane Ames também precisavam de uma isca especial.

Para fazer sua demonstração, Brad escolhera uma choupana distante, perto do rio repleto de trutas. O rio Montana lhe fornecia amplas condições de testar suas famosas iscas e privacidade para a demonstração que faria a Samantha. Sendo um lobo solitário, queria estudar o adversário, descobrir-lhe as fraquezas antes de jogar a linha.

Samantha, l,80m de altura, possuía cabelos ruivos dourados, repartidos ao lado, sedosos e com cachos na altura dos ombros. Sempre que via Brad, seus olhos se tornavam cinza-esfumaçados sob os grandes óculos com que lia o jornal.

Samantha virara anjo da guarda de duas pessoas que Brad queria conhecer melhor: sua filha, Lúcia, e sua neta, Carina. A mãe de Lúcia trocara-lhe o sobrenome para Smith, para que não fosse descoberta. Levada para longe do pai quando bebê, Lúcia nem sabia que o sobrenome dele era Remington.

Quando Brad entrara pela primeira vez no bar de Samantha, o Sammy's, há três meses, Lúcia o encarara. Depois dera um imenso sorriso e outro pedaço de torta para Danny Rollins, sentado ao lado de Brad ao balcão.

Quando vira Lúcia, sua vida parecera se iluminar por dentro, embora o coração se contraísse de tristeza porque ela não o conhecia. Havia sido levada para longe dele ainda muito nova.

Quando Brad voltara a atenção a Samantha, esta derramara um copo d'água sobre o balcão. A seguir, atirara-lhe o cardápio com uma expressão hostil, irada, e perguntara:

— O que deseja?

Há três meses, Samantha lhe bloqueava o acesso à filha. Como Lúcia trabalhasse como garçonete para Samantha e fosse sua protegida, Brad tivera poucas oportunidades de se apresentar como planejara.

Iria puxar Samantha para fora daquele rio... Iria estudá-la, descobrir seus pontos fracos e preparar a isca.

Cortou com cuidado as asas da mosca com a tesoura que projetara especialmente para essa tarefa e que exibia a marca de sua companhia. Samantha sempre deixava bem claras suas preferências. Como houvesse crescido na cidadezinha de Elegance, em Montana, e gostasse de todos de lá, dava-lhes uma segunda fatia de sua famosa torta como "cortesia da casa". Esse "todos" incluía diversos ex-namorados, motoristas de caminhão e qualquer um exceto Brad. O modo como Samantha demonstrara imediata desconfiança e antipatia em relação a ele perturbara as águas normalmente calmas de sua vida emocional.

Brad ficava aborrecido com a interferência dela em sua relação com a filha e com o fato de não receber uma segunda fatia de torta.

Estudou a mosca que estava criando com a paciência e a lógica que o tornara pescador tarimbado e projetista de iscas.

Quando encontrava Samantha em seu bar, cercada de velhos amigos e às vezes dançando com um bando de ex-namorados ao som de músicas dos anos 50 tocadas na máquina automática, a famosa lógica de Brad ia por água abaixo. Queria aquela maldita segunda fatia de torta, oferecida pela própria Samantha.

A torta se transformara num almejado troféu. Se conseguisse pescar todas as espécies de trutas do mundo, descobriria o que faz uma mulher palpitar. Então chegaria até ela...

Na sua idade, quarenta e quatro, preparar um anzol para uma mulher relutante parecia um tanto estranho. Aquela fantasia de receber uma segunda fatia da deliciosa torta de Samantha era ridícula para um homem prático, metódico e determinado como ele.

O último momento de magia que experimentara na vida fora o nascimento de Lúcia, há vinte e um anos. Brad e sua filha haviam perdido uma vida inteira. Embora houvesse mantido vigilância sobre a filha através de seu advogado, sabia que não iria poder se apresentar logo a ela. Durante dois anos, se concentrara nos negócios e rezara para que ela não se mudasse. Sabia também que Lúcia precisava de tempo para se sentir segura na nova cidade. Pelo bem dela, refreou a ansiedade de conhecê-la; ela já enfrentara problemas suficientes.

Assim que Samantha engolisse a isca, o rio estaria livre para ele. Sendo um homem fechado, nem pensou em contar-lhe a verdade sobre Lúcia e Carina. Samantha era um livro aberto para seus amigos da cidade e iria criar problemas.

Nunca fora perverso. Agora, contudo, admitia que, nas profundezas de seu coração ferido, acalentava uma certa alegria ao pensar em Samantha vindo em sua direção... como uma truta relutante atraída pela isca artificial que ele projetara. Se Lúcia e Carina não estivessem envolvidas, até gostaria de fisgar Samantha...

O focinho rosa e preto de Leroy encostou no brim surrado das coxas de Brad. Este acariciou a testa do porquinho. A carícia de Leroy o reconfortou. Nos porcos a gente pode confiar, pensou, com tristeza. Tentou se lembrar do que poderia ter inspirado a fúria silenciosa de Samantha desde que o vira pela primeira vez, e que ressurgia sempre que entrava no bar.

Querendo afastar Leroy, jogou uma passa na direção do cercado. Leroy, que, na choupana, sentia falta do aparelho de televisão, foi pegá-la e se deitou, com saudades de seu programa favorito, A Porquinha Gostosa. Leroy preferia sua confortável cama no trailer, que Brad estacionara na periferia de Elegance.

Brad retomou o trabalho com a isca, movendo os dedos com destreza, ajustando o pêlo de castor e a chenille ao redor do anzol preso ao torno. Deu um piparote na isca, testando o pequeno tufo de pêlos que imitava as asas dos insetos do rio. O sol do início da tarde incidia sobre a cor vermelha do pêlo de castor, lembrando-lhe a cabeleira reluzente e sedosa de Samantha.

Sendo Samantha uma lutadora, Brad esperava uma batalha antes de fisgá-la. Especialista em fisgar peixes lutadores, percebeu que a hora de se revelar a Samantha estava chegando. Imaginou mentalmente a bela e fugidia truta, um arco prateado surgindo no rio turbulento, brigando com a linha... depois a imagem de Samantha... Não combinava.

Enquanto Brad preferia nadar sozinho nas águas sombrias e solitárias de sua vida, Samantha era o centro da comunidade. Era a casamenteira da cidade. Vivera toda a sua vida num só local e conhecia a todos. Seus olhos irradiavam ódio quando o via olhar para Lúcia.

Lúcia. Era como uma parte dele mesmo; apenas um bebê quando a mãe fugira, levando-a consigo...

Testou a isca com o dedo outra vez. Depois de todos aqueles anos lutando para encontrar Lúcia e Carina, para pagar suas contas anonimamente e assegurar-lhes uma vida segura em Montana, não ia deixar que uma mulher ruiva, volúvel e de longas pernas ficasse em seu caminho...

Pela estradinha tortuosa, Samantha, em seu pick-up, aproximou-se da choupana solitária. A tinta amarelo-canário cobriu-se de poeira da estrada. Seus dedos doíam de tensão e a pele cheirava a cebola frita. Preparara um prato de anéis de cebola enquanto refletia sobre a isca que Brad deixara cair no colo de seu pai. Separar metodicamente os anéis da cebola a acalmava. Precisava relaxar antes de enfrentar Brad, um homem soturno e maltrapilho como um lobo solitário.

Folheara o catálogo das Iscas Remington. A terapia da cebola não funcionara dessa vez. Brad balançara a isca bem na frente de seu pai. Então o Sr. Iscas Remington acrescentara a farpa ao anzol: queria falar com Samantha sobre suas receitas de torta. Brad adorava aquela massa folhada e queria aprender a prepará-la... Enquanto pensava se entregava ou não ao pai dela a franquia das famosas Iscas Remington. Como seus negócios precisassem de um impulso, o pai fisgara o anzol e correra com ele... até o bar de Samantha. Uma franquia das Iscas Remington, com uma demonstração do grande Brad Remington, daria impulso às vendas. George Michaelson lambera os beiços com massa de torta de cereja e fitara Samantha com olhos de súplica.

Samantha apertou o volante com força, praguejando. Tortas... Bah! Ele quer é Lúcia. Baba só de olhar para ela. E essa história de dar brinquedos e livros in-tantis para Carina... isso é só para conquistar Lúcia, também. Pois não vai conseguir. Ou não me chamo Samantha Jane Ames!

Tirou os óculos, soprou nas lentes e enxugou-os com a barra da camisa, presa com um nó abaixo dos seios.

Pensou no que fazer com Leroy, amigo de Brad. Não tinha medo de ficar sozinha com os dois homens numa choupana distante. Brad não a assustava, apesar da altura, dos ombros largos e do rosto rude, de homem vivido.

Estava zangada demais para sentir medo. Ele que tentasse usar de seus truques com outra, não com Lúcia.

Leroy teria de retirar-se quando o assunto Lúcia viesse à tona.

— Tarado! — murmurou ela para um esquilo que subia numa árvore.

— Sem-vergonha! — gritou às borboletas esvoaçando sobre as margaridas.

Tirou o lenço vermelho que lhe prendia os cabelos. Aumentou o volume do toca-fitas. O twist de Chubby Checker ressoou na pequena caminhonete e Samantha se concentrou nos buracos da estrada. Os freios guincharam quando parou junto à monstruosa caminhonete azul-escura de Brad, que trouxera o trailer prateado para a cidade no primeiro dia de fevereiro.

Quinze minutos depois que o velho trailer entrara na única rua da cidade, a Principal (na verdade uma estrada estadual), a cidade toda já comentava que Denty Lang alugara o terreno para o trailer do sr. Brad Remington.

Uma hora após sua chegada, Brad ocupara um banco ao balcão do bar e pedira o prato do dia: bife, batatas e salada. Apesar de limpa, sua roupa já vira melhores dias. Pareceria um homem comum do Oeste comendo seu almoço num bar, não fossem os buracos no jeans, a linha de pesca costurando um enorme rasgão e a camiseta com manchas de tinta. Os tênis estavam em frangalhos, os cordões amarrados com nós cegos e o. cabelo desgrenhado precisava desesperadamente de um corte.

A postura do maxilar, sob a barba negra, era rígida; os vincos em torno da boca pareciam indicar uma vida difícil.

A primeira vez que o vira olhando para Lúcia com ar enamorado, como se todos os seus sonhos girassem em torno daquelas mechas castanhas, como se quisesse abraçá-la... Samantha antipatizara com ele.

Lúcia era vulnerável demais. Com apenas vinte e um anos, lutava para criar uma filha de três. O testamento de um parente anônimo tornara-lhe a vida mais fácil. O benfeitor falecido legara-lhe uma casinha em Elegance e uma pequena renda se permanecesse na cidadezinha. Um advogado cuidava dos fundos depositados em seu nome.

Lúcia perdera um pouco de sua aparência frágil e fechada. Continuava magra e desajeitada, olhos sombrios e assustados por baixo de uma mecha de cabelos. Mesmo sendo tão jovem, a vida já lhe dera problemas demais. Não precisava de mais um, especialmente de um homem mais velho que parecia haver atravessado os sete degraus do inferno.

Brad se retraía quando algum dos amigos dela tentava abordá-lo. Agia como um desocupado, costurando o jeans rasgado com linha de pesca, embora fosse um famoso e bem-sucedido projetista de iscas de mosca artificial para pescar trutas.

A pele calejada de Brad Remington não evocava a imagem de um grande pescador e proprietário de uma empresa de iscas. Nos últimos tempos, ficava olhando para ela quando oferecia segundas fatias de torta aos clientes.

Sabendo reconhecer um olhar ameaçador, Samantha estampava um sorriso alegre e amistoso enquanto afastava Lúcia dele. As pessoas diziam que ele era um vagabundo, um lobo solitário, alguém em dificuldades. Maggie Crawford, dona do armarinho, queria que a cidade fizesse uma coleta para o forasteiro, achando que ele não tinha dinheiro suficiente para ir para outra cidade ou arranjar um emprego. Theodora Monroe achava que era um caso de coração partido; convidara-o para a refeição comunitária da igreja e recebera um "não, obrigado" em resposta.

Brad falava pouco e olhava muito. Nuvens negras e geladas se reuniam em torno dele. Parecia um vampiro em meio à neblina...

Samantha deixou que a música de Chubby violasse o silêncio da região por mais um instante. Então soltou os dedos do volante. Desligou o motor, notando a paz silenciosa que cercava a cabana de madeira que abrigava o pervertido e depravado sr. Brad Remington, tarado por Lúcia.

Não contara a ninguém de suas suspeitas, porque se o fizesse, os boatos começariam a rolar como uma bola de neve e Lúcia se magoaria.

Respirou fundo, comprimiu os lábios e saltou para fora da caminhonete. Aprumou os ombros e descobriu que, com a ajuda das botas, poderia encarar Brad Remington olho no olho.

Aos trinta e oito anos, Samantha era uma casamenteira de sucesso. Casara a maioria de seus ex-namorados, porque realmente não serviam para ela e, no fundo, queria que fossem felizes. Os olhos negros de Remington, a boca cerrada e os fios grisalhos entremeados às espessas ondas negras não combinavam com os olhos castanhos de Lúcia, nem com a sua juventude doce e ferida.

Remington não entendia indiretas...

Samantha colocara uma placa de "não toque em mim" em Lúcia. Remington, contudo, afundava o traseiro no banco do bar uma ou duas vezes por dia e ficava olhando para Lúcia; tentara puxar conversa com a garota e certa vez até estampara um sorriso de desejo em seus lábios rijos.

Não havia a menor chance de que aqueles lábios rijos tocassem os doces lábios de Lúcia.

Samantha bateu na porta da cabana. Esperava que o amigo de Remington, Leroy, não fosse gentil e amável, porque pretendia jogar duro com Remington. Não queria ferir emocionalmente uma alma delicada com seu plano kamikaze de jogar a bomba e sair correndo.

Se tivesse sorte, conseguiria a franquia para a loja de artigos esportivos do pai e ao mesmo tempo afastaria o lobo de Lúcia. Seria firme quanto a Lúcia e sedutora a respeito da franquia. Arrancaria de Brad uma decisão sensata em ambas as questões...

Uma série de guinchos e grunhidos excitados soaram ao mesmo tempo que a voz grave de Brad. — Entre!

Respirando fundo e rezando para não perder "a grande chance" da vida de seu pai, Samantha abriu a porta.

Brad estava sentado num canto ensolarado da sombria cabana. Samantha se encolheu de imediato diante de seu l,90m de altura. Praguejou com seus botões; imaginara encará-lo olhos nos olhos. O sol da tarde destacava-lhe o corpo esguio e Samantha quase engasgou. De camiseta e jeans surrado, ele parecia... fatal. Uma série de grunhidos e guinchos na altura de seu joelho a fizeram olhar para baixo.

— Este é Leroy — disse Brad, voltando a atenção para algo sobre a mesa.

— Leroy? — repetiu Samantha sem entender nada enquanto o focinho rosa e preto do porco farejava-lhe as longas pernas e as botas.

— Feche a porta. Se ele sair, vai se empanturrar de raízes que não vão lhe fazer nada bem — murmurou Brad, concentrando-se em sua tarefa.

Samantha fechou a porta.

— Estou aqui — declarou, como se desse más notícias.

— Ah-ah — replicou Brad, num tom distante, movendo as mãos vagarosamente sobre a mesa.

O porco a fitou com olhos espichados e jogou uma argola amarela ao redor do focinho.

— E esse o seu amigo? — perguntou, em seu tom mais ameaçador.

— Hummm.

— Bem... cá estou — tentou de novo, cheia de paciência. Vendo Brad continuar a estudar o objeto a sua frente, respirou fundo. Decidiu deixar de lado o critério de escolha de amigos de Brad e ir em frente. — Meu pai me contou que é o dono da Iscas Remington.

— Ah-ah.

Brad encaixou algo num torno minúsculo e apertou-o com gestos concisos e experientes. Samantha repeliu a admiração de que mãos tão grandes pudessem confeccionar as delicadas moscas artificiais. Não queria admirar nada naquele homem.

— Ele gostaria de ter a franquia das suas iscas. Falou que o senhor apareceu e mencionou que era o próprio Brad Remington, das Iscas Remington. O senhor é uma celebridade no mundo da pesca. — Samantha lembrou-se dos olhos do pai brilhando de fascinação e cobiça pela franquia da Remington. — Então por que quer conversar comigo sobre a franquia e tortas?

Depois de lançar essa pergunta direta, vendo Brad continuar entretido com sua engenhoca, olhou para Leroy, que a fitava ansiosamente balançando o anel no focinho. Agarrou o anel instintivamente e Leroy se afastou balançando a barriga. Samantha jogou-lhe o anel. Leroy o agarrou com vivacidade, grunhiu e trotou em sua direção, com um sorriso amigável. Jogou o anel de novo e, quando Leroy o apanhou, Brad apontou para um tapete vermelho amarfanhado.

O porco deu um guincho, mas trotou até o tapete e aterrissou ali suavemente. Depois de fitá-la por um instante, pegou a corrente e os arreios com a boca e sacudiu-os cheio de esperança.

Samantha imaginou que Leroy fosse o melhor que o vagabundo taciturno e pescador experiente pudesse arranjar como amigo.

— Se está interessado em fazer tortas, dou um beijo nesse porco — disse a Brad, impaciente para entrar no verdadeiro assunto: Lúcia. Quando Brad escolheu com cuidado uma pequena felpa e a levou à luz, ignorando Samantha, esta acrescentou:

— Não acha que é uma desonestidade fingir de vagabundo desempregado, quando na verdade é o próprio Remington das iscas?

Lamentou haver erguido o volume na última parte da frase. Os largos ombros de Brad se ergueram de leve.

— Estou falando com o senhor!

Brad inclinou a cabeça em direção a um velho banco a seu lado. Ela ainda não o vira sem a jaqueta de brim; a camiseta preta bem esticada nos ombros e na parte superior dos braços dava-lhe um ar de durão. Os tendões e músculos dos braços se mexeram por baixo da pele bronzeada e coberta de pêlos.

Tomando fôlego, Samantha andou até o banco e sentou-se. Cruzou os braços.

— Se der a franquia a meu pai, eu lhe ensino a fazer tortas. A de merengue é minha especialidade... alta e fofa... Bem, questão encerrada. Acordo fechado ou não?

Um músculo da face de Brad se contraiu. Recolheu uma pena cuidadosamente da mesa. Samantha apertou com força seu próprio braço. A "engenhoca" de Brad era ainda mais minuciosa e organizada quando vista de perto... tanto quanto o inventor era mais perigoso. Brad passou o dedo delicadamente sobre a pena. O gesto sedutor atraiu a atenção de Samantha.

Algo se revirou dentro dela, que tentou ignorar. Abriu a boca ao vê-lo inserir um anzol minúsculo no torno e fechá-lo com delicadeza. Brad acariciou o anzol de leve, com ternura, da farpa até a haste, num toque incrivelmente sensual. O movimento das grandes mãos era erótico, gracioso, hipnótico. Ela se lembrou de um filme em que a ponta dos dedos do homem roçava na pele nua da mulher...

Pestanejou, alarmada com seus pensamentos. Respirou fundo e falou:

— A loja de material esportivo do meu pai precisa mesmo da sua franquia. Se fizer uma demonstração das técnicas de pesca com mosca artificial na loja enquanto estiver aqui, os negócios dele vão ganhar um grande impulso. A questão, sr. Remington, é que ele não pode pagar muito. Se o preço estiver fora do alcance dele, pensei em dar-lhe uma ajudazinha. Quanto custa a franquia da Remington?

Brad pronunciou em tom indiferente uma cifra de milhares de dólares que a fez engolir em seco e estremecer. Então ele a encarou, com o sol que entrava pela janela incidindo sobre os ossos do rosto e sombreando-lhe as faces.

— Já foi casada, não?

A pergunta a tirou dos eixos. Repeliu o constrangimento junto com as lembranças de Jack, seu ex-marido. Após doze anos, suas acusações de que o casamento teria dado certo se ela não fosse estéril a atormentavam sempre que via uma criança.

Brad amarrava a linha em torno dos pêlos negros, prendendo-os ao anzol.

Os dedos longos e esguios se moviam como um dançarino aproximando-se da amante, seduzindo-a...

Ah-ah, pensou Samantha. Isso mesmo. Um homem com dedos bailarinos. De algum modo, aquilo se aplicava a Brad, a quem considerava um lobo vadio e traiçoeiro... Tomou fôlego ao ver que ele a encarava fixo.

"Sou o que sou, doa a quem doer", pensou Samantha, inquieta, vendo aqueles olhos negros continuarem a estudar-lhe o pescoço, depois os ombros... os braços cruzados... até descer às pernas e voltar à mosca que estava amarrando.

Samantha estremeceu e permaneceu imóvel. Aprumou os ombros. Não iria fugir antes de acertar a questão de Lúcia.

E, é claro, a franquia. Refletiu sobre como fazer Brad se abrir, admitir que desejava Lúcia. Se o fizesse, iria mostrar a ele por que não poderia ter a garota. Havia uma única razão, e bem sólida: ela, Samantha.

Observou-o puxar os pêlos para cima, armando-os como se fossem asas. Alisou as asas com a pontinha do indicador e Samantha percebeu que seus mamilos se enrijeceram por baixo dos braços cruzados. Novamente, algo se contraiu em suas entranhas. As coxas estremeceram.

Brad pegou um pedaço de linha do carretel, deslizando os dedos por toda a sua extensão, e um calor úmido começou a brotar dentro de Samantha.

Engoliu em seco. Reconheceu o calor sensual e ficou chocada. Pigarreou e se remexeu no assento duro.

— Brad... — a voz saiu rouca e sedutora. Samantha pestanejou de novo.

Captou o cheiro másculo de Brad. Provavelmente ele só usava produtos sem aroma; os pescadores não gostam de perfumes que possam espantar a presa. Aspirou delicadamente a fragrância exótica e picante que era só de Brad. Ele recolheu a isca pequenina gentilmente sobre a palma da mão calejada, estudando-lhe o tamanho e a forma como se estudasse o contorno e a beleza de um seio feminino.

— É divorciada e está envolvida em tudo o que acontece em Elegance... joga voleibol num time misto... — dizia Brad suavemente, fazendo Samantha ficar arrepiada.

— Temos uma equipe... No verão é softball. Morei aqui toda a minha vida. Estou envolvida — respondeu Samantha, distraída, porque Brad voltara a dedilhar as asinhas da isca.

— Ah-ah. Conhece todo mundo e dá uma segunda fatia de torta aos seus clientes... a todo mundo que passa... isto é, aos caminhoneiros... turistas... quase

todo mundo. — A voz de Brad ficara ainda mais grave nessas últimas palavras.

Ela se lembrou de imediato que jamais oferecera uma segunda fatia de torta a Brad, porque ele não tirava os olhos de Lúcia. Falou, às pressas:

— Quanto à franquia...

Notou que Brad colocara a mosca num estojo, enfiando-o num dos diversos bolsos de um colete de lona. Ao vê-lo levantar-se devagar, Samantha saltou da cadeira e recuou alguns passos. Era a primeira vez que não tinha a proteção do balcão para separá-la de Brad. O tamanho dele a assustava. Poucos homens podiam olhá-la de cima para baixo.

Brad fez exatamente isso, bloqueando a luz do sol, e um arrepio de excitação a percorreu.

Diante do tamanho e dos músculos de Brad, pelo menos não precisava se preocupar em estar temendo um fraco. Samantha detestou o brilho divertido que passou pelos olhos de Brad ao tirar a camiseta usada e jogá-la sobre o banco.

— Quero testar o meu novo invento — falou, e vestiu o colete cheio de bolsos. Em segundos, enfiou os arreios em Leroy e saiu pela porta, com a corrente de Leroy numa mão e a vara de pesca na outra.

O ritmo do coração dela acompanhava os cascos de Leroy sobre a rampa de tábua.

— Ótimo — foi só o que conseguiu falar, distraída, com a garganta seca, diante da imagem do imenso tórax moreno coberto de pêlos castanhos encaracolados.

— Vamos conversar sobre o seu assédio a Lúcia lá fora — disse ela à cabana vazia. — Não perde por esperar, sr. Fazedor de Iscas. Vai ter de se afastar de Lúcia.

Com certeza não estava interessada em Brad, em si. As leves e arrepiantes contrações sensuais que sentira há pouco provavelmente possuíam outras causas.

Uma overdose de anéis de cebola ou a estrada acidentada até a cabana. Ou a meia-idade e as mudanças naturais que ocorriam no corpo feminino.

Samantha fechou os olhos. Jamais vira algo tão erótico em sua vida quanto as grandes mãos de Brad moldando a minúscula e delicada isca de mosca, acariciando devagar, suavemente... Temerosa, olhou para o próprio peito, onde dois picos despontavam contra a camisa de algodão.

Seguindo Brad, decidiu que iria acertar a questão da franquia e de Lúcia rapidamente; no dia seguinte o Sammy's teria outro prato de anéis de cebola empanados e tudo em Elegance prosseguiria em sua calma habitual.

Então está fechado. Você cede a franquia a meu pai mediante um pagamento periódico. Aí... às quatro horas, todas as manhãs, você vai ao bar para tomar lições de culinária. Mas vai ter de dar duro, hein! — avisou Samantha, pegando uma pedra da margem do rio.

Brad respirou fundo; a regra número um dos acompanhantes dos pescadores era não fazer ruídos. Ela ficara junto à margem, atrás dele, quebrando ramos de árvore e explicando-lhe seu plano. Terminara num tom que indicava que sua contraproposta era boa demais para ser descartada.

O tom também indicava que não achava que Brad pudesse chegar ao Sammy's às quatro da manhã.

Samantha estava se revelando previsível, pensou Brad. Planejava tudo para todos a seu redor e esperava que todos concordassem. Dirigia a cidade inteira com segundas fatias de torta e simpatia. Claro que seus planos sempre visavam ao bem dos outros.

Um tufão de cabelos ruivos, tão rápido que ninguém conseguia segurar.

Ele conseguiria; era um homem paciente. Jogou uma mosca sobre a superfície do rio sinuoso. O rio de águas revoltas oferecia todas as condições para testar o seu novo projeto.

Das margens, podia lançar a mosca rio acima e deixar que descesse rio abaixo com os outros insetos. Concentrava-se na mosca descendo o rio, nos insetos voando baixo e na mulher que perturbava a paz da natureza como um elefante enraivecido.

Pensou em como os olhos dela haviam pousado sobre o seu tórax quando ele tirara a camiseta. Fora um gesto automático; gostava de pescar só de colete, o que lhe deixava os movimentos livres.

Por trás das espessas lentes, Samantha olhara para seu tórax de um modo que poderia fazer o ego de um homem ir às nuvens. Não estava preparado para a sua própria reação: a vontade de desamarrar a camisa dela debaixo daqueles seios empinados e puxá-la para si.

— Não pegou nada ainda — falou Samantha com impaciência. Leroy, preso a um pinheiro, guinchou.

Brad comprimiu os lábios e percebeu que havia errado no cálculo, jogando o braço para a frente tarde demais.

— Estou pensando no caso — declarou, por sobre o gorgolejar das águas.

— Não tenho o dia todo — resmungou ela, aproximando-se da margem rochosa ao lado dele.

— Saia de perto do meu braço lançador — ordenou Brad com severidade.

Samantha o fuzilou com os olhos, mas se afastou para o outro lado. Viu a isca descendo o rio.

— Não pode ser assim tão difícil!

"O que é difícil é muito difícil", ruminou Brad, vendo a mosca voar sobre a água e fechando os joelhos para lutar contra o desejo sensual que brotava intensamente dentro de si.

Sendo um homem cuidadoso e controlado, que viajava constantemente, tivera sua última experiência sexual há alguns anos.

Quando Samantha chegara à cabana, com um leve aroma de cebola em torno de si, plantara-se, de botas, com as duas pernas escanchadas, como um pistoleiro do Oeste. O sol reluzira em seu cabelo ruivo-dourado e ressaltara as longas pernas esguias, os quadris redondos e a cintura estreita. Admirara aquelas pernas ao vê-la dançar com os ex-namorados no Sammy's. Nas últimas semanas, despertara de sonhos nos quais aquelas pernas lhe enlaçavam os quadris com força; a seguir, ele ganhava segundas fatias de torta. A mistura de cenários o perturbava tanto quanto Samantha...

O cheiro dela... por baixo do cheiro de cebola... era a essência da feminilidade, inebriante como o almíscar, suavizado pelo talco e o sabonete. Samantha era uma mulher bem natural; quase não usava cosméticos.

Não que fosse bonita. O maxilar era muito rígido e uma metade do rosto não correspondia exatamente à outra. Quando abria um sorriso amplo, o canto esquerdo da boca se levantava mais rápido do que o direito. Mas a face direita possuía uma covinha. As leves rugas em torno dos olhos se acentuavam quando sorria (para os outros). Só vestia camiseta, jeans e suéteres.

Admirava-a como adversário; era uma brava lutadora. Além disso, admirava o modo como protegia sua filha. Na verdade, era-lhe grato por isso.

— Quero que pare de ficar de olho em Lúcia — dizia Samantha num tom distraído enquanto o observava manejar a linha metodicamente.

— Lúcia? — Brad lançou a linha mecanicamente, concentrando-se na mulher a seu lado.

— É. Ela é jovem e inocente. Você não. Não é um bom par para ela — respondeu Samantha, examinando o rio. — Por que não lança para aquele lado?

Cada músculo e nervo do corpo de Brad se contraiu ao registrar o que ela dissera.

— Um bom par?

Perdeu uma truta multicolorida, que surgira na margem oposta. Lançou de novo.

— Não combina. Fique longe dela.

O braço de Brad parou a meio caminho e a linha afundou no rio. Refreou um palavrão. Samantha achava que ele estava atrás de sua própria filha! E estava, maldição!

— Você não pegou nada ainda — insistiu ela enquanto ele tentava absorver as últimas novidades e manter a calma em seus lançamentos.

— Por que é que não gosta de mim? — perguntou Brad, sentindo os olhos cinzas de Samantha sobre si.

— Você está de olho numa garota com a metade da sua idade. Lúcia está vulnerável agora... você poderia magoá-la de um modo irremediável. E mesmo que não houvesse a diferença de idade... você não daria um bom par.

Brad respirou fundo e continuou a manejar a mosca sobre as águas, evitando deliberadamente as duas grandes trutas que saltavam para pegar a isca. Não queria distrações, nem mesmo uma truta gigante, quando lidava com as sutilezas da mente de Samantha.

— Isso não parece tão difícil — falou, atrás dele. Brad reagiu de imediato. Largou a linha que segurava com a mão esquerda, agarrando a camisa de Samantha e a puxando para si.

Estudou-lhe os olhos cinzas, tempestuosos. Então percebeu, com horror, que jamais puxara uma mulher à força.

E jamais desejara uma mulher tão desesperadamente.

Nem ficara tão furioso como acabara de ficar com a Srta. Samantha Ames.

Forçou os dedos a soltarem a camisa, e ela a puxou para baixo bruscamente.

— Vê? — perguntou ela, arrogante. — Você não vai dar um bom marido! Está escrito na sua cara.

Brad forçou um sorriso e estendeu-lhe a vara de pescar. Concentrar-se em Samantha exigia mais do que manter as mãos ocupadas com a linha. Queria estudá-la, cercá-la e tirá-la do sério, só para variar.

— Tente você. Afinal, não parece tão difícil, não é? Os cachos ruivos apanharam a luz do sol quando ela sacudiu a cabeça.

— Nem um pouco. Papai me ensinou quando eu era criança. Claro, você precisa tentar fazer parecer difícil para que a gente ache que você é o máximo e compre suas iscas. Ao contrário de você, posso me concentrar numa tarefa e conversar ao mesmo tempo — disse ela, franzindo o cenho e cerrando os lábios.

A linha e o anzol roçaram a orelha de Brad e acertaram uma pinha. Brad fechou os olhos e perguntou:

— Tem pescado recentemente, Samantha?

Ela fuzilou-o com os olhos enquanto a pinha soltava-se nas águas, junto com a isca. Brad fitou a linha sem isca pulando nas águas revoltas e perguntou:

— O que mais não gosta em mim? Além do fato de não servir para o casamento... Sobre isso conversamos mais tarde.

A linha se enredou nas plantas aquáticas e Samantha lutou como uma hábil pescadora até fisgar uma, com raiz e caule.

— Viu? Qualquer um pode fazer isso! — declarou, em tom triunfal. Não havia nada mais belo do que a curva dos seios de Samantha ao lançar a linha, pensou Brad. Salpicado de raios de sol, seu cabelo rebrilhava em tons dourados, laranjas e prateados. Possuía o olhar límpido e cristalino de uma mulher confiante que se conhecia muito bem.

Samantha concentrou-se em manejar a linha sem anzol.

— Você é falso. Deixou papai pensar que Leroy era gente, um amigo que morava com você na cabana. E deixou as pessoas pensarem que estava desempregado e na miséria. Maggie pensou até em fazer uma coleta para você. Fica olhando para Lúcia como um garoto apaixonado querendo atenção e brinca com Carina só para se aproximar de Lúcia. E todo o tempo você é o próprio sr. Iscas Remington... Agora eu lhe pergunto, não acha que há uma pitada de desonestidade nisso tudo?

Ela franziu o cenho, inclinou-se para a frente e concentrou-se na truta que fitava a linha sem anzol.

— Venha... fisgue, queridinha! Então, em tom baixo, acrescentou:

— Você vive como um cigano. Papai me contou que viaja por todo o país, às vezes até para outros países, fazendo demonstrações e vendendo iscas. Lúcia precisa de um lar, de segurança, de amor... Não de um homem que um belo dia decide levantar acampamento e cair na estrada... Ah! Vê aquela grandona? Venha aqui com a mamãe!

— Então você está protegendo Lúcia de um velho tarado que não serve para o casamento e que provavelmente vai dar o fora quando se cansar. É assim que me julga, Samantha?

Ela puxou a linha com a mão livre.

— Com trailer amassado e tudo. Você vive cheio de poeira! Ei,olhe o tamanho daquela!

— A água amplia o tamanho.

— Não fique emburrado só porque pescar com mosca artificial não é assim tão difícil e porque você não é bom par para Lúcia nem para nenhuma outra mulher. E a vida, algumas pessoas simplesmente não são.

Brad fitou o brim esticado do traseiro de Samantha. Estudou-lhe as formas meticulosamente e achou que iria caber direitinho em sua palma.

— Eu poderia ser.

Ela fez um "bah" de descrédito.

— Daria trabalho. Para começar, Lúcia merece um homem realmente romântico, um parceiro que goste de diversão, sr. Remington. Desejo não é amor. Tenho visto o senhor todo dia desde fevereiro... talvez duas vezes por dia. É solitário e não ri. As pessoas se afastam do senhor.

Estava conseguindo atingi-lo, admitiu Brad, irritado com o quadro melancólico que Samantha pintava. Lembrou-se de todos os trabalhos temporários que realizara enquanto procurava Lúcia, na Europa e no Canadá; lembrou-se de todas as horas que passara tentando desenvolver seu negócio e divulgá-lo, as demonstrações, as viagens, as entrevistas a revistas especializadas, E as horas que passara seguindo pistas da filha e viajando para todo lugar onde alguém dissesse havê-la visto. Viajara e trabalhara, sem tempo para mais nada, porque, acima de tudo, queria cuidar da filha.

Há dois anos, enfim, localizara Lúcia, que fugira de sua mãe. Brad agira com cautela, consciente de que era muito fácil perdê-la. Quando começara a fazer perguntas sobre ela, a resposta lhe doera: "Seu pai? A mãe dela lhe falou que o pai batia nela o tempo todo. A mãe é uma bruxa e tem um namorado que bate em Lúcia. Lúcia odeia o pai, mesmo sem o conhecer. Diz que nem quer conhecê-lo".

Jamais tocara em Michelle, sua ex-esposa, a não ser como um jovem de sangue quente louco pela garota a quem amava. Amava. Aos vinte e dois anos, confundira sexo com amor, e realizara um casamento de contos de fada. Michelle não gostava do serviço caseiro, de pagar as contas nem de ficar em casa com o bebê. Lúcia chegara em seu primeiro ano de casamento e Michelle pedira o divórcio. Com os papéis na mão, saíra da pacata cidadezinha da Geórgia com o bebê e iniciara uma vida nômade. Pelos fragmentos que conseguira reunir da vida de Lúcia, Brad sabia que jamais tivera segurança nem infância. Na adolescência, apaixonara-se por um casanova da vizinhança e engravidara. Carina possuía apenas um ano de idade quando Brad as encontrara num bairro pobre de Nova York.

Logo entrara em cena o advogado, com a falsa herança de um parente distante que amava Elegance e queria que Lúcia se estabelecesse lá. A "herança" permitiria que Lúcia e Carina vivessem na cidade que Brad havia investigado e considerado segura. Lá, poderia entrar sutilmente em suas vidas.

Até o momento, Samantha impedira-o de travar relações com Lúcia... porque o considerava muito velho, muito estranho e impróprio para o casamento...

Inclinou-se para o lado quando a linha roçou em seu ombro e abraçou a si próprio vendo Samantha pegar outro aguapé.

— Vá com calma — murmurou ele, percebendo que não se referia apenas ao cuidado com a linha, mas também ao ataque ao seu ego.

Brad sentiu-se frágil e ferido.

Gemeu de leve ao reconhecer a nova emoção e Samantha franziu-lhe a sobrancelha.

— Desculpe. Acha que devo trocar a mosca? Elas não parecem querer esta. É preciso que se pareçam com os insetos do rio, sabe? Nossa, que cara! Será que estamos mal-humorados, sr. Iscas?

Brad arrancou a caixa de iscas do bolso do colete e empurrou-a para as mãos de Samantha. Ela segurou a vara entre as coxas; os músculos delicadamente moldados despontaram por baixo do jeans. Brad começou a suar, apesar do frio da tarde, e tirou o colete, largando-o sobre uma rocha. Olhou, inquieto, para as fileiras de moscas bem alinhadas na caixa revestida de espuma que estavam sendo reviradas pelos dedos trapalhões de Samantha.

Olhou de novo para a vara entre as coxas dela e fechou os olhos. Descobrir o quanto aquilo o perturbava depois de todos aqueles anos o irritava.

— Precisa de alguma ajuda para... escolher uma mosca?

— Não, eu sei — disse Samantha ao mesmo tempo em que a delicada ponta da vara favorita de Brad caía sobre as rochas.

— Oh, droga! Passe isso aqui! — falou, agarrando a vara e prendendo-a entre as coxas. — Então acha que eu sou um lixo, em termos românticos?

— Não é nenhum príncipe — afirmou Samantha, concentrando-se em dar o nó na linha.

Brad notou que o nó infantil poderia ser desamarrado ao menor impulso da correnteza, mas não queria se distrair de Samantha.

— Algumas aulas poderiam ajudar — falou, com serenidade, enquanto Samantha pegava a vara e mandava a isca para o rio.

— Não preciso de aulas, sou muito boa!

Brad agarrou a cintura do jeans dela por trás ao vê-la avançar para uma grande rocha junto ao rio. Ele testara aquela rocha antes e ela balançara com o seu peso.

— Então se eu prometer não ficar mais atrás de Lúcia, acha que poderia me dar aulas para eu me tornar um bom par romântico?

— De jeito nenhum. Sou uma mulher ocupada, Brad. Transformar você num bom par romântico levaria tempo demais.

— Arranje tempo — ordenou ele, em voz grave. Samantha bufou, em descrédito.

— Vamos voltar à questão da franquia. Troco as lições de torta pela franquia das Iscas Remington para o meu pai.

— Nada feito.

A rocha balançou quando Samantha se virou para encará-lo.

— Espero ter escutado mal!

— Quero me transformar num cara romanticamente atraente. Você vai me dar lições em troca da franquia e de minhas demonstrações. — Brad a encarou e cerrou os dedos com força em torno da cintura do jeans. Em algum lugar de sua galáxia lógica, um outro Brad observava e fazia tsk tsk para aquele Brad instável, desorganizado e emotivo.

Samantha fuzilou-o com os olhos, então se virou e lançou a linha outra vez. Balançou-se sobre a rocha oscilante.

— Sem chance. Não tenho tempo.

Brad puxou-lhe a cintura do jeans no instante em que ela lançava a linha nas cerejeiras silvestres a seu lado. O anzol cravou-se nos galhos. Samantha deu um giro e saltou para a margem, do outro lado de Brad. Entre os arbustos e Samantha, que arrastava sua melhor linha na lama, Brad viu seu corpo ser laçado pela linha de pesca.

Virou-se no exato instante em que a linha se enredou nos tornozelos de Samantha e segurou-a em plena queda em direção à margem gramada e florida. Samantha rolou por cima dele. Com a inclinação da margem, ele rolou por cima dela e a linha os amarrou um ao outro firmemente.

Embaixo de Brad, Samantha assustou-se com o tombo. Brad, com a face colada à sua, parecia desacordado.

— Você está bem? — sussurrou, vendo que ele não se mexia.

Engoliu em seco, respirou fundo e percebeu o quanto ele era pesado. Se estava inconsciente, ela é que teria de salvá-los. O rio estava apenas a alguns metros e se rolassem para dentro da água... Pestanejou e encolheu-se, empurrando-lhe o tórax com as mãos e viu seus dedos cerrarem-se em torno de pêlos quentes. Ele grunhiu e respirou no exato instante em que escorregavam um pouco e ela rolou para cima dele, acrescentando uma volta ao laço que os prendia.

Rolaram uma vez mais, parando com o corpo de Brad por cima.

— Estou bem, ótimo! Se ficar quieta, vou nos tirar daqui— murmurou Brad, e virou-se para olhar para seus corpos emaranhados. Ficou paralisado, com os olhos carregados, fitando cada centímetro de seus corpos.

— Não entre em pânico — acrescentou, suavemente, e Samantha notou-lhe um certo sotaque sulista. A mão gigante se deslocou para o lado dela para testar a linha que lhe passava pelos quadris; distendeu-se momentaneamente sobre o seu traseiro.

— Fique parada até eu encontrar...

Brad respirou fundo, o que fez com que seu tórax se comprimisse contra o macio corpo feminino.

— Se ficar parada, vamos nos soltar mais rápido — explicou, como se falasse com uma criança.

— Não se preocupe, sou ágil — replicou ela, ofendida com aquele tom de "eu-macho-forte-você-mulher-indefesa".

Escorregaram alguns centímetros até que Brad conseguisse agarrar um arbusto.

— Viu só? É o que dá deixar uma ruiva intrometida de pernas longas... — Brad disse um palavrão. — Pare de se mexer, Samantha!

Samantha percebeu que Brad estava muito excitado, com o coração disparado e a temperatura subindo. Fitou aqueles olhos ardentes e viu o rubor subir-lhe às faces. O corpo embaixo do seu estava rígido e quente. Samantha se remexeu, tentando livrar-se da linha, e rolaram mais uma vez, com Brad caindo em cima dela e lançando-lhe um olhar fulminante.

— Estou tentando salvá-lo — explicou ela, com cuidado.

— Oh, droga — resmungou ele, como um capitão afundando com seu navio.

Então Brad Remington, hábil pescador, colocou a boca exatamente sobre a dela. Numa carícia suave, contornou-lhe os lábios. Parou nos sensíveis cantos, e Samantha estremeceu; até aquele instante, aquele ponto geográfico específico de sua boca permanecera virgem, não beijado.

Fitando-o através das lentes sujas, viu a expressão concentrada de Brad e segurou-lhe as faces para erguer sua boca até a dele.

Samantha viu a si própria engolindo a isca... as carícias delicadas daquela boca rígida.

Nunca fora beijada com tanta doçura, tanta exatidão, tanta perfeição. Suspirou, deixando que suas pálpebras se cerrassem. Abriu-as quando sentiu os óculos lhe serem tirados. Sentindo-se exposta como nunca, recorreu a um ataque verbal.

— Fomos fisgados pela sua linha de pesca — acusou-o.

— Ah-ah — disse ele, fitando-a.

Samantha encolheu-se, corando diante daquela inspeção. Tentou lembrar-se se alguma vez alguém a havia examinado tão de perto, como se olhasse dentro de sua própria alma. Algo despertou dentro de si e viu uma dor e uma solidão que ninguém poderia suportar. Desejou-o loucamente, querendo aliviá-lo...

Ele fechou os olhos devagar e franziu o cenho. Então ajustou o corpo ao dela, como se estivesse se preparando para um longo relacionamento. Um gemido leve, íntimo e masculino entrou pelos ouvidos de Samantha, despertando-lhe a feminilidade e dando-lhe prazer. Não tinha tempo para considerá-lo um lixo em termos românticos. Ele a estava beijando de novo e dessa vez ela passou os braços em torno de seu pescoço e segurou firme. Só por um instante, enquanto estavam amarrados naquela margem ensolarada, florida e com cheiro de terra, desejou proteger Brad do que quer que o atormentasse. Agarrou-o com força e beijou-o com terno encanto.

— Hummm. — Ele a puxou mais para perto e aprofundou o beijo. Fez com que os lábios se juntassem com o mesmo cuidado com que ajustara o corpo ao dela.

Ela começou a tremer sem saber por que, até descartar todos os motivos exceto a doçura daquele beijo. Aspirou o cheiro dos cabelos, da pele, do calor dele. Os ombros másculos se contorciam quando ela os acariciava suavemente. Respondeu à sedutora língua que lhe roçava os lábios com a sua própria língua.

— Hummm — murmurou ele de novo, deliciando-se. Então acariciou-lhe a parte de trás do pescoço com os dedos enquanto se inclinava para sussurrar-lhe ao ouvido... morder-lhe o lóbulo das orelhas... umedecer-lhe a concha com a língua...

Trêmula e quente, Samantha se perguntou por que é que nenhum homem tratara suas orelhas com tanto carinho. Viu a isca minúscula balançando entre as cerejeiras e lembrou-se dos dedos dele tocando nas asas, acariciando-as suavemente. Todos os seus músculos se contraíram de imediato. Cravou os dedos nos músculos fortes das costas dele, precisando agarrar-se à realidade. Fora casada e tivera namorados e...

— Beijar os dedões do seu pé e a parte de trás do joelho... — dizia Brad em voz rouca, com o tórax vibrando contra seus seios.

Samantha fitou o céu azul e derreteu-se enquanto Brad sussurrava-lhe sobre os mil jeitos como gostaria de satisfazê-la e saboreá-la, tudo com aquele sotaque sulista. Depois de um leve arquejo e uma delicada explosão, fechou os olhos e permaneceu embaixo dele, envolta em calor.

Brad acariciou-lhe o ventre, os quadris e grudou seu rosto quente ao dela. Cuidando para não esmagá-la com seu peso, aninhou o rosto na curva de seu pescoço, descansando, relutando em largá-la.

Ela alisou-lhe as costas, fazendo-o estremecer.

— Samantha... — disse ele, devagar, docemente, como se tentando adaptar o nome aos lábios.

Então Brad começou a soltar a linha que os prendia. Ela havia lutado para se libertar. Agora permanecia embaixo dele, absorvendo o seu novo Brad e tentando recompor seu corpo derretido.

Minutos depois, Samantha fitava o porco que dormira durante toda a cena e agora lhe observava o rosto corado com olhos compridos. Ajeitou a roupa enquanto Brad recolhia a linha metodicamente e a fitava.

Ela desviou os olhos daquela boca levemente inchada e tentou não pensar no que lhe havia sussurrado ao ouvido. Pigarreou e forçou as pernas instáveis a se firmarem.

— Ora, ora. Não é um belo dia?

— Com certeza! — respondeu Brad depois de uma pausa.

Samantha fitou os pássaros voando. Então engoliu em seco e pegou os óculos que Brad lhe estendia.

Tirou uma folha que caíra sobre a lente e declarou:

— Não suporto tarados, especialmente aqueles que agarram qualquer mulher que aparece quando não conseguem ter aquela que cobiçam.

As sobrancelhas de Brad se uniram. Apoiou a vara devagar contra uma árvore e enfiou as mãos nos bolsos.

— O quê?

— Ouviu muito bem! Pensa que as mulheres estão numa prateleira, prontas para você escolher uma. Você agarra qualquer uma que aparece — repetiu Samantha, com uma raiva crescente. Ele não era desempregado, nem miserável, nem tão frio quanto pensara. Ao menos quando beijava e ajustava o corpo ao seu. Lembrou-se daquela rigidez íntima e saliente, que continuava evidente agora, a distância. Para seu horror, olhou para ele e corou.

— Acha que se eu não puder ter Lúcia, vou pegar você? — perguntou Brad num tom suave que foi se tornando alto e indignado, assustando um esquilo que disparou atravessando a clareira. Tirou uma das mãos do bolso, passou sobre o cabelo desgrenhado e lançou-lhe um olhar fulminante. Esfregou os pêlos do tórax com a mão, sem desviar os olhos dela.

— Mais ou menos isso — confirmou ela, começando a olhar para o caminho de volta à cabana.

— Fique aqui e lute — replicou Brad.

— Não posso. Preciso voltar ao Sammy's.

— Samantha! — gritou Brad vendo-a pular do aterro. — Falei para você ficar parada!

Leroy roncou e levantou-se, olhando para Brad.

Ela se virou com um sorriso triunfante. Especialista em captar a psicologia das pessoas, deixara-o furioso e sentia-se vitoriosa.

— Gritou comigo! Isso é inaceitável num bom par. É um herói gótico, sr. Iscas Remington. Emotivo demais. Agora mesmo está morrendo de raiva. É teimoso demais para mudar. Em suma... não vai arranjar compradora no mercado. Homens góticos estão fora de moda!

Sentindo que a demonstração chegara a seu ápice, Leroy começou a guinchar. Uma flor amarela pendia de seu focinho. Samantha teve a estranha sensação de que ele se comportava como um torcedor num jogo e que a encorajava sacudindo sua bandeirinha.

Junto ao rio, Brad respirou devagar, como se tentando recuperar o controle.

— Moça, eu nunca grito. Você é uma abelhuda arrogante de cidadezinha do interior! Precisa é de um homem que seja macho e não se deixe manipular quando você decide arranjar outro par para ele... Você é recordista nesse tipo de jogo.

Percorreu-a com os olhos, aquecendo-a de novo. Ela quis pular para o aterro de novo e derrubá-lo na água gelada.

— Fique longe de Lúcia — falou, por entre os dentes.

—Nunca pensei que você fosse covarde ou implicante — respondeu ele pegando a vara com serenidade e preparando-se para lançar a linha. A rígida postura de ombros a desafiava.

Pegou uma truta marrom instantaneamente, içou-a e soltou-a. Repetiu o gesto três vezes em três minutos.

CAPÍTULO TRÊS

Amarrar iscas normalmente o ajudava a relaxar. No entanto, depois do encontro com Samantha, Brad descobriu, às três horas da madrugada, que não conseguia tirar da cabeça aquelas pernas longas e beijos doces e famintos. Fechou a caixa com seus "inventos" e suspirou. Leroy o observava, como que preocupado com a estranha inquietude de dono. Brad colocou uma fita de A Porquinha Gostosa no aparelho de videocassete. Assim, enquanto Leroy grunhia de satisfação, Brad pensava na teimosa Samantha.

— Herói gótico — repetiu, melancólico. Esfregou as costas de Leroy. Fazer confidencias a um porquinho "era um tipo de terapia. — Um lixo em termos românticos... impróprio para o casamento...

Não queria pensar em como Samantha beijara os homens no passado. Há anos não beijava uma mulher, e quando colara os lábios aos dela, sentira-se em casa de novo. O cabelo dela cheirava a... cebola, admitiu Brad, sorrindo.

Quando pensava no modo como ela o agarrara com força, no cheiro da terra e das flores se mesclando ao de Samantha, algo se partia dentro dele.

— Poeira da estrada — resmungou, aborrecido com a referência dela à sua vida nômade e ao "trailer amassado".

Levantou-se, espreguiçou-se e mirou a noite enluarada de Montana pela janela. De repente, sentiu-se exausto.

Queria dar um lar a Lúcia, tornar sua vida mais fácil e ajudar a criar Carina. Planejava ir devagar, entrar em sua vida aos poucos até Lúcia saber o quanto ele a amava.

Sempre a amara, desde o primeiro instante em que a vira. Engoliu em seco e, trêmulo, respirou fundo para tentar controlar as emoções. Pensou em todas as noites em que se indagara onde ela andaria. Estaria bem? Feliz? Teria o que comer, estaria confortável?

Lúcia. Magra e pálida, o rosto quase coberto pelos cachos revoltos, perdera um pouco do seu ar assustado nos dois anos que vivera na cidade. Estava segura em Elegance, com seu anjo da guarda de cabelos ruivos e longas pernas.

Ele devia estar com Lúcia no início de sua adolescência, para protegê-la...

Fechou os olhos quando outra onda de dor o percorreu. Deus, como queria abraçar sua filha, embalar a neta no colo e niná-la... Cercar as duas de segurança.

No espelho sobre o refrigerador, os anos pesavam sobre seu rosto barbudo, marcando-o com linhas melancólicas, uma cicatriz junto às têmporas, cabelos grisalhos.

—Sr. Gótico — resmungou.

Trancou a porta e deitou-se na cama. Lidara com a solidão durante anos... Nunca lhe fora tão duro como quando forçara a si próprio a largar Samantha.

Não pretendera beijá-la, mas o jeito como ela se mexia aumentara-lhe o desejo. Intenso, quase a ponto de doer, o desejo por ela emergira de todos aqueles anos de abstinência. Ela possuía o sabor de tudo o que ele perdera, de tudo o que sempre quisera... Segurara-o com força, como para protegê-lo, dar-lhe segurança.

Olhou para Leroy, atento demais à Porquinha Gostosa para notar a solidão de Brad. Pelo menos um macho no trailer não estava se sentindo solitário.

Samantha olhou para o buquê e depois para o homem que a espiava por sobre as rosas vermelhas: Brad Remington. Sentado ao balcão, Brad exibia um sorriso contido e uma camisa de algodão limpa, embora amassada, em vez da camiseta habitual.

Samantha quase derrubou os pratos que levava para a mesa dos caminhoneiros. Quando retornou, após servi-los, Brad ainda a observava por sobre as rosas. Despachou Louise às pressas: a garçonete estava enchendo potes com temperos e, de olhos fixos em Brad, acabara espalhando-os por sobre o balcão. Samantha limpou tudo rapidamente, fuzilando-o com os olhos.

Brad observou os cachos soltos em sua cabeça, testa e pescoço. Por um instante, o coração de Samantha parou de bater e logo disparou loucamente, assim que o olhar de Brad pousou sobre seus lábios e ela se lembrou do beijo.

Beijo mútuo, porque ela o segurara com força e retribuíra com igual intensidade. Lá estavam eles, emaranhados numa linha de pesca, alheios às manchas de capim que mais tarde descobriu em suas costas, beijando-se alucinadamente numa margem de rio ensolarada como dois adolescentes famintos.

Ninguém jamais a beijara daquele jeito. Nem mesmo o ex-marido.

Como se Brad precisasse dela para sobreviver.

Como se só ele soubesse o segredo dos sensíveis cantos virgens de sua boca.

Como Brad fosse seu inimigo jurado, a cena do beijo era um tanto intrigante. Devia estar dopada com o cheiro de cebolas para retribuir ao sr. Iscas Remington.

— O que deseja? — perguntou-lhe, despachando Lúcia com um gesto com a toalha.

Brad exibiu os dentes num breve sorriso.

— Aulas! Ajude-me a sair da lata de lixo e a virar um bom par romântico.

— Bah! Primeiro a torta, agora romance — resmungou ela, em descrédito, acabando de limpar o balcão. — Parece diferente hoje, Remington.

— Passei loção pós-barba — declarou ele, na defensiva, com as rosas tremendo em sua mão.

Sem poder resistir, Samantha reclinou-se para passar a mão em seu rosto.

— São para você — afirmou, contido. — Posso entrar em contato com meu sócio para iniciar o processo de franquia se concordar em me transformar num par romântico aceitável.

Samantha estudou-o para ver se estava olhando para Lúcia, mas seus olhos permaneciam fixos nos dela, intensos e ardentes.

— Oh—disse ela, distraída, pegando as rosas e correndo com elas para a cozinha.

Encheu um vaso com água enquanto observava Brad da janela da cozinha. Pediu o café da manhã normal dele, com bifes e ovos. Norm, o cozinheiro do período diurno, gemeu e esfregou a vasta barriga. Olhou para ela com tristeza vendo-a ajeitar o buquê de rosas no vaso.

— Não é a cozinha que está me deixando enjoado — resmungou ele, estendendo-lhe um prato de panquecas. — Não, nada de enfiar um termômetro na minha boca ou um copo de vitamina C garganta abaixo. Se eu achar que não dá para trabalhar, lhe aviso.

— Não deixe de fazer isso. — Pegou a cafeteira e seguiu para a mesa dos Parker para aquecer seu café. Então notou Lúcia sorrindo timidamente para Brad, que fazia cara de cachorrinho abandonado.

Se havia um olhar capaz de atrair uma mulher era aquele de cachorrinho abandonado que alguns homens estampavam; aquele olhar de "cuide de mim e me leve para casa" balançava o coração de qualquer mulher. Uma boa cara de cachorrinho abandonado, como aquela de Brad, era mais poderosa do que qualquer investida romântica. Samantha olhou para Brad e decidiu que ele merecia o prêmio; mesmo ela, que sabia que ele era capaz de agarrar qualquer mulher que aparecesse por perto, sentiu vontade de pegá-lo no colo. Captara um pouco de sua solidão quando ele se deitara sobre ela, e o abraçara com força para confortá-lo.

Não tinha tempo a perder, porque Lúcia parará diante dele e lhe sorria amistosamente.

O olhar trocado entre o homem de meia idade e a garota revirou as entranhas de Samantha. Principalmente porque os olhos de Brad se iluminaram como fogos de artifício. Os olhos cor de mel de Lúcia eram calorosos...

— Lúcia, a mesa do canto quer uma cadeira alta para o bebê e o sr. Jones quer outro bule de café. Cuide disso para mim, tudo bem? Depois faça mais dois bules de café, porque aqueles caminhoneiros querem outra rodada.

Brad não tirou os olhos da garota quando esta se afastou, e Samantha respirou fundo. Fez um gesto para ele indicando a cozinha.

— Já para a cozinha!

— Sim, madame! — disse Brad, levantando-se e levando o café consigo.

Norm fitou-a por baixo do chapéu branco de cozinheiro com seus olhos imensos e sombrios e esfregou a barriga. Samantha lançou um olhar fulminante a Brad e, furiosa, jogou alfaces lavadas numa bacia plástica. Brad sorveu seu café e observou, com interesse, Samantha jogar um maço de alfaces na tábua de cortar e decepar-lhe o coração de um só golpe, como se fosse o coração dele. Queria acertar as coisas de uma vez por todas com Brad.

—Nunca mais olhe para Lúcia como se algo que ninguém mais pudesse compartilhar estivesse se passando entre vocês.

— Ah, é? Por quê?

— Já lhe disse. Você não serve para o casamento. — Ao respirar, Samantha captou o aroma da loção dele. Recuou meio metro quando ele se empertigou e encarou-a com profundo interesse. Ou seria brincadeira?

O coração dela começou a bater mais rápido; ficou um pouco tonta.

— Estou enjoado — afirmou Norm, e estendeu a espátula a Brad. — Alguém assuma. Vou para casa... Dois esperando você — falou, referindo-se aos ovos que não haviam sido virados. — Batatas, torradas. Pãezinhos crescendo.

Então saiu da cozinha e do bar. Parou à porta e gritou para Samantha:

— Ônibus de turismo entrando no estacionamento. Umas vinte pessoas. Parecem famintas. — E partiu.

— Passe isso aqui — resmungou Samantha, sem conseguir pegar a espátula das mãos de Brad. Ele pegou um avental limpo num gancho e o amarrou à cintura.

Despejou massa de panqueca nas frigideiras com destreza, colocou batatas fritas congeladas na grelha e raspou a crosta das últimas torradas francesas. Virou as panquecas, pegou outra lista de pedidos que Lúcia acabara de entregar, analisou-a e começou a preparar mais panquecas. Quebrou ovos com uma mão só, num gracioso floreio, despejou as panquecas prontas numa bandeja, estendeu-a a Samantha e sorriu.

Samantha tentou fechar a boca e parar de olhar para a única coisa que pode atingir o coração de uma mulher mais rápido do que uma cara de cachorrinho abandonado: um sorriso jovial de um homem que há dois séculos não sorri.

— Tudo bem — falou, com tristeza, percebendo que o navio partira sem ela, sentindo que sua bola esvaziara e que Brad estava com a faca e o queijo na mão.

Então Brad jogou a lingüiça que estava fritando no lixo e falou, com firmeza:

— Nada de porco.

Enquanto Samantha estava ocupada tentando absorver essa última fala e manter Brad longe de Lúcia, ele se inclinou e beijou-a de leve.

— Bar em Vermont — explicou. — Aprendi com o melhor cozinheiro do mundo, Jacob. Nada de bacon nem de lingüiças hoje, Samantha.

— Vai haver um motim! — resmungou ela, mesmo se lembrando de Leroy. — Vou à falência!

— Deixe a cozinha comigo — disse Brad, dando-lhe uma batidinha no ombro e empurrando-a para fora.

Não havia nada pior do que não conseguir provar que um homem é incapaz de fazer aquilo que encasquetou em sua cabeça, pensou Samantha ao meio-dia. No dia mais movimentado da semana, Brad "arrasava" em seu novo papel, servindo molhos sobre sanduíches de bife e fettuccine com pratos vegetarianos. Os clientes comentaram sobre os belos enfeites com salsa e cebolinha que Brad acrescentara. Quando um ônibus lotado de adolescentes parou para hambúrgueres e fritas, Brad se desdobrou, jogando trinta hambúrgueres sobre a grelha sem esquecer quantos eram com queijo e quantos sem. Revelou-se um mestre dos hambúrgueres especiais, com ou sem cebola, com guarnições de batatas fritas e cogumelos.

Vários fregueses habituais trocaram seus pedidos rotineiros pelos hambúrgueres duplos de Brad. Quando Sam, o cozinheiro da noite, chegou às três horas da tarde, Brad iniciara uma nova fornada de pãezinhos e aprontara as saladas de frango e atum para rechear os tomates.

— Certo, tudo bem — falou Samantha, com relutância, quando se ofereceu para lhe pagar e ele recusou. — Vou lhe dar lições para colocá-lo em forma, mas não se meta com Lúcia!

— Fechado! Vou falar com seu pai o mais cedo possível — respondeu, inclinando-se para verificar o assado do jantar no forno. — Mas Lúcia perguntou se eu queria uma carona e seria grosseiro da minha parte recusar...

— Lúcia vai pegar Carina na babá. Você vai ao meu treino de vôlei. Assim posso ficar de olho em você. Vamos tratar das aulas e da franquia. Amanhã você vem para a primeira aula de merengue.

— Certo — disse ele bem rápido, e Samantha se inclinou para ver se estava sorrindo. Brad piscou com um ar inocente antes de começar a esculpir os rabanetes vermelhos em forma de pequenas rosas.

Samantha olhou para as rosas exuberantes sobre o balcão junto ao caixa registrador e sentiu algo se contrair em suas entranhas.

Ver Samantha, uma mulher ativa, feliz, animada, de longas pernas e curvas, saltitando na quadra de um ginásio com seus ex-namorados tirou o brilho da vitória de Brad. Cravava os dedos nas arquibancadas quando ela batia no traseiro de um dos rapazes e ele lhe devolvia o gesto.

As namoradas, esposas e filhos de diversas idades vibravam com os atletas e observavam o intruso em seu meio. Algumas crianças postaram-se à sua frente, de olhos arregalados e curiosos. Dois meninos foram sentar-se a seu lado, radiantes.

Quando as mães vieram pegar os filhos, Brad disse que gostara das crianças. Se fosse por ele, teria tido um caminhão de filhos.

— Você é o novo namorado de Samantha? — perguntou vivamente uma das mães.

— Estou tentando — respondeu, com franqueza, vendo a camiseta suada de Samantha colar-lhe aos seios e o short se levantar no traseiro. Engoliu em seco quando os músculos de suas pernas se flexionaram com graça feminina ao bloquear uma bola junto à rede.

— Belva, a florista, disse que você comprou um buquê de rosas para ela. Samantha é difícil de agarrar. Sempre que um homem tenta, ela arranja outra mulher para ele.

Outra mãe, limpando a boca da filha, suja de doce, falou:

— Ela é arisca. Um casamento ruim faz isso com uma mulher.

E com um homem, pensou Brad.

Vendo o corpo esguio de Samantha se esticar para dar uma cortada, seu coração parou.

Era mais bela do que uma truta multicolorida.

— Por que fica olhando para mim desse jeito? — perguntou Samantha mais tarde enquanto rumavam para o pick-up dela. — As pessoas vão pensar coisas!

— Estou tentando me preparar para as aulas — respondeu Brad ao chegarem ao pick-up.

Quando Brad sentou-se a seu lado, Samantha ligou o motor e seguiu rumo ao trailer de Brad.

— Preciso ser honesta com você, Brad. Não há nenhuma mulher na cidade que sirva para você. Pode ser que essas lições não lhe adiantem nada. Claro que provavelmente vai acabar se mudando, então poderá usar as técnicas aprendidas em outro lugar...

— Conte-me de seu ex-marido.

As espessas lentes de Samantha brilharam sob a luz da rua quando ela o encarou, segurando o volante com força.

— Não. A primeira coisa que você tem de aprender para ser um bom par romântico, Remington, é não fazer perguntas como essa a uma mulher. Precisa esperar até que ela esteja pronta a lhe contar do passado, dos antigos amores. De qualquer modo, obrigado por me ajudar hoje. Você foi ótimo — acrescentou, com relutância ao pararem na frente do trailer.

Do cercado, Leroy começou a guinchar-lhes boas-vindas.

— Estou ansioso para aprender essas técnicas de romance — disse Brad com suavidade, querendo beijá-la de novo. Será que imaginara toda aquela avidez, a sensação de estar de volta ao lar, quando haviam se beijado da primeira vez? Passou o dedo pelo braço de Samantha, que estremeceu. Segurou-lhe o pulso e levou-lhe a mão aos lábios, beijando-lhe a palma, depois a colocou sobre seu ombro. Precisava que ela o tocasse, agora que descobrira o gelo em que vivera aqueles anos todos.

— Como vou indo?

A resposta de Samantha foi pular para fora da pick-up, ir até o cercado de Leroy e começar a contar-lhe as peripécias do dia. Brad foi para o seu lado e enfiou as mãos nos bolsos traseiros para evitar que elas a agarrassem e a puxassem para si. Queria aninhá-la em seus braços e espantar os temores que a faziam fechar-se para ele.

— A parte em que se beija a mão vem depois que ela lhe der algum encorajamento, Brad. Ainda não falamos nem de segurar as mãos, quanto mais de beijar!

— Ah — disse ele, em tom de reverência.

Então se reclinou para beijá-la sob o luar. Passou-lhe os braços ternamente em torno da cintura e puxou-a para junto de si. Um arrepio a percorreu e Brad aninhou o rosto dela junto a seu pescoço.

— Seus óculos são frios — sussurrou-lhe, tirando-os e enfiando-os no bolso. Quando ela resistiu aos braços que tentavam puxá-la de novo, beijou-a com tanta doçura que ela achou que o coração fosse lhe sair do peito. Provou o canto de seus lábios e ela estremeceu, o que o deixou contente.

— Não vai dar certo — disse Samantha, perturbada, recuando.

Brad notou o medo em seus olhos, iluminados pelo luar. Passou os dedos pelos cabelos macios e levantou-os ao luar, estudando as pontas brilhantes e absorvendo a fragrância.

— Eu te quero — disse ele, com serenidade, percebendo que fazer amor com Samantha iria ser a sua perdição.

Ela pareceu ficar horrorizada; arregalou os olhos. Arrancou os óculos do bolso dele, colocou-os sobre o nariz e o encarou.

— Brad, você é um caso perdido! Até chegar nesse estágio, muita água precisa rolar por baixo da ponte.

— Quando a gente acha a mulher certa é melhor cortar etapas — sugeriu ele, em voz rouca.

— Bah — disse ela, em descrédito. — Você é mesmo um caso perdido. O romance precisa de fogo brando, como um bom prato de chili, com pimenta e cebola. É preciso tempo para os temperos pegarem. Não pode fazer uma proposta assim antes do momento amadurecer. Antes que a pimenta e a cebola se juntem.

— Oh... se juntem... — repetiu ele em voz sensual, fitando-lhe o corpo todo lentamente e desejando-a com cada partícula de sua alma e seu corpo.

Samantha fitou-o, então levou a mão à testa dele.

— Está muito quente, Brad. Espero que não tenha pegado a doença de Norm!

— Meu coração parece estar batendo mais rápido — sussurrou, ao sentir os seios de Samantha se esfregarem nele de leve. Ela encarou-o aterrorizada e levou a mão ao coração dele. Os dedos de Brad cerraram-se em torno de seu pulso para mantê-la ali.

Quem era aquela mulher que se preocupava tanto com os outros? Que cuidava dos velhos, dos doentes e dos aflitos? Que protegia Lúcia e Carina como se fossem de sua própria família? Que não se achava realmente desejável?

— O que ele fez para você? — perguntou Brad suavemente, vendo-se cercado pelas serpentes venenosas dos medos de Samantha.

CAPITULO QUATRO

Ele é bonzinho, mas parece tão solitário — disse Lúcia na tarde seguinte quando foi pegar seu pagamento, levando Carina consigo.

Brad estava na frente do Sammy's, cercado de homens com iscas Remington nos bonés.

Eu te quero.

Samantha sacudiu a cabeça, tentando livrar-se da voz de Brad e da noite insone.

Nenhum homem jamais lhe dissera que a queria naquele tom calmo e sensual, forte e intenso demais para ser falso. Ele a aterrorizara tanto que ela correra para o pick-up e fugira. Parara em frente à sua casa, atravessara o portão, os degraus da entrada e a porta correndo, e a trancara atrás de si. Ofegando, correra escada acima para seu quarto e se atirara na cama, puxando o pesado acolchoado de penas até o queixo. Fitara a lua por entre as cortinas de renda e tremera.

Samantha Jane Ames, uma mulher capaz de lutar por uma causa ou por uma alma ferida, sem ligar para os riscos pessoais, estava ali, toda vestida, embaixo do acolchoado, tremendo de medo e fitando a lua como se esperasse que um vampiro deslizasse por um raio de luar e...

Eu te quero.

Brad reavivara medos que havia sufocado por anos, e agora eles clamavam por vingança. Era aquela cara de cachorrinho abandonado, decidiu, por volta das duas da madrugada. Fisgara a isca.

Há muito tempo Samantha parará de pensar em si própria como uma mulher desejável. Estivera a salvo até Brad começar a lançar-lhe beijos doces e olhares famintos.

Não queria aquela dor nunca mais.

Naquela manhã, Brad assumira novamente o lugar de Norm ao café da manhã, como se trabalhasse ali há anos. Quando Norm retornara ao meio-dia, sentindo-se melhor e pronto a terminar seu turno, Brad acenara para Samantha, que se mantinha a distância. Então saíra do bar com uma sacola de alimentos para Leroy.

Agora lá estava ele na calçada, bem na hora em que ela ia sair do bar. Pelos gestos, os homens conversavam sobre pesca com mosca artificial. Em junho a pesca estaria na moda, com o sr. Iscas Remington nas vizinhanças...

— Gosto dele — dizia Lúcia, ajeitando a tiara nova de Carina. — Espero que encontre o que está procurando. Ele precisa de um pouco de felicidade. Todo mundo precisa!

—Lúcia... — começou Samantha, sem saber como abordar a questão da inadequação de Brad como marido em potencial para as jovens.

Brad entrou no bar no instante em que Tom Freeman colocava uma moedinha na vitrola automática; uma canção lenta preencheu o bar e Maizie e Joe Brown, um casal de velhos muito apaixonado, levantou-se para dançar como dois pombinhos.

Os olhos de Brad e Samantha se encontraram de imediato. A fome ardente que vira nos olhos dele sob o luar da noite anterior se reavivou, fazendo-a prender a respiração.

Então Carina começou a puxar o jeans desbotado de Brad, erguendo os braços para ele e balbuciando:

— Qué dantá!

A expressão de Brad se alterou e imediatamente o desejo intenso foi substituído por um olhar terno e sofrido.

Com muito cuidado, inclinou-se para Carina e levantou-a nos braços.

— Qué dantá! — insistiu Carina, pondo as mãos gordinhas nas faces dele.

— Olhe só! Ele é tão doce — disse Lúcia, com vivacidade, envolvendo-se com os braços como se abraçasse com força seus próprios sonhos.

Samantha olhou para Lúcia, viu a fome e a dor estampadas naquele rosto jovem por baixo dos cachos de cabelo que sempre lhe serviam de escudo.

Quando Brad começou a dançar lentamente com Carina, aquele rosto se iluminou, e Samantha engoliu em seco, percebendo que as lágrimas ameaçavam correr.

Lúcia suspirou, tristonha, e levou as mãos ao peito.

— Nunca conheci meu pai — murmurou, abalada. — Mamãe me falou dele. Ele não era bom. Não era como Brad. Eu sempre quis que Carina tivesse o pai que eu não tive... alguém como Brad. Toda vez que olho para ele, sinto algo estranho no coração. Talvez porque não tenha visto muitos homens bons na minha vida.

Samantha estremeceu. Via Brad falar ternamente com Carina enquanto se deslocavam pela pista. Seu ar masculino, em jeans e camiseta, era suavizado pela roupinha cor-de-rosa da menina. Ele estava concentrado na menina e ela fascinada com ele, tocando-lhe o rosto e sorrindo timidamente. Ele fechou os olhos quando ela lhe acariciou as mechas negras; o cenho franzido revelava o quanto se comovia com a doçura da criança.

— Não é uma cena de trazer lágrimas aos olhos? — disse Norm por trás de Samantha, enxugando os olhos com um canto do avental. — Cebolas — explicou, trêmulo.

Assim que a dança acabou e Brad baixou Carina gentil e vagarosamente até o chão, Lúcia suspirou. Quando Carina ergueu os braços para abraçá-lo e beijá-lo, os olhos dele se arregalaram, como se estivesse espantado. A emoção iluminou-lhe o rosto sombrio como se parte de sua alma houvesse chegado ao paraíso.

Norm soluçou alto enquanto Brad via Carina correr para Lúcia.

— Obrigada — disse Lúcia, seguindo em direção à porta.

Pela janela, Brad a viu sair do bar às pressas e voltou-se para Samantha, com uma expressão de dor, fitando-a, sondando-lhe as profundezas da alma com seu jeito calmo e determinado.

Ele a assustava. Tentou respirar e viu aquela mão enorme erguendo a sua até seus lábios.

— Lúcia não é para você — sussurrou-lhe, abalada, depois de pigarrear.

— E quanto a você, Samantha Jane? — murmurou contra sua palma. Ela manteve aquelas palavras fechadas na mão quando a retirou.

— Não— respondeu, virando-se para fazer milk shakes de cereja para os Brown.

Brad viu-a oferecer uma segunda fatia de torta a Mack Jones e se virou abruptamente. Quando Samantha passou por ele, falou, em tom calmo:

; Vou levar você para casa. Pode me dar uma aula no caminho.

Então saiu à porta, sendo logo cercado pela multidão com bonés cheios de iscas artificiais.

Uma semana depois da invasão de Brad à cozinha do Sammy's, Norm se acostumara a dividir sua grelha durante as horas mais movimentadas do bar. Riam e trocavam histórias de cozinha. Observavam, com curiosidade, Samantha fritar cebolas todos os dias.

Samantha não se acostumara com nada. Sua vida estava uma bagunça, a segurança desaparecia sempre que Brad se aproximava. Perdia horas de sono e nem a terapia de fritar anéis de cebola funcionava.

Sonhava com aquela voz rouca e grave sussurrando "eu te quero".

A primeira vez que Brad seguiu suas instruções para fazer a torta, quase desmoronou vendo aquelas mãos imensas trabalhando a massa. Os dedos tocavam cada ponto da massa do mesmo jeito metódico como quando haviam acariciado as asas das moscas artificiais. O corpo de Samantha vivia em estado de alerta, tenso e reagindo ao mínimo gesto.

Samantha apreciava o progresso de Brad em relação a Lúcia. Ele agia de modo amigável, mas não namorador. Samantha não podia proibir-lhe de atender ao desejo de Carina de dançar com ele; o coração ficava apertado ao vê-lo se inclinar todo trêmulo e levantar a menina nos braços. Dançava com ela como se aquele fosse o momento mais belo e mais precioso de toda a sua vida. A cada vez que dançavam, os olhos de Samantha se inundavam de lágrimas, que não tinham nada a ver com as cebolas.

Todas as tardes, quando terminava seu turno de trabalho, Brad a levava para trocarem lições.

Samantha resolvera que seria bom ter algumas aulas de pesca. Severo, mas paciente, Brad a via perder várias de suas iscas preferidas no lançamento. Em troca, ela lhe explicava como uma mulher agia quando estava interessada. Brad parecia respeitar a distância que ela insistia em manter entre eles.

O pai de Samantha, ansioso com a primeira demonstração de Brad em Elegance, pedira para a filha ajudar. O grande acontecimento movimentou toda a cidade e redondezas. Haveria até uma parada de porquinhos, liderada por Leroy.

No grande dia, a cidade toda viu quando o sr. Iscas Remington se inclinou para morder-lhe o lóbulo da orelha enquanto lhe sussurrava descrições obscenas do que desejava fazer com ela.

Com o traseiro grudado ao corpo rígido de Brad, não pôde deixar de notar o desejo dele. Nem o seu próprio, já que as pernas bambeavam.

Nem o sorriso deliciado do pai, vendo e aprovando tudo.

Sem dúvida pensava em conseguir anúncios de graça no catálogo das Iscas Remington...

Carina se deliciava quando Brad a segurava com um braço enquanto, com o outro, lançava a linha no anel colorido que ela escolhia. Ficou encantada quando ele lhe deu a coleira de Leroy para puxar na parada dos porquinhos.

Samantha viu-se de mãos dadas com ele enquanto Carina conduzia Leroy pela rua, parando várias vezes para mexer, com orgulho, no chapéu florido do porquinho.

Quando Brad a levou para casa ao final das festividades, notou uma dobradiça solta em sua porta e apertou-a com a faca. Samantha hesitou ansiosa para se afastar; Brad a puxou para si e a beijou até que derretesse.

Ou teria derretido por causa do que lhe dizia? Sobre o quanto a desejava... De repente, viu-se arqueando na direção dele, colando o corpo ao dele e beijando-o com o calor que sufocava desde a adolescência. Explodiu em desejos vulcânicos quando Brad insinuou a língua em sua boca e sugou ritmicamente. Quando as mãos gigantes lhe subiram pelas costelas, ardeu de desejo de tê-las sobre os seios. Com um gemido faminto, Brad cobriu-lhe os seios lenta e ternamente.

Ele respirou fundo e suspirou de prazer, apalpando-lhe as formas até ela se sentir mais do que desejável.

Naquela tarde de junho, abrigada pelas parreiras que ocultavam sua varanda, Samantha teve sua primeira aula de como se sentar no colo de um homem. Ali, na cadeira de madeira da varanda, ele a acariciou ternamente até que parasse de tremer.

— Samantha... — falou então, com um leve sotaque sulista que a assustou tanto que a fez pular e entrar correndo dentro de casa.

No domingo seguinte, na terceira semana de junho, Brad sentava-se à margem do rio, só de jeans, terrivelmente atraente, com o sol de fim de tarde espalhando-se por sua pele bronzeada. Samantha, que tentava se concentrar no lançamento e em manter baixa sua cota de pesca de aguapés, espiava às ocultas os pêlos cinzentos que a torturavam em sonhos. Ele abrira o cinto do jeans depois do piquenique e a imagem daquele corpo alto estendido sobre a toalha era perturbante.

— É preciso dar espaço para a mulher antes de dar o bote — disse Samantha, distraída, concentrando-se na truta que surgia à tona, longe da sua área de lançamento. — Não pode vir todo ardoroso quando não é o momento adequado para as mulheres. Como quando me olhou daquele jeito no fim do jogo de vôlei. E não precisava dizer para Johnny para acabar com aquela história de bater no meu traseiro. Pareceu agressivo da sua parte.

— Você estava suada — observou ele. — E eu fui agressivo. Não jogue o braço para a frente tão cedo.

— Bater no traseiro é normal em jogos, Brad. Assista a algum jogo de futebol na televisão... E daí que eu estava suada? As mulheres suam, também. O jogo foi difícil. — Estava tensa, percebendo que ele não tirava os olhos dela. Enxugou a palma suada no brim do short e preparou-se para lançar de novo. — Nunca, nunca diga a uma mulher que ela sua, Brad! Zero para você!

— Venha cá — murmurou ele, tão baixo que o rumor do rio quase encobriu as palavras.

Os alamos estremeceram sob a leve brisa e os pássaros cantaram.

Samantha parou no meio do lançamento.

— Venha cá, Samantha — repetiu ele, naquele sotaque que a fazia tremer.

Engoliu em seco, lembrando-se da expressão de Brad naquela manhã. Olhara para o camisão dela e para as pernas nuas, bem devagar. Então a enlaçara e sussurrara em voz rouca:

— Escolha: fazemos amor aqui na sua varanda ou vamos pescar.

Acabaram indo no pick-up dele, deixando Leroy com Lúcia e Carina.

Agora lá estava ele, estendido às margens do rio, convidando-a a sentar-se a seu lado. A espera terminara; chegara sua hora. Engoliria a isca deliciosa de Brad ou teria de carregar seus medos por toda a eternidade.

Ao fitá-lo, soube que desejava Brad Remington mais do que ao ar perfumado da montanha e aos raios do sol.

Mais do que à maior truta que houvesse no rio.

Brad pegou-lhe o tornozelo e lançou-lhe um olhar ardente e violento.

— Venha cá — sussurrou sensualmente, acariciando-lhe a pele e mostrando-lhe que ela podia escolher a música e o ritmo. Ou ir embora.

Samantha reclinou a cabeça, não querendo deixar que ele comandasse o espetáculo sozinho.

— Homem que manda em mulher está fora de moda, Brad Remington!

— Venha cá e me conte sobre isso. Quero saber mais. Acho que estou melhorando. Talvez os góticos possam aprender, no fim das contas!

— Nada de trapaças — acrescentou ela, se deixando puxar para o acolchoado.

Ele sorriu de um jeito que a fascinou.

— Obrigado pelos conselhos — murmurou, contornando-lhe a boca de leve com o dedo.

— Não teste o que aprendeu com Lúcia — avisou-lhe Samantha, sem querer pensar nas outras mulheres que Brad poderia olhar daquele jeito ávido, quente, tenso.

— De jeito nenhum —- concordou ele, entre beijos tão doces que a faziam cortar a respiração. A mão gigante descansava agora sobre o estômago dela, por baixo da camiseta, acariciando-lhe a pele, até os dedos deslizarem por baixo da cintura da calça e se espalharem por seu abdômen.

Samantha não conseguia respirar e nem queria; a respiração poderia roubar-lhe a doce expectativa. Não conseguiu tirar os olhos de Brad até ele olhar para o ponto onde os dedos dela haviam se cerrado em torno de seu pulso.

— A última vez que fiz amor com uma mulher foi há muito tempo — sussurrou ele, em voz grave e profunda. — Acho que sou monogâmico.

— Isso é bom, eu também sou assim — Samantha se ouviu dizer, enquanto os dedos dele massageavam-lhe o ventre cada vez mais baixo e o cinto se abria.

— A gente pode estar fora de forma.

A voz grave ressoou na tarde de junho enquanto ela o via estudar-lhe as pernas nuas.

— Pode — concordou ela, com o último átomo de ar em seus pulmões, fechando os olhos quando os dedos másculos a penetraram intimamente.

O corpo de Samantha se enrijeceu e os músculos internos se contraíram num ritmo suave; foi conduzida ao extremo da paixão, contorcendo-se e estremecendo por um segundo ou uma eternidade. Como uma pomba alçando vôo no céu azul, um grito brotou de dentro de si, alto e intenso, assustando todas as trutas do rio.

Forçando as pálpebras a se abrirem, encontrou Brad franzindo o cenho para ela, com expressão concentrada.

— Não ria — murmurou ela, refugiando-se na coisa sólida mais próxima: o corpo de Brad. Enterrou o rosto ardente junto ao seu pescoço e estremeceu até ele a enlaçar e falar-lhe ternamente.

— E agora, Samantha, vai me contar sobre Jack... sobre o que ele fez para magoá-la. — Brad alisou-lhe as costas. — E por que sempre que você vê um bebê faz cara de quem viu o próprio demônio.

Samantha cravou os dedos nos ombros quentes de Brad, lutando contra o medo e hesitando diante da segurança que ele lhe oferecia. Afastou-se um pouco e fitou as agulhas dos pinheiros brilhando sob os raios do sol.

Brad lhe dava o tempo para pensar, para acertar contas com o segredo que jamais revelara a ninguém.

Pensou bastante, relembrando os anos passados, até falar:

— Foi tortura mental. Sei disso agora. Eu amava Jack, e um casamento sem filhos teria sido perfeito. Ou então poderíamos ter adotado um. Mas ele achava que ser homem implicava em ter filhos, de preferência meninos. Quando eles não vieram, começou a fazer comentários baixos, humilhantes, dizendo que eu não era mulher o bastante. Eu me dispus a fazer testes; Jack não quis saber. Acho que é isso mesmo, ele não queria saber.

Brad beijou-lhe a testa e a embalou contra si ternamente. Ela colou-se a ele, sentindo-se segura.

— Eu o amava tanto que assumi a culpa, sem questionar. Ele decidiu que eu era estéril, e talvez seja. Acho que passei a pensar como ele pensava... que uma mulher estéril não é desejável, não é uma mulher.

Tentou sorrir, mas desistiu ao ver a expressão de Brad. Trêmula, Samantha percebeu que lágrimas lhe rolavam pela face e as enxugou.

— Tolo, não é? Ainda dói, depois de todos esses anos. No final, eu não quis saber se podia ter filhos. Simplesmente não quis saber, porque, se não pudesse, Jack estaria certo... Na verdade, eu não o excitava mais. Ele não me queria... Sei disso. Mas, ainda dói.

O palavrão de Brad indicando o que gostaria de fazer com o ex-marido dela foi curto e objetivo. Com os dedos trêmulos, acariciou-lhe as pálpebras, o nariz, a boca.

— Você é uma mulher, Samantha Jane, de corpo e alma — sussurrou-lhe, abalado, beijando-lhe os lábios trêmulos. — Qualquer homem que não seja um completo idiota se orgulharia de tê-la em sua vida.

De repente, Samantha percebeu que lhe agarrara a cabeça para que ele não afastasse a boca.

— Vamos fazer isso, não vamos, Brad?

— Claro que vamos, Samantha Jane. Vamos fazer amor e acabar com todas as dúvidas sobre se você é desejável ou não, porque se eu não a possuir logo, vou ficar em situação embaraçosa... E você ainda acha que não é desejável!

Ela riu alto, sentindo-se jovem, alegre e terrivelmente atraente enquanto Brad, trêmulo, tirava-lhe as roupas, beijando cada novo centímetro que descobria e transformando os bicos de seu seio em dois pontos ardentes. A boca máscula, sugando e mordendo, aumentava-lhe o desejo, que logo se estendeu para todo o corpo. Só sentiu alívio quando ele se deitou sobre ela, sem nenhum pedaço de pano entre ambos.

Brad a fitou com um sorriso quase tímido e muito terno. Ela afastou uma mecha de cabelo da testa dele. Brad se ajeitou com cuidado, como se estivesse chegando em casa e para ficar.

—Tenha paciência comigo, Samantha Jane. Sou um homem velho e que eu saiba não há nenhum estudo que indique que os góticos possam sobreviver fazendo amor do jeito que quero fazer com você.

Samantha sorriu e esfregou a sola nua do pé na panturrilha dele.

— Venha cá — sussurrou ela, acariciando-lhe os ombros trêmulos. — Vou cuidar de você, sr. Iscas.

A expressão de Brad ao penetrá-la foi a de quem experimenta o momento mais belo de toda a sua vida. Samantha lembrou-se da cara dele ao dançar com Carina e pensou em que pai maravilhoso ele teria dado. Conteve a respiração.

— Está tremendo... Está com frio?

— Nem um pouco — murmurou ele junto ao seu pescoço. — Estou me concentrando.

— Em quê? — perguntou ela, sorrindo, segurando-lhe os quadris e puxando-os para si.

— Não foi você que falou que eu não conseguia me concentrar e falar ao mesmo tempo? — perguntou ele em voz rouca e cheia de paixão entremeada de humor.

— Eu vou ajudar — prometeu ela, enlaçando-o com as pernas.

— Obrigado — foi tudo o que ele conseguiu dizer antes de seguirem numa viagem ardente e intensa que explodiu em algum lugar próximo ao sol.

Brad se recusou a deixar Samantha ir, puxando-a para mais perto e arrumando o acolchoado sobre ambos. Fitavam o brilho, do fim da tarde por entre as folhas sobre suas cabeças. Com um suspiro, ela se aconchegou junto a ele, aninhando o nariz nos pêlos do tórax másculo.

— Você tem um pêlo grisalho aqui — observou.

— Envelheci nos últimos minutos — explicou ele, com um longo suspiro de prazer.

Na verdade, estava pensando no que Brad dissera no auge da paixão, no exato instante em que um grito escapava das entranhas de Samantha e que se entregavam um ao outro do modo mais belo... Eu te amo, Samantha... Eu te amo...

Apertou os olhos fechados. Embora jamais houvesse passado por aquilo, já ouvira dizer que a paixão poderia extrair uma declaração como essa de um homem.

— Eu te amo, Samantha Jane. Acostume-se com isso — ordenou Brad, sonolento, bocejando. — Há semanas não durmo, por culpa sua — continuou no mesmo tom sulista arrastado.

Os olhas de Samantha se arregalaram. Aquilo a arrepiou mais do que o frio da noite que se aproximava. Ergueu-se de um pulo e começou a se vestir.

Brad franziu-lhe as sobrancelhas.

— O que está fazendo?

Eu te amo, Samantha... Ela não havia pensado no amor, na dor que poderia trazer, no dilaceramento da alma e... Pulou num pé só tentando calçar o tênis, com as pedrinhas machucando-lhe a sola do pé.

Calçou o pé direito no esquerdo e vice-versa, e vestiu a camiseta de trás para frente.

—Volte já para esta cama — ordenou Brad, com o tom de marido que diz isso toda noite à mulher.

— Sabe que idade nós temos? — perguntou-lhe, tentando freneticamente enfiar as calcinhas e o sutiã no bolso do short.

Brad passou os dedos pelo cabelo e ela corou ao ver que seu membro estava ereto de novo.

— Cubra-se — ordenou, trêmula.

Eu te amo... Não estava preparada para a invasão de um homem em sua vida, fazendo-a sentir-se desejada e ordenando-lhe que voltasse para a cama no tom de marido irado.

Brad não parecia um marido, entediado e querendo roncar. Passava os olhos pelas pernas dela e pelos mamilos como se quisesse uma segunda dose.

— Acho que estou começando a entender essa história de ser um bom par romântico. Por que não vem aqui e me ensina mais?

— Oh — disse ela, desviando os olhos daquele olhar abrasante — acho melhor irmos, não acha? Preciso acordar cedo e preparar as tortas. Segunda é um dia movimentado no bar.

— Leroy vai ficar com Carina e Lúcia esta noite — insistiu ele, esperançoso.

— Com certeza vai se divertir muito — disse ela, com firmeza, dando-lhe as costas enquanto ele se vestia.

— Vou ficar solitário — declarou Brad, chegando por trás dela e enterrando o rosto quente contra seu pescoço. Embalou-a contra si e sussurrou:

— Não tenha medo, Samantha. Tudo isso é novo para mim, também.

Ela estremeceu, mesmo aninhada ao calor dele.

— Da próxima vez, vamos mais devagar. Você me deixou louco... Fazer amor com um furacão ruivo e impaciente pode acabar com o controle de um homem. Especialmente quando ele está sem prática. A prática faz o desempenho melhorar.

Então, inclinando-se ao ouvido dela, falou, com firmeza:

— Agora, vamos deixar uma coisa bem clara, Samantha Jane. Não vai me passar adiante como fez com os outros caras, bancando a casamenteira. Porque eu estou aqui e é aqui que vou ficar. E a única mulher pela qual sou tarado é você...

Riu francamente quando ela se soltou e saiu correndo encosta acima, e ela se perguntou quando fora a última vez que ouvira um gótico rir.

Abrigou-se no canto do pick-up enquanto Brad se sentava atrás do volante. Juntou as mãos e estudou-as, vendo-as tremerem.

Brad encarou-a.

— Chegue mais perto. Preciso praticar dirigir e colocar a mão no joelho da minha namorada.

— Brad — disse ela, aproximando-se e deixando-o colocar a mão em seu joelho —, o que as pessoas vão dizer? Você me leva a pescar e nunca pega nada, você que é um famoso pescador? Eles vão saber... Sabe que idade nós temos?

— Droga! Somos crianças, Samantha. Não se sente como uma criança? — perguntou, com um sorriso e um beijo doce.

CAPITULO CINCO

Brad começou a testar sua nova isca de madrugada. "Samantha", um inseto exótico, cor de fogo, cintilante, sensual, percorreu o rio com um ar altivo, ziguezagueando celeremente sobre a superfície das águas como a verdadeira Samantha. Projetar e fabricar "Samantha" fora a única forma que encontrara de não pensar tanto na falta que a Samantha real lhe fazia naquela noite. No entanto, o desejo aumentara tanto durante a noite que quase deixara de lado seu projeto para ir procurá-la.

Ela estava aterrorizada e precisava de tempo para refletir sobre o que acontecera entre eles.

Brad deu um piparote, lançando "Samantha" nas águas sombrias. Manejou-a de um lado para o outro e desviou-a das trutas que a perseguiam. Roçou nas águas, com o sol do alvorecer lhe incidindo sobre as asas de plumas, e Brad puxou a linha para evitar uma truta de dois quilos que a atacava.

Antes de fazer amor com Samantha, pretendia ter-lhe dito o quanto a amava e contado toda a sua vida, toda a verdade sobre Lúcia e Carina.

Pela forma como ela agira, reservada, Brad concluíra que os ex-namorados não haviam compartilhado da intimidade dela como ele e nem iriam fazê-lo no futuro. Iriam permanecer monogâmicos, ele e Samantha...

Puxou a linha rápido, franzindo o cenho, quando três trutas prateadas emergiram e seguiram "Samantha" até os aguapés. Lembraram-lhe os ex-namorados...

Ele a amava. Samantha era a sua outra metade, e ele se sentia completo só de vê-la. Tinha tanta certeza como quando um peixe fisgava sua isca e a levava embora.

Com esse amor, vinham temores que o arrepiavam até os ossos. O que sabia ele do amor?

Os mistérios da lógica feminina o aterrorizavam. Os homens às vezes se afogam nas sutilezas emocionais das mulheres.

Graças ao ex-marido, Samantha temia laços permanentes.

Brad lançou a linha outra vez, fitando as águas tranqüilas e espumantes. O que não sabia, aprenderia, e tentaria de novo.

Samantha era muito rápida. Pegara-o desprevenido, antes que pudesse lhe contar quem era e por que olhava para Lúcia daquele jeito. Tão desprevenido que até o preservativo que levara na carteira ficara lá mesmo. Ele era um fracasso como Romeu, e talvez estivesse fora de forma como amante.

Estremeceu ao lembrar-se do medo que vira no fundo de seus olhos cheios de lágrimas. Samantha tinha direito a seus temores, ele teria de esperar até que ela tivesse a segurança de que não a magoaria...

Essa idéia o consolou. Sorriu e livrou "Samantha" de uma truta marrom faminta que a perseguia com avidez. Afinal, Samantha se atirara sobre ele! Apertara-o contra si, beijara-o e arruinara seu esforço para se controlar. Gritara em alto e bom som, gritos vindos do fundo de suas entranhas, quando um se entregara ao outro de um modo tão profundo e verdadeiro como jamais haviam experimentado. Então seu coração parecera parar... e depois, quando seus músculos pararam de se contrair e ela se derretera sobre ele, sua respiração era tão suave como a da pombinha que arrulhava agora entre as cerejeiras.

Brad olhou para o local onde haviam se deitado; teria de agir com cautela, manter a linha esticada. Samantha precisava de tempo.

Pretendia ficar a seu lado pelo resto da vida... e amá-la com tanto carinho que as feridas causadas pelo ex-marido cicatrizassem... Abafando o arrulhar da pombinha, Brad gritou um palavrão contra o homem que a magoara.

Samantha largou o misturador e viu o monte cada vez mais alto de açúcar espalhado sobre o balcão: pensava no momento em que fizera amor com Brad.

A pirâmide de açúcar derretia ao sol da manhã que penetrava pela janela do bar. Passou a ponta do indicador sobre ela.

Comparado a Jack, o único homem a quem se entregara, o modo de Brad fazer amor parecia de outra galáxia. Suspirou, lutando contra a falta de sono e a sensação estranha de calor que latejava em seu corpo.

Despertara num emaranhado de lençóis, com o corpo pulsando e o coração cheio de alegria...

Eu te amo...

O beijo à sua porta fora alucinante. Brad a puxara com força contra si até que ela derretesse, então sorrira.

— Você está com o nosso cheiro — dissera, em voz rouca, insinuando a mão por baixo da camiseta para acariciar-lhe os seios. — Isso é bom.

Ficara chocada; o desprezo de Jack voltara-lhe à memória, desaparecendo assim que Brad a abraçara.

Embalara-a lentamente e começara a dizer-lhe como era gostosa, como seus corpos se encaixavam perfeitamente e como ele se sentira ao entregar-se a ela... como se fossem uma só alma, um só coração. Não era só o prazer do corpo, sussurrou ele. Havia um sentimento que jamais mudaria, que os manteria unidos pelo resto da vida.

Ela o agarrara com força e o fitara dentro dos olhos.

— Não diga que me ama, Brad Remington — ordenou, trêmula. — Somos velhos demais para dizer coisas que não sentimos...

— Sentimos sim — replicou ele, beijando-lhe o nariz.

—Não!

— É verdade — sussurrou ele.

— Não!

— É sim, Samantha Jane! A mais pura verdade. Você me fisgou. Então ele a beijara uma vez mais e dera-lhe um tapa no traseiro, antes de se afastar assobiando.

Norm chegou a seu lado, bebendo água com gelo e fitando o açúcar derramado.

— Brad, hein... Pelo menos escrever o nome dele no açúcar é melhor do que fritar cebola todo dia! Comecei a ter pesadelos todas as noites com cebolas gigantes!

Horrorizada, Samantha viu que escrevera "Brad" dentro de um coração de açúcar. Mal teve tempo de apagar ao ver Brad entrar no bar com seu pai, que sacudia um catálogo das Iscas Remington como se fosse um troféu.

Brad inseriu uma moeda na vitrola automática. Quando a música lenta iniciou, foi até Samantha, segurou-lhe a mão e puxou-a para o centro do bar. Ali, em plena manhã movimentada de segunda-feira, ele a enlaçou e sussurrou-lhe ao ouvido:

— Bom dia, Samantha.

— Com os fregueses, costumo dançar swing.

— A dança lenta tem suas vantagens. — Levou a mão dela ao coração e a encarou. — Como está se sentindo?

Samantha olhou dentro dos olhos dele e viu que ele a queria naquele mesmo instante. Sabia que havia sufocado seus desejos na noite anterior...

— Você dança bem — sussurrou ela.

— E você é um peixe difícil de se fisgar.

— Não estou acostumada com tudo isso — replicou ela, engolindo em seco.

— Sei disso. É por isso que quero levá-la para aulas de pesca essa tarde. Tem um peixe lá no rio esperando por você — murmurou Brad ao ouvido de Samantha num tom sensual que lhe deu arrepios. — Uns três quilos de pura violência... Claro, se achar que é demais para você e preferir um esporte mais calmo, estou preparado para isso também... Embora quando esteja a seu lado eu não tenha lá muito controle...

Mal conseguindo respirar, notando a força da rigidez das coxas másculas se esfregando levemente nas suas ao dançarem, ela sugou o ar para os pulmões e o forçou a sair num sopro trêmulo, lembrando-se dos ombros dele iluminados pelos raios de sol quando se deitara sobre ela.

— Leroy está sentindo a sua falta — acrescentou Brad. — E eu também.

Quando Jason Kannaly saiu de férias, Brad o substituiu na equipe de Samantha no jogo em comemoração ao dia da independência americana. Voleibol não era o seu forte; não era assim tão ágil e ferveu de raiva quando Samantha gritou com ele por perder uma bola. Ela comentou sobre a sua má forma enquanto voltavam para casa e Brad a beijou com a avidez que sufocara há dias.

Na manhã seguinte, acordou com dores por todo o corpo e quase não conseguiu fazer sua demonstração na Michaelson's. Descansou em seu banco habitual no Sammy's e, com tristeza, viu Samantha servir uma segunda fatia de torta a Arnold Riggs, um antigo namorado que era muito bom no vôlei.

À tarde, junto ao rio, cercado de verde e dourado, Brad concentrou-se na mulher a seu lado. Samantha parecia inquieta, subindo e descendo o aterro com as botas impermeáveis que ele lhe emprestara. Lançava rio acima e rio abaixo, fisgando aguapés e arbustos e até o traseiro do jeans de Brad. Derrubara uma caixa grande de iscas correndo em sua direção, ansiosa, e conseguira enredar a ambos em sua linha. Ele aproveitara para roubar-lhe alguns beijos antes que ela escapasse.

Impaciente, lançava de modo frenético, decidida a pegar o peixe gigante. Com os cabelos ruivos sob os raios do sol e o corpo esguio ressaltando-se contra os arbustos sombrios, era, apesar da falta de técnica, a mais bela visão do mundo para Brad. Ver Samantha usando suas roupas era algo tão sublime que nem conseguia expressar em palavras. De repente, teve de erguer a vara de pescar para que a linha dela não o atingisse após fisgar uma pinha, que acabou lançada ao rio. Os músculos protestaram e Brad fechou a cara, sentindo a dor do jogo do dia anterior e o desejo por Samantha.

— Brad? Você está bem?

— Estou péssimo! — admitiu ele, sentindo-se frágil e ferido. Ele, que fora metódico e paciente durante toda a vida, via-se tomado de impaciência.

Samantha parou diante dele e apertou os olhos para enxergar contra o sol.

— Está de mau humor desde que gritei com você. Sou a capitã do time de vôlei, Brad! Meu papel é gritar!

Ele respirou fundo, decidido a manter a boca fechada até Samantha resolver usá-la para algo melhor do que discutir.

— Deu mesmo o meu nome àquela isca?

— Ah-ha.

— Por quê?

— Veja. — Brad acionou a isca, e o objeto vermelho e negro se moveu orgulhosamente sobre as águas. As trutas que descansavam no rio investiram em sua direção, agitando as águas enquanto Brad a relançava rio acima. Samantha colocou a mão no braço dele e a apertou com força. Quando pôde lançar de novo, Brad deixou a isca descer o rio para poder sentir a proximidade dela, o colete surrado roçando-lhe o braço.

— Brad, eu não sei por que, mas há algo de muito indecente naquela isca... Acha mesmo que existe um peixe gigante esperando por mim?

— Sei que existe. Um só para você — disse ele com firmeza, fechando as pernas para bloquear a tensão sexual que ameaçava dominá-lo.

Ao chegarem à casa dela depois de levarem Leroy para seu passeio de fim de tarde, Brad, com a bota, não a deixou fechar a porta.

— Leroy entrou lá dentro — falou Brad, devagar, com os lábios levemente inchados dos seus beijos ávidos.

Gostava de beijá-lo. Gostava de colar-se àquela boca firme e triste e fazê-la ficar ávida e macia ao mesmo tempo. Gostava de passar a língua por aqueles lábios, provocando-o. Adorava segurar aqueles ombros, agarrando-se a eles e vendo o modo como os deixava tensos. Brad era tão lento, tão metódico, suas mãos demoravam um século para deslizarem até os seios, para dedilhá-los, alisá-los, acariciá-los.

Não se atirara nos braços de Jack nem de nenhum dos ex-namorados, os quais, na verdade, ela só havia guardado consigo até alguém mais adequado aparecer e reivindicá-los. Samantha não tinha a menor vontade de servir de cofre para Brad e depois entregá-lo a outra mulher.

Por outro lado, não suportaria comprometer-se com outro homem, sujeitar-se à dor da rejeição.

Sentia que, ao gritar com ele, tocara em algo profundo dentro dele, ferira-o.

— Você anda tenso, aborrecido — disse ela com suavidade quando ele empurrou a porta com a mão. — Vou pegar Leroy.

— Nem tente — falou ele, num tom que a deixou de cabelos em pé.

Então ele entrou na casa. Passou os olhos pela sala de estar, onde Leroy se instalara num tapete em frente à lareira. O porco dormia, roncando.

— Ele está exausto — sussurrou Samantha. — Talvez seja melhor deixá-lo aqui esta noite.

Brad resmungou:

Eu é que estou todo dolorido, Samantha Jane, além de não ter dormido muito bem!

Samantha apertou as mãos. Brad se sacrificara pela vitória de sua equipe e jogara muito bem depois que ela o repreendera. Agora percebia o quanto aquele esforço devia ter-lhe custado.

— Acho que uma massagem com linimento vai lhe fazer bem. Gostaria?

Jack nunca a deixara cuidar dele, e esperava que Brad recusasse a oferta.

— Gostaria muito. Onde quer que eu fique? — perguntou ele, olhando esperançosamente para as escadas que levavam ao quarto dela.

— Quer conversar sobre isso? — sussurrou Lúcia a Samantha na manhã seguinte ao servir um prato de biscoitos para Mac Johnson.

Ouvindo Brad cochichar alguma coisa com Norm enquanto preparavam panquecas, Samantha estremeceu.

Naquela manhã, apesar de se mover com certa rigidez, ele não parecia, alguém que passou a noite em seu sofá; mostrava-se alegre como um menino com um brinquedo novo. Samantha enxugou o leite que derramara no balcão e sacudiu a cabeça para Lúcia. A jovem sorriu.

— Ele é ótimo. Vocês foram feitos um para o outro. Ele é o único homem capaz de lhe dizer que você é rabugenta de manhã e ficar ali tomando o seu chazinho até você melhorar de humor. Você ficou morta de raiva quando ele lhe falou que estava espantando os clientes. Aí, quando ele a beijou para que parasse de brigar, parece que você desmoronou.

O terror invadiu Samantha.

Brad parecera tão tranqüilo em sua casa, fitando-a com interesse em seu quarto de manhã. Sorrira de leve quando ela erguera as cobertas até o pescoço.

Sentir timidez diante de Brad e, ao mesmo tempo, um pouco de enjôo, fora algo irritante.

Ele andara por todo o quarto, tocara a grinalda de rosas secas com a ponta do dedo, estudara as fotos da família sobre a escrivaninha. O cheiro do homem que acabara de sair do banho enchera o pequeno quarto. Ela notara uma gota d'água presa ao pêlo grisalho de seu tórax...

Só de jeans e recém-barbeado, Brad era perigoso e atraente.

— Consertei o vazamento da sua pia — anunciou, pensativo, olhando pela janela. Então voltou-se para ela, com olhos intensos que a fizeram engolir em seco. — Eu te amo. Alguns anos atrás, sonharia em ter filhos com você... Adotar crianças, compartilhar nossas vidas com eles. Mas agora eu me contento com uma segunda fatia de torta — acrescentou de modo estranho, como que para si mesmo. — Ou com um convite para ir para a sua cama.

Um segundo depois, Brad se fora, levando Leroy consigo de volta à cabana.

Samantha sacudiu a cabeça. Jack não queria saber de consertos caseiros, de ficar na cama com ela até tarde nem de adotar crianças...

Brad se encaixava tão bem em sua vida. Essa idéia a aterrorizava; temia perder a segurança baseada na liberdade que tanto lutara para obter.

Seus dedos ficaram gelados; percebeu que agarrava o balcão com toda a força. Deu um sorriso forçado para os Johnson, que se sentavam-se à mesa do canto.

— Amora — dizia Norm.

— Clima quente... a temperatura vai subir hoje... — murmurava Lúcia, tirando o cabelo do rosto e prendendo-o no topo da cabeça.

Sem a massa de cachos escuros quase lhe escondendo o rosto, Lúcia parecia estranhamente familiar. A testa curvada na região das sobrancelhas, os ossos da face salientes...

— Mel de trevos é melhor — disse Brad saindo da cozinha e trombando com Samantha, que fitava Lúcia.

Samantha desviou os olhos para o rosto recém-barbeado de Brad. Estudou a estrutura dos ossos e as sobrancelhas que se erguiam sobre os olhos, um tanto oblíquos nos cantos, exatamente como os de Lúcia.

Olhou para a boca feminina de Lúcia e comparou sua expressão suave com a expressão rígida de Brad...

Brad assumiu uma cara de preocupação quando Samantha se voltou devagar para Lúcia, estudando-a com mais atenção ainda.

— Você... hã... você...

— Vamos sair daqui! — disse Brad, com maus presságios, puxando-a para fora do bar pela mão.

Samantha firmou os pés no chão e agarrou-se a um poste com a outra mão.

— Brad?

Ele acenou para o xerife, que, da viatura, olhava para eles com curiosidade.

— Venha, Samantha! Eu lhe explico tudo!

— Você é o canalha do pai desaparecido de Lúcia! — gaguejou ela ao passarem pelo armazém.

— Ah-ah. Não é uma descrição muito lisonjeira...

— Vocês são iguaizinhos! — declarou, fitando-o, ao passarem pela loja de equipamentos esportivos.

— Ela é muito mais bonita — resmungou ele, andando tão rápido que ela quase não o conseguia acompanhar.

Você é o pai de Lúcia — repetiu ela enquanto Brad a empurrava suavemente para dentro de sua casa.

— Sem tirar nem pôr — confirmou ele, taciturno, e afundou na poltrona macia com a cara de quem sabe que seu mundo está desmoronando.

Olhou para suas mãos com um ar tão solitário que Samantha se ajoelhou e tocou-lhe o rosto. Sofrendo com a dor que ele devia estar sentindo, sussurrou:

— Brad, conte para mim...

Sentou-se no colo dele e encostou-lhe o rosto ao seio. Envolveu-o em seus braços enquanto ele contava de suas buscas, das vidas perdidas por causa das mentiras... de como a encontrara e começara a criar um ambiente seguro para ela, em Elegance... Contou-lhe dos planos de entrar sutilmente na vida de Lúcia, de deixar que ela o conhecesse antes de lhe revelar a identidade...

Samantha embalou-o contra si, desejando abrandar-lhe a dor.

— Você não é canalha... nem um tarado... Esse tempo todo estava procurando por ela. Oh, Brad... Essa é a história mais triste e mais bonita que já ouvi em toda a minha vida!

Os braços másculos se enrijeceram e o corpo se deslocou sob o dela. Brad ergueu-lhe o rosto para beijar as lágrimas que lhe escorriam pelas faces.

— Fico tão feliz que você se importe, Samantha Jane! — disse ele em seu sotaque da Geórgia, e beijou-a ternamente.

Então a observou com atenção e falou, devagar:

— Eu queria ter lhe contado... Minha família vai chegar no sábado. Vêem ver Lúcia e Carina... e conhecer você. Pensam que somos noivos.

CAPÍTULO SEIS

Seu canalha... seu tarado... — resmungou Samantha em voz baixa enquanto Brad se sentava a seu lado na cama e passava o lenço molhado em sua testa.

Afundou no travesseiro. Tantas revelações juntas em questão de segundos fora demais para ela.

— Vá embora, Brad Remington. Estou...

— Zangada? Doente? — sugeriu ele, preocupado.

— Furiosa. — Jogou para longe o lenço que ele lhe amarrara à testa e o fuzilou com os olhos.

— Está aborrecida — murmurou ele, em tom de compreensão.

— Furiosa — repetiu Samantha, tentando sair daquele estado meio zonzo para poder repreendê-lo. — Devia ter me contado!

Brad parecia inquieto e Samantha percebeu que ele segurava-lhe a mão. Puxou-a com violência, colocando-a sobre o estômago, e continuou encarando-o.

— Fizemos amor há três semanas. Ambos sabemos que fazer amor era algo de extraordinário para nós dois. Era preciso que confiássemos um no outro. A honestidade é algo importante num relacionamento, não acha? — perguntou ela.

Então se lembrou do que Brad dissera ainda há pouco e indagou, em tom irônico:

— Noivos? De anel e tudo?

— É uma palavra antiquada para expressar o que sinto. — Os ombros de Brad pareciam cansados de carregar tanto peso, mas os olhos a encaravam com firmeza.

Apesar da raiva, Samantha sentiu o coração se contrair.

— Não me olhe com essa cara de cachorrinho abandonado!

As sobrancelhas dele se ergueram.

— Cachorrinho abandonado?

Samantha desejou que a cama parasse de balançar e falou:

— Fique parado, senão vou enjoar de novo.

— Vou chamar o médico — anunciou Brad, levantando-se. Apesar da nova onda de enjôo, Samantha agarrou a mão de Brad. Ele não ia deixá-la. Não agora, depois que entrara em sua vida e a estilhaçara completamente. Precisava da segurança daqueles dedos entrelaçados aos seus; ele era a sua âncora.

— Não! Vai ficar aqui mesmo e agüentar. Por que não me contou?

— Você me pegou mais rápido do que uma truta faminta fisgando a isca — declarou Brad. — O rio ficou fundo demais e rápido demais para uma boa lançada... Eu queria lhe contar de Lúcia e Carina aos poucos. Tinha receio de que você pensasse que eu era tudo aquilo que Lúcia pensa que eu sou antes de me dar a oportunidade de me explicar.

— Então toda aquela história dela herdar a casa e uma pequena pensão de um parente distante... seu benfeitor... era lorota? Então você dormiu comigo e disse aquelas coisas no meu ouvido e... não me contou?

Brad se remexeu, inquieto, fechou a cara e olhou para ela como se esperasse ser chutado janela afora.

— Não me diga que me ama — avisou ela ao vê-lo fitá-la com ternura.

— Amo — respondeu ele com firmeza, e ela gemeu, fechando os olhos.

— Deite aqui e me abrace — ordenou ela em voz fraca, querendo-o próximo em seu mundo oscilante e instável. — Mas não me balance...

— E fazer carinho, posso? — perguntou ele naquele sotaque sulista, deitando-se com cuidado e segurando-a nos braços. Samantha encostou a cabeça em seu peito e ouviu o tum-tum acelerar-se enquanto Brad lhe acariciava os cabelos. Sentiu o medo profundo que o percorreu ao perguntar:

— Só um pouquinho? Um beijo na testa?

— O que quer de mim? — perguntou ela, cheia de medo.

— Compromisso — respondeu de imediato. — Não precisa me amar. Aceito o que vier, nesse departamento. Mas não me passe para outra mulher.

Ele não a assustava. Qualquer um que assistisse à Porquinha Gostosa com Leroy não poderia ser tão mau assim.

— Bah! Isso seria crueldade. Você não serve para o casamento. Se servisse, teria me contado sobre Lúcia e Carina, as pobrezinhas.

Então franziu o cenho, lembrando-se do triste passado dele.

— Oh, Brad... O tempo todo você andou atrás delas... Lúcia pensa que o pai batia na mãe e fugiu com outra mulher. — Aproximou-se para abraçá-lo; ele suportara uma carga terrível. Então voltou à segurança de seu travesseiro.

— Não quero a sua piedade — disse ele, tristonho.

— Não acho que eu esteja preparada para a vida a dois. Não me saí bem nesse papel da primeira vez.

— Você é perfeita para mim — declarou Brad, após beijar-lhe a testa.

— Um homem não tem segredos para sua...

—Namorada? Amante? Noiva?

— Ter feito amor comigo uma vez, há três semanas, não o transforma em meu amante nem em noivo — murmurou Samantha, sonolenta. Após uma noite sem dormir, a manhã fora demais para ela. Bocejou. — Ainda não sei se existe mesmo um peixe só para mim naquele rio.

— Existe, sim! Ele está esperando por você. Vamos conversar sobre isso quando você estiver melhor.

Bocejou lentamente e virou-a de lado, de costas para ele. Então, por trás, apertou-a contra si.

— Vamos tirar uma soneca, Samantha — disse ele em voz grave e sonolenta, como se há anos tirasse uma soneca de manhã ao lado dela.

— Estou indo para o bar — avisou Samantha na manhã seguinte quando Brad a empurrou de volta para a cama.

— Fique aí mesmo!

Ela o encarou, não gostando do tom autoritário e da forma como ele lhe puxou o lençol de margaridas até o pescoço. Não estando acostumada a ser mimada, resmungou:

— E só um resfriado passageiro!

— Você tem trabalhado demais e está esgotada! Ficou branca ontem à noite no treino de vôlei. Isso depois de ficar andando de bicicleta na pista da escola com Carina no bagageiro.

— Fern McKinsey estava falando sobre como cozinhar fígado e bacon no vinho. Isso faz qualquer um ficar branco e... Não precisava me levar embora do ginásio! As pessoas vão comentar que você passa as noites na minha casa! Brad lançou-lhe um olhar como para dizer que o sofá não era seu local preferido de passar a noite.

— Posso cuidar do restaurante... E vamos tomar conta de Carina esta noite. Lúcia vai substituir você na estréia do campeonato de softball. O primeiro treino é hoje à noite.

— Sou a lançadora — disse ela com orgulho. — O time precisa das minhas bolas lentas!

— Não vai lançar nada até se sentir melhor. Pode treiná-la esta tarde após o serviço, sentada no balanço do quintal. Carina toma conta de Leroy e eu sirvo de apanhador. Vamos fazer um churrasco. Seu pai vai trazer a máquina de sorvete e eu trarei gelo para...

— Bah! Apanhador? E você pega alguma coisa? — perguntou Samantha com desdém, tentando não pensar na carne vermelha sobre a grelha, pingando gordura sobre as chamas. Nem no leite, nos ovos e no açúcar misturados pelas pás da máquina de fazer sorvete... ondas de espuma doce e viscosa...

Brad olhou para ela de um jeito tão sensual que quase a derreteu.

— O que eu queria pegar era uma certa moça de lindas pernas e possuí-la até ela implorar piedade!

Samantha decidiu não se render àquele olhar. Se Brad vencesse, nada mais o seguraria.

— É mesmo? — disse ela em tom amoroso, batendo-lhe as pestanas. E se perguntou desde quando começara a flertar.

Naquela tarde, Samantha sentou-se no balanço do quintal e assistiu ao treino de Lúcia e Brad. Lúcia, toda animada, escutava os conselhos de Samantha sobre a curva que a bola deveria desferir.

Leroy grunhia seus comentários e deixava que Carina o perseguisse alegremente. Para o pai de Samantha, aquela tarde era um acontecimento histórico; irradiava felicidade por ver um homem conseguindo domar a filha. Ele e Brad cuidavam do churrasco e conversavam sobre enterrar iscas fedorentas, o que fazia o estômago de Samantha se revirar.

Olhou para a isca no chapéu do pai, o preto e vermelho reluzindo ao sol de fim de tarde. A isca Samantha possuía um ar distinto, uma mistura delicada e sedutora de chenille e pele entrelaçadas de um jeito especial; asinhas trêmulas numa dança quase erótica...

A noite, observando Brad ler para Carina e a ninar, Samantha conteve as lágrimas que ameaçavam rolar.

Então Lúcia chegou, toda contente e excitada porque a equipe a escolhera para ficar na primeira base. Samantha comemorou as notícias enquanto Lúcia abraçava Brad e dava-lhe um beijo no rosto. Ele estremeceu e ficou imóvel por um longo tempo, até Lúcia sair com Carina, que não queria ir sem Leroy.

Brad engoliu diversas vezes e piscou. Cerrou os braços em torno do próprio corpo como se precisasse abraçar a família e mantê-la junto a si.

— Tudo está saindo de acordo com seu plano. Ela está se aproximando de você — falou Samantha, enlaçando-o pela cintura. — Venha para a cama agora, Brad. Você teve um dia duro — sussurrou, puxando-o para dentro de casa.

Ele não ia fugir para o trailer amassado e assistir à Porquinha Gostosa o resto da noite. Aquilo seria solitário demais.

— Que história é essa? — perguntou ele em voz rouca enquanto Samantha o arrastava escada acima.

— Pensei que talvez você me pudesse contar sobre o peixe gigante... sobre como é que eu posso fazer para fisgá-lo — falou Samantha junto ao pescoço dele, empurrando-o para a sua cama.

A brisa do verão penetrou por entre as cortinas de renda no instante em que ele falou, num tom arrastado e sensual:

— Estava justamente querendo lhe falar sobre isso. O quarto pareceu imobilizar-se quando ele a encarou em meio às sombras.

— Obrigado por esta noite. Por deixar que minha família se transformasse numa família aqui, na sua casa.

— Foi um prazer — respondeu ela, um tanto nervosa. — Acho que vou tomar um banho agora.

— Isso, e depois de você eu tomo o meu. Vou ver se as luzes da casa estão todas apagadas e as portas trancadas.

— Ninguém tranca as portas em Elegance.

— Bem... Vamos dizer que, esta noite, se você está se sentindo melhor... há uma razão para trancar bem as portas da sua casa — murmurou Brad, fazendo com que uma chama despertasse dentro de Samantha.

— Estou melhor — declarou ela com firmeza.

Estremeceu em pleno banho quente. Aplicou pós e loções que não abria desde o último Natal. Queria que tudo fosse novo para Brad e lutou contra o medo que despontava, contra as feridas que Jack lhe causara com palavras ásperas e olhares de desdém. Vestiu a camisola e desejou ter uma de rendas, para seduzi-lo de tal modo que ele não conseguisse pensar em nenhuma outra mulher que já tivera.

Noivos.

Oh, Deus. E se ele olhasse para ela e não a quisesse?

Tristes lembranças lhe passavam pela mente ao voltar ao quarto, agarrando o robe de chenille junto ao peito, onde faltavam alguns botões e o coração batia disparado.

Brad estava lá embaixo; escutou-o andando pela casa e ouviu o ranger da porta de trás. Estaria indo embora?

Sentiu a garganta secar de medo ao pensar no outro homem, que rejeitara seu amor.

Ouviu os passos de Brad subindo as escadas e mergulhou na cama, puxando as cobertas até o pescoço. Ele entrou no banheiro e abriu o chuveiro. Samantha decidiu que, se queria seduzi-lo, deveria tirar aquele robe velho. Arrancou-o freneticamente e enfiou-o embaixo da cama.

Ele surgiu à porta. Os raios de luar que penetravam pela janela ressaltavam-lhe o corpo musculoso, fazendo com que um calor brotasse dentro dela.

— Venha para a cama, Brad Remington — sussurrou, com firmeza.

— Sim, madame — murmurou ele, aproximando-se e entrando embaixo dos lençóis.

— Você cheira bem — arriscou ela depois de um instante sem que ele se mexesse.

Brad a encarou no escuro, virando o rosto sobre o travesseiro rendado.

— Você também. Amanhã vou consertar o vazamento da pia do banheiro e arranjar um sabonete que não cheire a jasmim.

Ele estava fazendo planos, expondo-lhe as alternativas para que ela aceitasse ou recusasse.

— Faça isso. — Assim que pronunciou as palavras, Samantha soube que o queria em sua casa. — Norm com certeza irá notar. Ele diz que seu olfato é muito bom e...

Parou de respirar ao sentir a mão gigante e áspera de Brad passar de leve em sua coxa.

— O que você está usando por baixo do lençol? — perguntou ela, em desespero, chocando-se ao perceber que falara alto seus pensamentos mais íntimos.

— Estou nu como um passarinho — disse ele, em tom arrastado e divertido. — Aqui estou, com meu cheiro de jasmim, esperando que você me ataque.

Ela respirou pesado.

— O que acharia disso? De uma mulher tomar a iniciativa? — perguntou, com cautela, lembrando-se das censuras de Jack às mulheres ousadas.

Brad deu uma gargalhada.

— Eu adoraria! E tentaria estar à altura da ocasião! Samantha olhou rápido para o lençol cobrindo o corpo másculo e perguntou-se por onde começar...

— Beijos sempre vêm bem — sugeriu Brad, em tom sério. — Eu me barbeei com o seu depilador, para que pudesse me beijar sem se arranhar.

Roçou os lábios nos dele, experimentando-os, depois recuou para fitá-lo e indagou-se como é que aquilo tudo estava acontecendo.

— Vamos esclarecer uma coisa, Samantha Jane. Não sou o seu ex-marido. Nunca irei rejeitá-la nem abandoná-la quando precisar de mim. Vou atender aos seus desejos da melhor maneira possível.

As palavras soavam como uma promessa, tocando o coração de Samantha tão fundo que chegavam a lhe doer.

Beijou-o de novo e, antes que ele mudasse de idéia, agarrou-se a ele com braços e pernas e encheu-o de beijos rápidos e famintos. Brad retirou o lençol que os separava e a puxou para cima de seu corpo, acariciando-lhe as costas e o traseiro, puxando-a intimamente contra si. Deu um gemido cortante.

— Samantha... — sussurrou em voz rasgada, respondendo-lhe aos beijos febris com lábios quentes e selvagens.

— Tem certeza de que não vai derreter, Brad? — perguntou, trêmula, junto ao pescoço dele, o qual enchia de mordidas.

— Deus Todo Poderoso — arquejou ele. — Vou lutar para sobreviver!

Samantha riu e roçou o corpo no dele, descobrindo o que queria, segurando-o e aninhando-o entre suas coxas. A fina camada de seda que os separava fez com que Brad gemesse e passasse os dedos pelo elástico da calcinha, torturando-a em meio aos beijos. ,

— Vou tirar isso — sussurrou ela, montando em cima dele à luz do luar, e tirou a camisola. A paixão louca e ousada que ela jamais expressara brotou de um segundo para o outro.

Brad admirou-a, erguendo as mãos para cobrir-lhe o volume pálido dos seios, para massageá-los e acariciá-los. Baixou-os lentamente até sua boca, beijando-os e sugando-os.

— Espero que seja um homem forte, Brad Remington. Brad apanhou o pacotinho que deixara à cabeceira e Samantha corou ao compreender que ele estava se preparando para ela, para o ato apaixonado que jamais compartilhara com outro homem. Assistiu, fascinada, ao tremor das mãos dele, que não conseguiram, da primeira vez, realizar a tarefa íntima. Aquilo a enterneceu.

— Estou um pouco nervoso — explicou Brad. — Quero que tudo saia perfeito esta noite.

Brad se deitou ali, entre as coxas palpitantes de Samantha, como um homem que precisava ser saboreado, ser amado até que todas as sombras de sua vida se dissipassem. Suas mãos grandes e ásperas acariciaram-lhe as coxas de modo suave, trêmulo e intenso. Ela jamais tivera a permissão de explorar o corpo de um homem.

Na verdade, haviam-lhe ensinado a envergonhar-se de seus desejos mais intensos... E agora, o olhar ávido e abrasante de Brad a incitava.

Alisou-lhe os pêlos do tórax, descansou a palma sobre o coração dele e permitiu-se explorá-lo.

Queria ser parte dele. Acoplar-se a ele, penetrar naquele mundo maravilhoso do amor...

— Temos todo o tempo do mundo, querida — murmurou Brad, tirando-lhe as calcinhas com facilidade e ajudando-a a colocá-lo dentro de si.

Ela não imaginava que seria levada tão avassaladoramente pela paixão. Começou a mover-se freneticamente sobre Brad, livrando-se do passado com um fervor que aumentava ao ritmo dos rangidos da cama...

A cama foi ao chão enquanto ela se arremessava contra ele, sem querer deixá-lo ainda. Ele gemeu e a acariciou, e Samantha ouviu um som familiar vindo de fora de seu mundo de calor e glória...

— A campainha está tocando... — sussurrou contra o ouvido quente de Brad, cerrando as mãos sobre as dele, que lhe cobriam os seios. O corpo trêmulo ficou subitamente rígido, encobrindo o corpo másculo arqueado.

— Campainha? Não, querida. Sou eu. Estávamos chegando bem no estágio da campainha...

Ela ergueu a cabeça, ouvindo a campainha tocar de novo, e Brad gemeu, estremeceu e arqueou-se, com a expressão de um homem no limite de seus esforços.

Ficou ali deitado na cama arriada, entre os lençóis, enquanto Samantha se levantava e puxava o robe de debaixo da cama.

— Deixe tocar, Samantha — ordenou Brad em desespero, e gemeu de novo.

Ela corou ao vê-lo sob os raios do luar.

Era culpada por desejá-lo tanto, até o fundo de suas entranhas. Fora apanhada satisfazendo os seus desejos com ele e... Agarrou o robe com firmeza e saiu correndo. Lá embaixo, olhou para o relógio da lareira e ficou surpresa ao descobrir que eram só dez horas da noite.

Começou a tremer. Brincara com Brad durante uma hora, testando, explorando, deliciando-se...

Com cautela, abriu a porta.

— Sim?

Quatro mulheres altas, com iscas artificiais reluzindo nos chapéus, surgiram à sua frente, muito bem vestidas e com um jeito de turistas.

— Você deve ser Samantha — disse uma, e todas as outras lhe sorriram. — Você é igualzinha à isca de Brad. Toda rosada e sensual... Ela não é um amor, maninhas?

Samantha pigarreou.

— Hã... vocês conhecem Brad?

Fora pega em flagrante; a prova estava lá em cima, em sua cama arriada, morrendo de vontade de estrangular quem quer que houvesse tocado a campainha.

— Ele é nosso irmãozinho mais novo! Vimos o seu trailer quando fomos pescar naquele lindo rio. Pegamos um monte de peixes, todas nós — disse a mais velha, de cabelos grisalhos, com sotaque da Geórgia.

Espiou, esperançosa, por sobre o ombro de Samantha. Hã... Será que nosso querido irmãozinho está por aíí? — Então seus olhos brilharam. — Ah, lá está ele, nosso querido e amado irmão!

- Boa noite, Pearl — disse Brad, colocando a mão na cintura de Samantha e acariciando a chenille desbotada com os dedos, com expressão desolada. — Boa noite, Ruby Mae... Jade... Dora Belle.

As irmãs fitaram o tórax nu, o jeans desabotoado e os pés descalços. Olhos expressivos semelhantes aos dele o vasculharam devagar; os ossos da face salientes como os de Lúcia e Brad eram compartilhados por todas as irmãs.

— Vocês chegaram com uma noite de antecedência e não são bem-vindas — anunciou ele, começando a fechar a porta.

Samantha o deteve, apesar de sua resistência e do olhar fulminante que lhe lançou.

— Prazer em conhecê-las! — falou, convidando-as a entrar.

— Você não tem um quintal onde possamos limpar os peixes que pegamos, tem? — perguntou Ruby Mae em tom polido.

— Nada disso! — respondeu Brad de pronto, furioso com todos aqueles sorrisos afetuosos. — A uns cinqüenta quilômetros, nessa mesma estrada, tem um hotel. Usem-no. Então sintam-se em casa e façam tortas de batata doce. Podem me mandar uma pelo correio.

As irmãs não ficaram nem um pouco intimidadas. Todas o abraçavam, beijavam e lhe puxavam as bochechas. Brad agüentava tudo fazendo uma cara de gótico mimado tão perfeita que Samantha teve de rir.

— Vocês ficam comigo. Tenho quatro quartos — falou, vendo Pearl começar a cheirar a bochecha de Brad, que recuou, preocupado.

—Meu querido Brad Sebastian... Desde quando começou a usar colônia de jasmim? — perguntou Pearl. — Isso é coisa que um homem faça? Será uma nova moda masculina?

Samantha olhou para ele e apertou os lábios, contendo o riso.

— Querido Brad Sebastian?!

— Samantha... — começou Brad, em seu tom mais ameaçador.

— Vamos lá, Brad. Leve-as para o quintal, para limparem os peixes — ordenou, tentando não rir de sua cara de ofendido.

__Os peixes estão na traseira da caminhonete, querido __falou Dora Belle. — Poderia pegar para nós?

— Ele é tão querido! Sempre foi — murmurou Ruby Mae vendo-o ir em direção, à caminhonete.

— Até aquela vaca estragar a vida dele roubando o bebê e obrigando-o a andar pelo mundo todo — acrescentou Dora Belle.

Ruby Mae olhou para Samantha, preocupada.

—Você está sabendo da história? Oh, manas, talvez a gente tenha entornado o caldo, revelando os segredos de nosso maninho...

— Sei sobre Lúcia — murmurou Samantha. — Mas ninguém mais sabe. Ainda não chegou o momento certo.

— Aquela cachorra a levou embora... — iniciou Dora Belle, com tristeza, e Samantha viu a fúria primitiva que aquela família podia cultivar no fundo de seus corações amorosos. Especialmente quando um membro do clã era atingido.

— Isso já passou, Dora Belle. Os dias de andarilho terminaram. Agora ele encontrou a menina e mais alguém, pelo que vejo — acrescentou Pearl. — Ela é um amor.

Todas olharam para Samantha.

—E perfeita — falou Ruby Mae, beijando o rosto corado de Samantha. — Agora já sei como Brad inventou sua melhor isca. A "Samantha" é exatamente como você. Doce, feminina... Puxa, e ela cheira como os jasmins lá da Geórgia! Aceitamos de bom grado a sua oferta para passarmos a noite — declarou Pearl. — Ah, pode nos mostrar onde fica o toalete?

Samantha conduziu-as ao andar de cima até o banheiro maior. As irmãs elogiaram o conforto e aconchego da casa. De repente, Samantha percebeu que haviam ficado caladas. Estancou, segurando a pilha de toalhas que acabara de tirar do closet, e viu todas as quatro paradas à porta de seu quarto.

As provas estavam espalhadas por todo o quarto. Desde a camisola jogada sobre a cômoda aos lençóis e cobertores largados para todo o lado. A cama arriada e a embalagem de papel laminado que, sob os raios do luar, espalhava arco-íris pelo quarto escuro.

— Nossa! — exclamou Pearl.

— Cruzes! — ecoou Dora Belle, levando a mão ao peito.

— Pela Santa Virgem! — murmurou Ruby Mae. Então todas se viraram para encará-la.

— Brad entregou seu coração a ela — disse Jade suavemente.

Só então Samantha se deu conta de que aquela irmã ainda não havia falado.

— Jade nunca fala sem necessidade. Ficou assim desde que enviuvou, muito cedo. Seu querido e falecido Henry reclamava que ela era tagarela — explicou Pearl, empurrando as irmãs para o banheiro.

Samantha se vestiu em dois segundos, fechou a porta do quarto e encontrou Brad resmungando no quintal.

— Você está destripando esses peixes com um ímpeto vingativo — observou ela.

Ele parou para fuzilá-la com os olhos e recomeçou o massacre.

Samantha começou a rir, radiante de felicidade.

Como Brad parecesse tão chateado, chegou por trás dele e o abraçou. Os lábios de Brad suavizaram-se ao falar:

— Sabe que estou com vísceras de peixe nas mãos. Se não fosse isso, eu a levava para longe desse bando de intrometidas. Amarraria o trailer no pick-up e a levaria até um bosque de pinheiros para fazer amor com você até que o nosso calor derretesse as soldas do trailer. Não estou feliz, Samantha. Estou frustrado! Ainda não consegui lhe mostrar o quanto eu a amo. Você me apressou

e agora elas estão aqui. Vai me pagar por ir abrir a porta quando lhe falei para não ir.

Samantha pensou no trailer de Brad desmoronando e sorriu para ele. Vendo-o tão aborrecido, abraçou-o mais forte. Brad gemeu, mexendo as costas contra os seios dela.

— Se me raptar no seu trailer, o que faremos com Leroy?

Em resposta, Brad bufou, querendo dizer que não estava nem um pouco preocupado com o conforto de Leroy naquele momento.

CAPÍTULO SETE

Brad Sebastian, meu querido — murmurou Pearl três dias depois lançando a linha rio acima. — Você não é velho demais para ter outro bebê. Você não pôde desfrutar a paternidade!

O braço de Brad parou em meio ao lançamento; um tique percorreu-lhe o pescoço. Andava preocupado com os enjôos misteriosos de Samantha. Pensara durante horas sobre aquilo: a possibilidade de um filho.

O medo e a alegria o atormentaram em doses iguais. Haviam feito amor rápido demais daquela única vez. Ela poderia ter concebido naquele ato de amor descontrolado...

Um bebê. Sorriu diante da idéia, encantado. Então ficou apavorado, temendo a reação de Samantha se aquilo fosse verdade.

Leroy grunhia e arrancava florzinhas. Os olhos compridos brilhavam de satisfação; estava sendo mimado pelas quatro irmãs, Samantha, Lúcia e Carina. Como um paxá com um harém, Leroy dominava a casa de Samantha e permanecia alojado lá, enquanto Brad tentava dormir no trailer estacionado no quintal.

— Vi você jogando pedras na janela da pobre moça às três da madrugada, querido — falou Dora Belle, recolhendo a linha. — Ela precisa dormir! Cuida de todo mundo na comunidade!

— Pobrezinha. Ela nunca teve filhos. Não é tarde demais para ela, também, Brad. Pense em como ela ficaria feliz se você dissesse que gostaria de formar família. De ficar aqui, onde vivem os amigos dela, e começar uma nova vida. Você está tendo progressos com Lúcia. Ela gosta de você e já o considera como um pai — acrescentou Ruby Mae.

— Se ele vai ficar na cidade, devia comprar algumas roupas decentes e cortar o cabelo — aconselhou Jade. — Pelo que vejo, acabaram-se os dias de cigano para Brad.

Taciturno, ele continuou pescando, tentando concentrar-se. Mas as quatro irmãs não o deixavam. Haviam tocado em seu ponto fraco.

— Vimos que Samantha era especial assim que você nos mandou as iscas — observou Pearl. — "Samantha" é uma verdadeira declaração de amor.

— Pobrezinha... Quando o pai dela estava aqui e fritamos os peixes, ela se sentiu mal de repente... Só de olhar para os esqueletos dos peixes, as batatas fritas e o feijão-fradinho...

— Não sei o que está acontecendo com ela — afirmou Jade.

— Puxa, ela é uma moça saudável. Se decidir ser mãe a essa altura da vida, com todos os milagres modernos, não vai ter problemas.

— O rosto dela anda meio arredondado...

Brad fuzilou-as com o olhar e elas lhe sorriram em resposta.

Todas, a não ser Jade, que continuou lançando sua linha.

— Samantha Jane está grávida — afirmou, em seu tom firme.

— Ela tem um bebê do nosso Brad na barriga e não sabe. Estou cuidando disso, Brad Sebastian, meu querido. Fazendo com que se acostume com a idéia. Tente ser romântico com ela. Pearl abriu um amplo sorriso.

— Ele não consegue pegá-la. É lerdo como uma tartaruga. Samantha é viva e ligeira. Daqueles peixes que ninguém consegue fisgar.

— Quando é que vocês vão embora? — perguntou Brad, ameaçador.

— Ora, maninho! Que maneiras são essas? — perguntou Dora Belle, batendo as pestanas com inocência.

Leroy continuava grunhindo e arrancando raízes.

Brad tentou não sair correndo direto para o Sammy's; temia perder Samantha a qualquer instante. Especialmente quando ela descobrisse que podia estar grávida dele. Se as irmãs haviam notado, outras pessoas logo perceberiam também que havia algo de diferente nela.

Agarrou a vara com força demais, sem controlar "Samantha", que ziguezagueava alegremente pelo rio, incontrolável como a mulher que a inspirara.

Ele a amava muito.

Jamais haveria lugar para outra em seu coração.

E se Samantha o odiasse? E se ele a perdesse?

O medo contraiu-lhe o tórax e o estômago.

—Não fique tão apavorado, maninho — falou Pearl. — O amor acabará vencendo!

— Gostaria de ter um bebê — disse ele, devagar, escolhendo as palavras para as irmãs pela primeira vez.

— Claro que sim! Você é um amor, e não se engane com Samantha Jane: ela sabe quando o peixe é bom, pode escrever o que digo — observou Jade. — É melhor se apressar, querido Brad. No estágio seguinte, ela vai dormir por qualquer coisa. Provavelmente é por isso que não está respondendo às pedras que você joga na janela. Deve estar apagada... poupando energias para carregar o lindo bebezinho dentro de si.

Brad abriu um sorriso imenso, com o coração palpitando.

— Olhe só para ele — falou Dora Belle. — Todo bobo...

— Nosso querido maninho — disse Pearl, com afeto.

— É melhor ele preparar o anzol — declarou Jade. — Samantha é um peixe lutador.

No fim da tarde, Lúcia lançou a linha na piscina de plástico que Samantha instalara para Carina em seu quintal. Brad passou os braços em torno da filha para lhe mostrar como manejar a linha com a esquerda e a vara com a direita.

Fechou os olhos, pensando na última vez que abraçara Lúcia, e comprimiu os lábios para não lhe dizer como ela era bonita...

— Perfeita... linda... — falou, então. — Bela lançada! Ela o encarou, radiante de felicidade.

— Acha mesmo, Brad?

Ele fez que sim com a cabeça, perdido em pensamentos. Lúcia era alta como todas as Remington e frágil como todas as mulheres sulistas que se tornam de aço quando necessário. Demonstrara várias vezes possuir o sangue dos Remington e sobrevivera a maus bocados, protegendo a pequena Carina.

Carina veio correndo em seu macacão de bolinhas azuis e abraçou a perna de Brad.

— Colo!

Brad engoliu em seco e levantou-a. Ganhou um beijo suculento e ficou todo derretido.

Seria assim, a criança que teria com Samantha? Uma trouxinha de cachos dourados com olhos que revelavam exatamente o que estava pensando... Amava profundamente Carina, essa réplica em miniatura de Lúcia, cuja vida ele jamais pudera compartilhar...

Lúcia o observou sob a luz do crepúsculo e Samantha colocou o braço em torno da cintura da jovem.

—Ele é um homem muito bom — falou, com doçura, e Brad beijou os dedinhos exploradores de Carina, escutando atentamente.

— Eu sei. Nunca conheci ninguém como ele antes — respondeu Lúcia, e seu olhar cruzou-se com o de Brad. então, tímida, desviou os olhos para as irmãs. — Uma família... Minha filha precisa de uma família como essa.

— Nós seremos a sua família — retrucou Pearl. — Carina e você podem ficar conosco, se quiserem.

Lúcia engoliu em seco e se apoiou em Samantha. Com os olhos cheios de lágrimas e lábios trêmulos, sussurrou:

— Tive uma vida dura. Talvez vocês não me queiram. Ele deveria estar lá para ajudá-la e não estava... Carina soltou um dos braços gordinhos do pescoço de Brad e estendeu-o para a mãe:

— Mamãe...

As irmãs olharam para Brad; Jade segurou o braço dele.

— Lúcia, existem segredos na vida de todo mundo — disse Brad, em tom suave. — A gente precisa juntar os pedaços e começar tudo de novo às vezes. Você conseguiu um bom lar para a sua filha... E encontrou pessoas que te amam pelo que você é.

O corpo frágil de Lúcia estremeceu e ela se virou para soluçar ao ombro de Samantha.

— Está na hora de irmos para casa — choramingou. —Vocês devem estar querendo ficar sozinhos, em família.

— Você não vai a lugar algum — falou Samantha, consolando-a e fitando Brad. — Nós amamos você e Carina e vocês são parte de nossas vidas.

Brad segurou Carina com força, cheio de dor, querendo abraçar Lúcia, confortá-la e dizer-lhe que ela era sua... Contar-lhe o quanto a amava..

— O amor não morre — ele se viu murmurando com a garganta sufocada de emoção. — O amor sobrevive, Lúcia, e fica cada vez mais forte. Dora Belle soluçou e correu para Lúcia, seguida pelas outras três irmãs, que a envolveram com braços, doçura e lágrimas.

— Você é nossa, Lúcia Maria — declarou Jade com firmeza, beijando a face úmida de Lúcia. — De agora em diante você tem uma família, para todo o sempre.

Lúcia afastou uma lágrima, pestanejando.

— Como sabe que meu segundo nome é Maria?

Jade olhou para as outras. Pearl acariciou os cachos de Lúcia.

— O nome de nossa mãe era Maria e você se parece um pouco com ela.

— Mesmo? — a voz de Lúcia vibrava de felicidade.

—Mesmo! E você se parece com os meus filhos e todos os seus primos. Então, quando o clã dos Remington reivindica você, é com todo o direito. Você é membro da família, para todo o sempre.

Brad percebeu que uma lágrima lhe escorrera dos olhos até os lábios. Provou o gosto salgado e acariciou os cabelos encaracolados de Carina.

— Vai dar tudo certo, Lúcia — falou, do fundo do coração. — Você verá. Mais tarde, as irmãs e Samantha levaram Carina para dentro da casa para lhe cantarem velhos hinos e niná-la. Lúcia sentou-se no balanço do quintal com Brad.

Sua filha estava imersa em solidão e ele a queria tanto!

— Quero que Carina tenha o que nunca tive... uma família a seu redor. Mamãe tinha um objetivo na vida: não deixar que meu pai me visse. Ela está feliz agora, viajando pelo mundo com o novo marido. Mas eu queria que Carina tivesse um lar para crescer. Quem quer que tenha me deixado a casa e a pensão... foi enviado por Deus — sussurrou Lúcia. — Elegance é meu primeiro lar. Brad respirou fundo, enfrentando o medo que o dominava.

— Já pensou que talvez o seu pai tenha procurado por você? Que talvez a amasse?

— Mamãe falou que ele batia nela. Ela não me deu um lar, me abandonou e saiu viajando com o namorado... Mas ela me amava e eu a amava, e meu pai a magoou.

Lúcia irrompeu em lágrimas novamente e Brad engoliu em seco, puxando-a, devagar, para junto de seu peito.

— O que aconteceu, aconteceu, Lúcia, e agora você tem uma família.

Ela se aninhou junto a ele e Brad a enlaçou, fitando a noite que caía. Contar-lhe que era o pai dela não resolveria. Embalou aquele corpo esguio e sofreu pelo que ela havia perdido.

E o que ele havia perdido, também.

Os minutos escoaram. Aos poucos, Lúcia se recompôs.

— Estou tão embaraçada...

Brad quis dizer-lhe que ela era sua, que a amara desde o primeiro instante em que as enfermeiras a haviam mostrado para ele. Que a mãe mentira para não ter de dividi-la... A dor o invadiu e sua garganta se fechou...

Notou que Samantha se aproximara, sentando-se a seu lado e alisando-lhe os músculos do ombro. Quando a encarou, não tentou esconder sua dor e impotência.

—Tudo vai dar certo — afirmou Samantha antes de beijá-lo.

Lúcia se remexeu, inquieta, e Brad passou um braço em torno dela e o outro em torno de Samantha.

— Vamos ficar aqui balançando e deixar minhas irmãs se divertirem com Carina e Leroy — falou. — Vocês duas podem me proteger das tramas delas.

Lúcia riu alegremente antes das duas descansarem a cabeça ao ombro de Brad, escutando os ruídos da noite e o rangido do balanço.

— Preciso pôr óleo nesse balanço! — Brad depositou um beijo no topo da cabeça de cada uma.

— Shh, Brad. Samantha está dormindo — sussurrou Lúcia.

— Estou perdendo forças — resmungou Samantha. — Meu merengue não fica mais em pé e meus ex nunca mais dançaram comigo. Eu não agüentaria se me pedissem. Talvez seja a menopausa chegando.

Os seios lhe doíam terrivelmente, o que ela atribuía a um sonho em que os dedos de Brad manipulavam as asinhas de suas iscas. Bocejou e sentiu vontade de comer o bolo de cereja de Norm com uma cobertura de pepinos em conserva. Brad ficou tenso, de repente, e ela recuou para encará-lo. Ao ver sua expressão preocupada transformar-se em horror, Samantha percebeu que expressara seu desejo em voz alta.

— Gosto de cerejas e de picles — insistiu. — Qual é o problema?

Ele a observou com preocupação.

Duas horas depois, no treino de vôlei, Samantha via Joannie Bell dar uma cortada mortal.

Ela, que deveria estar lá, liderando a equipe na vitória sobre a equipe da cidade vizinha, sentava-se, apática, no banco.

— Talvez eu esteja com falta de ferro — murmurou, dando um bocejo.

Entre dois tempos, Randy Newcomer foi até o banco falar com ela.

— Ei, Sam, qual é o problema? Não está se sentindo bem? — perguntou, colocando a mão na testa dela.

— Volte para o campo e me deixe em paz! Randy olhou para Brad.

— Ela não falava assim quando nós estávamos namorando — falou, em tom de acusação. — Está tratando bem dela?

Samantha não precisou olhar para Brad para ver a sua carranca; notou-a no tom grave e ameaçador de sua voz:

— Ela o passou adiante, não foi? Talvez eu tenha mais sorte.

Tex Wilson aproximou-se, enxugou-se com a toalha do time e ficou olhando para Samantha. Ela o passara para Maizie Walters, e agora eles estavam noivos. Tex, enfermeiro, ajoelhou-se para tomar-lhe o pulso.

— Está abatida, Samantha.

— Ela está bem — resmungou Brad, segurando a mão de Samantha.

Tex, boxeador peso-pesado, mediu Brad de cima a baixo.

— Ela é especial — declarou, encarando-o.

— Vou treinar softball na semana que vem — falou Samantha, vendo Brad cerrar os dentes e apertar-lhe o pulso com força.

Tex sacudiu a cabeça e Randy pegou a toalha suada, enxugando o tórax.

— É melhor você se cuidar — disseram os dois em uníssono.

— Você está pálida e fraca. Nada de vôlei nem de softball até melhorar — aconselhou Tex. — Está com cara de que vai vomitar na base em vez de aterrissar nela.

Brad pareceu alarmado.

— Aterrissar? Nada disso! Ela vai praticar a pesca.

É mais delicado.

Mais tarde, na casa dela, ele a empurrou para dentro do closet. Ignorou os lenços e cachecóis de uma caixa que derrubara da prateleira de cima. Começou a beijá-la daquele jeito delicado e sedutor que a deixava toda derretida. Samantha o desejava com cada fibra do corpo e da alma. Afastou os cabides e, na ponta dos pés, abraçou-o.

— Senti sua falta — murmurou ele contra a sua face quente, enquanto as mãos se insinuavam por baixo da blusa buscando-lhe os seios.

O corpo de Samantha palpitava sob suas palmas, ávido por suas carícias.

Ficou toda úmida ao lembrar-se do momento em que as irmãs de Brad haviam tocado a campainha. Ficou espantada, assustada com a própria reação, e o agarrou com firmeza.

— Não me alise como se eu fosse uma de suas iscas, Brad Remington, senão... Não somos mais crianças, Brad!

De repente, notou que não estava mais cansada e que a excitação que a invadia era por Brad.

— Vamos para o trailer — sussurrou ele, mordendo-lhe o lóbulo da orelha. — Vamos assistir à Porquinha Gostosa.

Ela riu, depois o repreendeu:

— Ei, veja como fala!

Brad a puxou contra si e insinuou a mão por dentro do jeans, acariciando-lhe o ventre.

— Gostaria de ter um filho com você. O que acha disso?

Samantha ficou imóvel.

— Quer dizer adotar crianças? Na nossa idade?

— E. Vamos nos casar imediatamente e tentar, primeiro. Meus nadadorezinhos não entraram em ação desde que Lúcia foi concebida, há tantos anos. Aliás, aquela vez no rio você me pegou antes que eu estivesse pronto.

Samantha pestanejou.

— Nadadores?

— Você sabe... biologia... os nadadores do macho e os ovos da fêmea...

— Brad Remington! — balbuciou Samantha, corando.

— Faz parte do amor — defendeu-se ele. — E até agora eu não tive uma chance de verdade, não é? Eu te amo, Samantha, e...

— Nadadores — repetiu ela, pasma. Fechou os olhos e viu um bando de peixinhos rumando para um ninho quente e...

Ele agarrou o trinco da porta, que se mexia, e segurou-a com firmeza quando a voz de Pearl chamou:

— Brad Sebastian, é você?

— Vá embora, Pearl! Estou namorando minha garota no único canto da casa que vocês me deixaram. Se vocês saíssem da cidade eu teria mais chances!

Um coro de risos femininos ressoou do lado de fora e Samantha ocultou o rosto ardente no pescoço dele.

— Isso é ridículo — resmungou enquanto ele a acariciava com a mão livre e beijava-lhe a testa.

— O que você me dá para ir até o restaurante e trazer um bolo de cereja com pepinos? — perguntou ele, com um olhar sensual, tirando uma manga de casaco do ombro. — Se fechar a porta do seu quarto esta noite, eu escalo pelas trepadeiras junto à janela e trago a sua sobremesa.

Samantha se afastou e estendeu a mão para acender a luz sobre suas cabeças. Brad estava todo encurvado e excitado, com um cachecol cor-de-rosa nos ombros.

— Não acredito que estamos aqui dentro de um closet, agindo dessa maneira. E falando de nadadores e ovos...

— Acostume-se — falou Brad com ternura, e a escoltou para fora do closet abafado. Jogou o cachecol rosa por sobre os ombros com um floreio.

As irmãs esperavam, com os olhos cheios de lágrimas.

— O maninho está pegando fogo — comentou Jade. — Parece um crocodilo, pronto a abocanhar esta pobre garota.

— Ele está uma gracinha. Não o azucrine, Jade — pediu Dora Belle.

— Vamos partir pela manhã, maninho. Mas voltaremos antes que a neve caia para saber das novidades — declarou Ruby Mae, abraçando Samantha.

— Graças a Deus! — resmungou Brad, e disse que ia dar uma volta. Alguns minutos depois, retornou e perguntou a Samantha se poderia falar com ela em particular, no quintal. Lá, presenteou-a com um bolo de cereja coberto com fatias de pepino em conserva e ganhou um beijo doce e apaixonado em agradecimento.

Se ela estivesse grávida, estaria nutrindo o bebê com seu corpo... Uma dor profunda e divinamente doce o golpeou quando pensou em Samantha abrigando o seu filho.

— Vou querer algo mais substancial assim que meu clã partir. Estou com uma fome terrível de você, meu amor — sussurrou, embalando-a até que ambos parassem de tremer.

— Meu merengue desabou! — gritou Samantha, aterrada, na manhã seguinte. Depositou uma segunda fatia de torta de amora na frente de Brad. Então começou a soluçar, ignorando os olhares curiosos dos fregueses do Sammy's.

— Cebolas — explicou, enxugando os olhos.

Brad olhou para o peito saliente de Samantha sob a camiseta e achou que talvez fosse hora dela acordar.

Samantha o assustava. Após a partida das irmãs, desatara a chorar. Sem saber como agir, ele a abraçara e ela soluçara durante cinco minutos. Então recuara e fungara.

— Não diga nada, Brad. Gostei da sua família, mesmo você sendo um cachorro miserável. Nem sei por que as suas irmãs gostam tanto de você! Você sabe que tenho andado emotiva, acho que é um tipo de crise da meia-idade... Minha casa estava cheia de vida e agora elas se foram... São só sete horas da manhã e você correu com elas daqui...

Fitara-o através das lentes manchadas de lágrimas. Endireitara-as com o dedo e franzira o cenho.

— É, isso mesmo! E você me deixa nervosa me olhando desse jeito estranho, como se tivesse que me aturar! E fica lá, tomando conta do Sammy's, fazendo os seus hambúrgueres de dois andares! Você fica arrumando tudo em todos os lugares e não sei mais o que está funcionando e o que não está... porque algumas coisas que não deviam estar funcionando estão. Não posso mais ter certeza de nada, às vezes consigo dormir e às vezes não consigo. É tudo culpa sua! — concluíra, perturbada, entrando na casa e trancando a porta atrás de si.

Brad só tivera tempo de passar a mão nos cabelos e sacudir a cabeça. Então ela abrira a porta e se jogara em seus braços. Um segundo depois, estava bocejando.

— Estou cansada...

Brad a carregara para o quarto e ela adormecera, com ele a seu lado.

Uma hora depois, despertara em alvoroço e saíra correndo para trabalhar, espantada por haver dormido até ás oito da manhã.

Sem saber como lidar com esse novo lado da mulher amada, Brad fora ao Sammy's, pedira um café e uma torta e agora estava ali, quieto, sem querer dizer ou fazer nada que a aborrecesse. A tão desejada segunda fatia de torta finalmente aparecia à sua frente.

Pensou nas suculentas amoras e indagou-se se devia parecer alegre diante de Samantha... ou se devia esperar e ver como ela estava...

A seu lado, Norm grunhiu:

— Faça alguma coisa! Samantha está aborrecida. Não sente o cheiro das cebolas?

A essa altura, Samantha estava saindo correndo do bar, com o equipamento e a vara de pescar.

— Volto à tarde — falou, distraída, ao passar por Norm e Brad a caminho do pick-up. — Meu peixe gigante está esperando por mim.

Brad olhou para a segunda fatia de torta de amora e decidiu que Samantha era mais importante.

Encontrou-a lançando alucinadamente no rio. Sentou-se numa rocha, mascando um talo de grama, e encolheu-se quando ela lançou a isca rente a seu ouvido.

Fechou os olhos, sonhando com Samantha tendo um filho seu...

Então ela virou o rosto e o fitou de um modo que o deixou todo tenso.

— Sabe, Brad... Andei pensando no que você falou sobre os nadadores. Acho que devemos testá-los. Estou sofrendo de alguma doença misteriosa, e resolvi ir às últimas conseqüências.

Brad tentou respirar, forçando o ar a ir para os pulmões enquanto ela se virava para fisgar aguapés e pinhas. Depois de horas de hesitação, pesou as palavras que iria dizer com muito cuidado. Se dissesse algo errado... Pigarreou e perguntou:

— Hã... o que quer dizer?

Então Samantha começou a chorar, lançando rápido demais e não chegando nem perto do rio. A linha arrancou um maço de flores da margem. As pétalas caíram no rio e se espalharam.

Brad se levantou e se aproximou, temendo por ela. Ela apontou a vara para ele e o deteve, fuzilando-o com os olhos.

— Você parece chocado… E apavorado! Você não me quer, eu sei disso!

CAPITULO OITO

Samantha amassou a lista de mulheres que poderiam servir para Brad. Jogou o papel amassado numa pilha de outros iguais e puxou o lençol para enxugar as lágrimas.

Pensar em Brad dando a uma isca o nome de outra mulher era demais para ela. Cruzou os braços sobre os seios doloridos.

Não conseguia se concentrar no par ideal para Tracy Simmons, viúva há sete anos. As pessoas contavam com ela para arranjar os casamentos... Mas só conseguia pensar em Brad!

— Bem, com certeza ele passou nos testes como par romântico. Vou dizer isso ao sr. Iscas. Aqui estou, com trinta e oito anos de idade e, provavelmente, grávida dele. Vou dizer que ele aprendeu a lição, tudo bem, e que os nadadorezinhos dele são muito hábeis — resmungou, riscando o nome de Donna Wheeler depois de rabiscá-lo num novo pedaço de papel. — Ela é boazinha demais para ele.

Fechou os olhos e viu Brad sentado na rocha, todo pensativo e misterioso. O vento agitara-lhe os cabelos espessos e ela morrera de vontade de agarrá-los e puxar os lábios dele até seus seios.

Morria de vontade de ouvi-lo dizer que a amava naquele leve sotaque sulista.

— Escolheu uma bela hora para se excitar, Samantha Jane -- repreendeu-se. — Devia ter parado de pensar em Brad antes de suas irmãs chegarem e o interromperem. Nunca mais vai conseguir chegar tão perto dele. Você o deixou apavorado!

Sentindo pequenas contrações, deu um gemido longo e vagaroso.

— Não vou obrigá-lo a ficar aqui ou a se casar comigo — murmurou, fungando. — Ele está se escondendo há três dias, só o vejo no bar. Não vou correr atrás dele.

Estudou as formas de seu corpo. Olhou para o teste de gravidez sobre a cômoda e sentiu um frágil sorriso despontar-lhe nos lábios.

— Nadadores — repetiu, pensando em como Brad se entregara a ela daquela primeira vez. Belo, primitivo, forte... tudo o que um homem precisa ser quando está fazendo um bebê...

Procurara a outra filha pelo mundo todo. Um homem como Brad, determinado, reclamaria seus filhos e honraria suas obrigações.

Samantha enxugou as lágrimas.

Levou as mãos ao ventre, pensando no bebê.

— Escolheu uma bela hora, Samantha. Imagine sair da cidade às ocultas, correr cem quilômetros para arranjar um teste de gravidez. O Sr. Wilkins, da farmácia, teria contado à cidade toda se eu o comprasse em Elegance...

Por que o que sentia por Brad era diferente do que sentira por todos os outros homens de sua vida?

Por que não conseguia simplesmente dar-lhe uma batidinha no traseiro, como fazia com os outros rapazes nos jogos de vôlei?

Eu te quero... Eu te amo...

Seus ex nunca lhe haviam dado um buquê de rosas.

Nenhum deles tinha como melhor amigo um porco.

Nunca lhe haviam falado em nadadores, nem sussurrado sobre delícias sexuais em seus ouvidos.

Nenhum deles a passara o braço em torno de sua cintura com aquele jeito possessivo. l

Seus ex sabiam dançar rápido ao som da vitrola, mas Brad se movia devagar e com firmeza...

Descansou a coxa sobre o travesseiro, sentindo falta da coxa rígida e áspera de Brad. Sentia um forte desejo sexual, uma vontade louca de sair voando pela janela, encontrar Brad e atacá-lo.

Fechou os olhos e esmagou o travesseiro com todas as suas forças. Iria fazê-lo pagar por torturá-la naquele closet com as irmãs dentro de casa... Iria fazê-lo pagar por todos aqueles "eu te amo".

Lembrou-se dele no armário escuro.

Vamos nos casar..

Estremeceu. Já fora casada, e não fora nenhum piquenique.

Junto ao rio, usando as botas de Brad, Lúcia se voltou para ele, sentado sobre uma toalha com Carina e Leroy, e sorriu.

— Olhe só! Posso alcançar aquela onda lá longe!

— Quero só ver!

— Duvida? — Ela o provocava, cheia de alegria. — Ontem cheguei ao limite de trutas que a lei autoriza pescar num dia. Tenho praticado! Suas irmãs... minhas novas tias... me ensinaram.

Brad reclinou a cabeça para que Carina colocasse uma flor em seu ouvido. Leroy se espreguiçou e sorriu para Brad, sabendo que havia sido convidado a passar a noite na casa de Lúcia e que Brad teria de assistir sozinho à Porquinha Gostosa no trailer.

Samantha lhe enviava sinais de "me deixe em paz" e Brad decidira ficar a distância até encontrar um plano infalível.

Carina bocejou, procurou o cobertorzinho e deitou-se no colo de Brad.

- Nunca me senti tão bem — dizia Lúcia, lançando a linha. — Livre, entende? Como se eu estivesse em casa, com minha família ao redor... Sei que é ridículo, mas é como me sinto.

— A sua família está ao seu redor — replicou Brad, observando-a.

— E como me sinto. Algum dia vou descobrir quem foi que me deixou aquele dinheiro e agradecer-lhe até perder o fôlego e ficar de garganta seca. Viver aqui, trabalhar para Samantha, ser amiga dela... ou mais do que amiga... Ela ficou comigo na minha casa quando cheguei... Eu estava tão assustada... Só tinha uma mala, não sabia como montar uma casa... Ela fez as pessoas me ajudarem...

Brad engoliu em seco. Samantha poderia estar abrigando outro filho seu no corpo e ele ainda não resolvera seus problemas com a primeira filha.

O sol de fim de julho brilhava nas folhas dos salgueiros quando um novo inseto ziguezagueou nas águas límpidas do rio. Brad manteve Carina junto a si para dar-lhe forças e falou:

— Lúcia, quero conversar com você.

— Tudo bem, meu braço está entregando os pontos, de qualquer jeito! — respondeu ela, sorrindo.

Descalçou as botas com um ar tão saudável e feliz que o coração de Brad se contraiu.

— Sente-se. Empurre Leroy um pouco para o lado. Como um velho amigo, Leroy grunhiu em assentimento e recolheu-se num canto da toalha. Lúcia se espichou sobre a toalha.

— Um belo dia! — murmurou.

Brad fitou o seu leve bronzeado, lembrando-se dos olhos assustados e da pele sem cor de quando a reencontrara.

- Você ama Samantha, não é? — perguntou ela, e sorriu. — Ela passou essa semana toda com cara de poucos amigos e você... bem, você anda com uma cara assim de filme de horror, castelos mal assombrados, pântanos...

- Quer saber de uma coisa? Andei observando Samantha e aprendi algumas coisas sobre casamentos. Ela é especialista nisso, você sabe. Aprendi com ela e acho que vocês dois formam um belo par.

— Lúcia, Samantha e eu estamos atravessando uma fase difícil. Mas o que eu queria falar com você é sobre... você e eu...

A expressão de Lúcia se congelou.

— O quê?

— Se você considera minhas irmãs como suas tias, então pode pensar em mim como seu pai. O que acha?

Ela sorriu de imediato, com os olhos irradiando alegria.

— Está brincando? Mesmo? Nossa, Brad, você é tão bom! Nunca chamei ninguém de pai antes. E sério?

— Eu gostaria muito, Lúcia. — Brad respirou fundo antes de continuar. — Porque... entende... a verdade é que eu sou seu pai e avô de Carina. Você é Lúcia Maria Remington, nascida no Hospital Little Sweet às três e meia da madrugada. Você tem uma marca triangular de nascença na nádega direita.

— Não é possível — respondeu ela sem pestanejar, analisando-o com cuidado. Então arregalou os olhos. — Não é possível! — repetiu, arrancando-lhe Carina, adormecida, dos braços.

O gesto protetor, defendendo a filha contra ele, o atingiu. Brad cerrou os olhos, tentando conter a dor.

— Nunca machuquei sua mãe, Lúcia. Sempre que a toquei, foi como um homem apaixonado. Eu a amava.

Lúcia segurou Carina com força e a criança adormecida protestou de leve.

- Mamãe disse que você a machucava. Que tinha medo que você nos encontrasse e...

Brad respirou fundo e rezou para que ela acreditasse nele. Que soubesse da verdade olhando no fundo dos seus olhos e cedesse ao calor afetuoso que se criara entre eles.

— Sua mãe temia que minha família levasse você embora. Jurou que você jamais me veria de novo e que nem ia querer me ver. Mudou o nome de vocês para Smith, porque procurar um Smith na Europa e nos Estados Unidos é como procurar uma agulha no palheiro.

— Mas você nos encontrou.

— Não foi fácil. — Ele fez uma pausa e alisou-lhe o pé com o dedão. — O que está pensando, Lúcia?

Lúcia desviou os olhos para uma grande folha dourada apanhada pelas águas revoltas. Afastou o pé do dele.

— Acho que você planejou isso. Acho que, de algum modo, nos encontrou, a mim e a Carina, e que deu um jeito de ficarmos aqui em Elegance.

— Onde vocês estariam seguras — acrescentou Brad com suavidade, ardendo de vontade de tomá-la nos braços.

— Seguras — repetiu ela mecanicamente, vendo a folha afundar nas águas.

Brad retirou um papel dobrado da carteira e o abriu.

— É uma cópia da sua certidão de nascimento, Lúcia. Segui você por toda a Europa, Canadá e por todos os Estados Unidos. Eu estava sempre um passo atrás, o tempo todo...

Lúcia pegou o papel e passou os olhos por ele de relance.

— E daí?

— Pense nisso — sugeriu Brad devagar, com o coração batendo forte no peito ao ver Lúcia se levantar e levar Carina para o seu pick-up.

Ao estacionarem na frente da casinha que comprara para ela, Lúcia falou de novo, tensa:

— Obrigada pelo passeio.

Obrigada... mas não pelos anos perdidos... Brad forçou-se a dar partida no motor e afastar-se da casa.

Ela passou a vida fugindo... Fugiria agora? Acreditaria nele?

E havia Samantha, que talvez carregasse um bebê seu. Será que ela iria querer uma criança agora? Iria querer mudar sua vida? O medo de não criar outra criança sua o percorreu.

Outro medo, ainda mais sombrio, o de perder Samantha, fez seu coração gelar. Cerrou os dedos sobre o volante e depois relaxou-os; ouviu a batida de seu coração e soube que precisava de Samantha para viver.

Um gosto amargo veio-lhe à boca. Errara em lhe propor casamento tão cedo. Deixara-a terrivelmente assustada.

Fitou, às cegas, o asfalto sob seus faróis. Viu o rosto pálido e vulnerável de Samantha quando lhe perguntara sobre ter um bebê...

Eu te amo. Ter um bebê com você seria...

Poderia ter dado vazão a seu amor por Samantha, ter-lhe dito como ela o fizera feliz, qualquer coisa. Mas não o fizera.

Quase virou o pick-up para o lado da estrada e esmagou seus temores contra as rochas.

Samantha olhou para as largas costas de Brad quando este se sentou ao balcão. Encheu de limão o prato de trutas de Sam Payton. Com seu olhar de cachorrinho abandonado, Brad era quase irresistível... Quase.

Morria de vontade de recostar-se nele e de ouvir aquele sotaque arrastado do sul.

Seu corpo estremeceu e enrijeceu-se.

Eu te quero... Eu te amo...

A vontade de deitá-lo sobre o balcão e possuí-lo ali mesmo a espantou.

Trinta e oito anos era uma boa idade para descobrir que possuía uma elevada carga de sensualidade... E que amava um homem que temia submeter seus nadadores a um teste...

Lúcia chegou, com um ar tristonho, e lançou um olhar a Brad que deixou Samantha gelada.

Samantha serviu as trutas, um copo extra de água gelada e, nesse ínterim, estudou as expressões de Brad e Lúcia.

Depois de ignorar Brad por uma semana, a primeira semana de agosto parecia uma boa época para desanuviar o ambiente. Ao menos entre Brad e sua filha. Sentia a pele toda tensa e todas as partes do corpo gritando "Brad... Brad... queremos Brad...".

Pegou uma fatia de torta de amora e depositou-a no prato à frente de Brad, que acabara de devorar o primeiro pedaço.

Brad a fitou com olhos sombrios.

— Contou a Lúcia, não foi? Você parece um cadáver ambulante — disse ela com frieza, embora seu coração sangrasse de dor.

Ao vê-lo confirmar tudo com um gesto de cabeça, Samantha respirou fundo.

— Não terminou bem, não é?

— Vamos nos acertar — disse Brad, com cuidado. Olhou para a segunda fatia de torta, depois para ela. — Como está se sentindo?

Ela notou a preocupação e o medo que lhe passaram pelos olhos e o fuzilou com o olhar. O pai de seu bebê, com medo de compromissos, quando precisava encará-los... Falar de nadadores tudo bem, mas agora que eles haviam feito o seu trabalho, Brad mudava de idéia... Bem, ele não tinha se comprometido com nada, tinha? Ela vinha de um casamento fracassado, então o Sr. Iscas estava a salvo de suas garras. Se fosse abençoada e uma criança crescesse dentro de si, iria amá-la o por dois, protegê-la, nutri-la e...

Apesar de tudo, queria que ele fosse feliz e que sua jornada à procura de Lúcia terminasse bem.

— O que quer dizer com acertar? — perguntou, em tom severo. — Venha jantar comigo esta noite. Vamos dar um jeito nisso. Traga Lúcia, Carina e...

E ngoliu em seco, tentando não pensar no preparo do jantar e no modo como os cheiros lhe perturbavam o estômago. Olhou para o prato de ovos fritos que Norm acabara de preparar.

— Vou pensar em alguma coisa para cozinhar. Norm pode fazer algo para eu levar.

— Eu cozinho. — Brad passou os dedos em torno do pulso dela, acariciando a pele sensível com o polegar. — Não podemos sair daqui e acertarmos as coisas entre nós?

Ele se reclinou para beijá-la de um modo mais doce do que a torta de amoras.

Quando ela abriu os olhos, voltando à realidade, Brad estava à sua frente, cheirando tão bem, tão bonito...

— Quer dançar? — perguntou, em voz rouca, vendo um dos ex colocar uma moeda na máquina.

—Você é rápido — murmurou Samantha alguns segundos depois, quando Brad colocou os braços dela em torno de seus ombros e a puxou para perto. Notou que ele lhe tirara os óculos e largara-os no balcão. Dobrou-a suavemente contra si como se quisesse trazê-la para perto do coração e deixá-la ali.

— Eu te amo, Samantha Jane. Vamos superar tudo isso — murmurou-lhe ao ouvido.

Quando as lágrimas dela começaram a rolar, Brad aninhou-lhe o rosto na curva de seu pescoço.

— Fique quieta, Samantha. Você está onde devia estar — sussurrou, alisando-lhe as costas.

— Oh, pobrezinho... Ele ficou tenso.

— Não quero a sua pena — falou, com tristeza.

Ela estremeceu de novo quando uma corrente que não tinha nada a ver com pena passou entre eles. Brad a encarou como se no instante seguinte fosse pegá-la no colo e levá-la embora.

Baixou os olhos para o peito dela e seu olhar ficou ainda mais intenso; um rubor subiu-lhe à face.

— É mais do que desejo — falou, perturbado. O maxilar se moveu como se estivesse determinado a falar o que precisava falar. — E um amor para a vida toda.

- Eu... — Samantha pigarreou. — Acho melhor fazer alguns anéis de cebola frita — falou, um tanto alto demais, e foi até o balcão pegar os óculos.

— Tenha piedade de nós! — responderam os fregueses em coro.

— Pai — disse Lúcia com frieza, estendendo o prato de fettuccine para Brad. A moça ergueu os olhos para Samantha. — Somos parecidos, não somos? — perguntou-lhe, no mesmo tom frio e direto.

Lúcia passou a salada para Samantha.

— Carina parece comigo e eu pareço com minhas novas tias e meu novo pai, não é isso... Pai? — falou, em tom amargo.

— Tá-tá — falou Carina, radiante, sorrindo para Brad com seus dentinhos brilhantes e perfeitos.

Lúcia olhou para a filha e estremeceu. Lágrimas lhe vieram aos olhos.

— É demais — murmurou, de lábios trêmulos. Samantha lançou um olhar de "deixe que eu cuido disso" a Brad, que, tardiamente, compreendeu que sua expressão devia estar revelando sua sensação de impotência.

Samantha colocou a mão no ombro de Lúcia.

— Ele te ama. Olhe para ele. Está sangrando por dentro, querendo o teu afeto.

Brad respirou fundo.

— Deixe que eu fale com ela, Samantha.

— Não, você não — respondeu ela. — Você fica com essa cara de morto, como se estivesse esperando que alguém o chutasse.

Brad passou a mão no cabelo e olhou do rosto jovem e tenso de Lúcia para o rosto preocupado de Samantha. Enfrentar duas mulheres em duas questões diferentes ao mesmo tempo não era nada fácil. Não queria a pena de Samantha.

— Não preciso da sua proteção, Samantha! Não sou um dos seus amiguinhos.

Sem se abalar com aquele tom ameaçador, Samantha devolveu-lhe o olhar fulminante.

— Não coloque os meus ex na questão. Eu não ia querer namorar com você nem que me implorasse. Pode ter certeza, nunca vai estar no mesmo nível deles — concluiu, irritada.

— Ora, vivas! — Brad jogou o guardanapo sobre a mesa. — Bem que eu queria colocar as mãos num daqueles caras, agora mesmo. Ia aliviar a minha frustração!

— Não ouse tocar em nenhum deles, Brad Sebastian Remington — ordenou-lhe. — Eles são uns amores e...

— E eu não sou? — perguntou ele. — Querida Samantha, passei nas minhas lições românticas e é melhor você se cuidar, porque eu não sou como aquele patife com quem você se casou da primeira vez.

Ela arregalou os olhos.

— Oh! Oh!

Lúcia enxugou os olhos com o guardanapo de pano, então lançou um olhar inquisitivo a Brad. Ele desviou os olhos de Samantha e se preparou para o que quer que a filha fosse lhe dizer.

— Não sou ninguém de quem possa se orgulhar... Pelo que as suas irmãs... minhas tias... disseram, a família Remington deve ser da alta, não? Gente fina? Bom, eu não sou. Não sei nem mesmo ler! Não é um horror? Quando Carina me estende um livro infantil, eu não leio... invento. Não sei de que importa agora se sou a sua filha.

Brad sentiu o coração se contrair.

— Importa, querida. Você é parte de mim, meu sangue, a minha menininha. Importa muito!

— Lúcia, existem classes de alfabetização de adultos e... — iniciou Samantha, parando ao ver que Brad e a filha estavam encerrados numa arena particular, cheia de ódio e tristeza.

— Eu sempre quis você, a cada minuto — disse Brad com voz embargada, morrendo de vontade de abraçá-la. —Você é parte de mim, a melhor parte. A parte que continuará para sempre, e eu vou me orgulhar em saber disso.

— Claro, claro. Tudo bem. Então por que não estava comigo? — gritou Lúcia para ele, com a face branca e o corpo trêmulo. — Sabe o medo que eu senti quando estava vindo para cá com Carina no ônibus? Eu nunca tinha vivido numa casa de verdade, só em apartamentos. Há ruídos nas casas, à noite, sabia disso? — perguntou, toda trêmula, com lágrimas rolando-lhe nas faces. — Por que não estava comigo?

Brad engoliu em seco, empalidecendo.

— Eu estava naquele ônibus de Chicago — admitiu, devagar. — Sabia que você tinha medo de avião. Vi você encontrar a casa e entrar. Soube que estaria a salvo, então.

Os olhos dela se arregalaram. Levantou-se e pegou Carina da cadeirinha alta. Carina, sentindo as emoções que a cercavam, fez cara de medo.

— Mama?

— Quer dizer que você armou esse enredo de capa e espada, me seguiu por todo o país e não teve a coragem de se apresentar? Quando nos encontrou?

Brad sabia que sua agonia se revelava em sua expressão. Lúcia agarrou Carina com mais força e o lábio inferior da criança começou se revirar. Samantha segurou-lhe o braço gordinho e deu-lhe um beijo na bochecha. Brad hesitou; não queria contar a Lúcia que a vira na pior das situações...

Samantha falou com suavidade:

— Lúcia, ele a encontrou e deu um jeito de você e o bebê ficarem seguros.

Ele agradeceu em silêncio a intervenção de Samantha.

— Seguros! — Lúcia quase cuspiu a palavra, com o rosto inundado de lágrimas. Vestiu o casaquinho em Carina às pressas. — Quero ir para casa. Samantha, você me trouxe. Pode me levar de volta agora.

Brad se levantou devagar, como se carregasse um peso enorme nos ombros.

— Samantha teve um dia duro, Lúcia. Eu levo você. Lúcia estudou o rosto de Samantha, depois enfrentou o olhar sombrio de Brad. Ele franziu o cenho e empurrou-a de leve para a cadeira.

— Fique.

Olhou para Lúcia, com expressão concentrada. Percebeu que estava segurando o ombro de Samantha e forçou-se a soltá-lo. Aquela batalha era sua e teria de lutá-la sozinho.

— Eu sabia o que você pensava de mim. Descobri através das pessoas que conheciam você e sua mãe. Eu nunca bati nela... e achava que você não ia me receber bem. Decidi ir devagar... Sabia também que você era minha filha e que havia se transformado numa mulher bonita e adorável, apesar de levar uma vida dura. Sabia que você protegeria Carina. Estou lhe pedindo que me perdoe...

— Perdoar? — Lúcia explodiu. — A vida toda pensando... Tem alguma idéia do medo que eu sentia quando era criança... sozinha dias e dias nos apartamentos enquanto mamãe viajava... "

Brad ficou como se ela o houvesse esbofeteado. Engoliu em seco, com os lábios comprimidos.

— Você está cansada. Eu a levo para casa.

Leroy chegou junto à perna de Brad. Reclinou-se afetuosamente contra o dono, olhando para Lúcia com olhos compridos e iniciando uma série de grunhidos simpáticos. Apesar da raiva, Lúcia olhou para baixo. Com as lágrimas escorrendo-lhe do rosto, perguntou:

— Que tipo de pai tem como animal de estimação um porco?

Samantha aproximou-se para passar o braço em torno da cintura de Lúcia, que segurou-lhe a mão por um instante e depois se afastou.

— Porco! — exclamou Carina, feliz, sentindo a tensão diminuir. — Quero porco!

Quase se atirou dos braços da mãe, e Lúcia teve de baixá-la. Carina sentou-se ao chão e abraçou o pescoço de Leroy.

— Porquinho lindo — cantarolou. Lúcia se remexeu, inquieta.

— Acho que vamos levar Leroy conosco, como planejamos — falou, hesitante. Então se voltou para Brad:

— Pode nos levar para casa, mas não quero conversar... Não fale nada de mau da minha mãe — ordenou, tensa.

— Tudo bem -— prometeu ele. — Não digo nada.

Brad sentou-se na varanda de Samantha, deixando a noite solitária envolvê-lo. Lúcia, tensa, saíra rápido do pick-up e entrara em sua casa.

Brad fitou as estrelas e pensou em quantos quilômetros, em quantos países e em quantas noites se sentara sozinho desejando que a filha estivesse a seu lado...

Se fugisse agora... Afastou aquele medo torturante e respirou fundo. Captou o aroma de cebolas fritas e sorriu.

— Bela noite, não é, Samantha?

Ajudou-a a sentar-se a seu lado nos degraus e a enlaçou.

— Andou fritando anéis de cebola? Samantha fungou.

— Só alguns. Estão quentes. Quer um pouco? Brad já comera anéis fritos para a vida toda.

— Agora não.

Afagou-lhe os cabelos e deixou que o seu calor lhe acalmasse o coração aflito.

— Você é uma mulher de bom coração, Samantha Jane. Está preocupada com Lúcia, Carina e eu, não está?

Ela reclinou a cabeça sobre o ombro dele.

— Alguém precisa se preocupar. Pobre Lúcia... sozinha naqueles apartamentos, uma criança assustada...

Ouvindo-a fungar de novo, Brad fitou-lhe os olhos lacrimejantes.

— E quem se preocupa com você?

Pegou-a no colo e ajeitou o robe surrado de chenille em suas pernas para protegê-la do frio da noite.

— Saiu aqui para me seduzir?

— Bah! — respondeu ela, colocando a mão sobre a mão de Brad, que lhe acariciava o ventre.

Brad deixou que a ternura e o afeto que sentia por aquela mulher especial o dominasse. Afagou-lhe as faces úmidas.

— Veio me dizer que me ama e que não pode viver sem mim? Que se não puder me ter, vai fritar anéis de cebola da madrugada ao crepúsculo todos os dias pelo resto da vida?

— Bah! — repetiu ela, no mesmo tom de desprezo. — Eu já usava a terapia da cebola antes de conhecer você.

— Humm, então talvez você queira me contar dos seus ex-namorados e sobre como deixou de beijar um ou de viver com outro...

Samantha o encarou sob o luar.

— Eu nunca vivi com nenhum homem além do meu ex-marido.

— Ah-ah. Não foi muito divertido, não é?

— Não quero falar dele.

— Então me conte sobre os outros. Apaixonou-se por todos eles?

Samantha perdeu a paciência.

— Sabe muito bem que você foi o único homem a... a... compartilhar da minha cama. Eu gostava de cuidar dos rapazes e depois casá-los com a mulher certa. Não havia nada... mais sério em meus relacionamentos...

— Você é uma mulher adorável, Samantha — falou Brad em seu sotaque grave e arrastado.

Ela o fuzilou com os olhos.

— Pare de ficar escarafunchando sobre o que aconteceu entre eu e meus ex. Nenhum deles era assim tão preocupado com sexo, então isso não foi um problema.

— Ah! O sexo não foi problema — repetiu, encantado. — Sou o único homem a partilhar da sua paixão incandescente... Isso deve querer dizer que estou à frente dos outros rapazes.

— Não sou leviana, Brad — afirmou, orgulhosa, cobrindo o joelho nu com a ponta do robe. — Já falamos sobre isso... Nós dois somos monogâmicos.

Um intenso calor de prazer se espalhou pelo corpo de Brad.

— Acho que as pessoas monogâmicas deviam cuidar uma da outra, não acha?

Samantha estendeu a mão para afagar-lhe o cabelo e puxá-lo para perto. Brad sentiu que era bem-vindo e depositou a mão sobre os seios dela. Notando a mudança, o volume pleno, admirou-se do milagre de haver uma criança dentro dela.

— Eu te amo, Samantha Jane. — Rezou para que ela também o amasse daquele jeito especial.

Samantha estudou-lhe o rosto, contornando-lhe os traços e a forma dos olhos, as bochechas e os lábios. Alisou a barba que despontava ao final do dia com a palma, e Brad beijou-lhe a mão de passagem.

— Dê um tempo a Lúcia — sussurrou ela. — Ela vai superar.

Brad afastou uma mecha de cabelo da face de Samantha, sentindo nova pontada de dor. Descobriu-se compartilhando de seus temores em voz alta:

— Estou rezando para que ela não fuja.

— Lúcia é uma garota esperta. Ela é mãe e sabe onde é seguro para uma criança. Não vai nos deixar — afirmou Samantha.

Então beijou-o de leve e sussurrou:

— Acho melhor você entrar, Brad. A velha Srta. Jones, do outro lado da rua, tem binóculos, e não é para observar os pássaros!

— Você é uma mulher perigosa, Samantha Jane. Temo pela minha saúde. Mesmo assim, vou aceitar o seu amável convite e colocar minha vida em suas mãos.

O riso sensual e misterioso de Brad tinha tudo a ver com a vida e nada a ver com seu passado sombrio.

Pai? — gritou Lúcia lá de baixo. Samantha pestanejou, lutando contra o sol da manhã. A mão grande e quente de Brad acariciou-lhe o ventre.

— Pai? Samantha,vi o pick-up do meu pai aí na frente, ele está aqui? — gritou Lúcia, e o retinir dos cascos de Leroy ecoou por toda a sala de estar.

— Hummm — murmurou Brad, zonzo, movendo a mão um pouco mais para baixo.

Samantha franziu a testa. Extravasara toda a sua paixão com Brad e ele sobrevivera à experiência, várias vezes durante a noite.

Entregara-lhe o corpo sem reservas, porque o amava profundamente, até a alma. Levou a mão ao coração. O senso de nobreza de Brad o forçaria a casar-se e a dar ao filho o nome Remington. Samantha refreou o medo que a invadiu. Ergueu a mão de Brad.

— Brad, acorde! — murmurou, tateando em busca da camiseta. Encontrou-a sob a barriga dele e a puxou. Enfiou os braços dentro dela e tentou livrar as pernas, presas sob as coxas dele.

A mão de Brad se insinuou por baixo da camiseta Para encontrar-lhe o seio e acariciá-lo. Abrindo um olho, Murmurou, em seu sotaque sulista:

— Sinto-me como se tivesse sido deliciosamente esmagado e massacrado. Acho que agüento mais uma, querida. Adoro ouvir os seus gritinhos de prazer.

— Eu não grito, Brad Sebastian Remington! A mão enorme roçou-lhe a coxa.

— Grita, sim. Gritinhos maravilhosos... como se estivesse se entregando até a alma...

Os dedos apertaram-lhe a coxa com força, como se ele esperasse que ela dissesse alguma coisa. Então perguntou, em voz rouca e embargada:

— O que está achando de tudo isso?

Samantha sentiu que Brad estava lhe perguntando sobre o compromisso que ela não queria assumir. Ainda não.

Ela o amava.

O coração bateu forte no peito... Percebeu a dor, rapidamente disfarçada, naqueles olhos sombrios.

Respirou fundo, perplexa ao ver o traseiro nu de Brad brilhando ao sol da janela.

—Você está em pêlo! — resmungou, erguendo as cobertas.

Brad se virou e a agarrou por baixo das cobertas.

— Peguei! — Beijou-a e insinuou as mãos por baixo da camiseta, esfregando-lhe o umbigo.

— Lúcia e Carina estão aqui — sussurrou ela sob as cobertas. — São sete horas e eu devia estar no Sammy's...

Os passos de Carina subindo a escada se fizeram ouvir, junto com sua vozinha:

— Tá-tá?

Leroy grunhiu, zangado, porque não conseguia subir as escadas com Lúcia.

— Carina, quantas vezes lhe falei para não... Leroy, pare com isso! Tem de esperar até descermos. Não tem uma rampa tão grande que chegue lá em cima — ordenou Lúcia. — Papai? Carina entrou no quarto e, rindo, deu batidinhas na cabeça de Samantha, depois na de Brad, sob as cobertas.

— Peguei! — exclamou, triunfante.

Sob as cobertas, no escuro, Brad sorriu para Samantha. Com um ar malicioso e brincalhão, repetiu:

— Peguei!

Samantha fuzilou-o com os olhos e pigarreou.

— Já... já vamos, Lúcia.

Mas Brad a estava puxando para cima, arrumando os travesseiros às suas costas e puxando as cobertas até a cintura. Agarrou-a pela cintura.

— Diga alguma coisa, Brad — sussurrou, em desespero. — Sabe muito bem o que vão pensar.

Os olhos de Brad se fecharam nos cantos e a boca se retorceu, como se ele estivesse tentando não rir.

— Brad! — suplicou Samantha. — Pense em algo!

— Tudo bem! — Então se voltou para a filha, que chegara e ficara parada à porta. — Você me chamou de pai, Lúcia. Obrigado.

Ela deu de ombros, constrangida.

— Ah, não é nada de mais.

Samantha esperava uma explicação razoável da presença de Brad em sua cama, mas a mudança de assunto a fascinou.

— Para mim é — falou Brad, ajudando Carina a subir na cama.

Samantha ficou imóvel, sentindo que Brad a queria a seu lado. Era uma sensação nova e estranha estar deitada ao lado de um homem num quarto cheio de gente. Cerrou os dedos em torno do pulso dele.

Lúcia, hesitante, entrou no quarto, esfregando a ponta do tênis no tapete.

— Achei que talvez quisessem ir pescar comigo...

— Estou cansada — anunciou Carina, deitando-se entre Samantha e Brad.

— Ela teve uma noite ruim — explicou Lúcia com um suspiro ao ver os olhos da filha se fecharem. — Ela fica preocupada quando me vê chorar.

Brad franziu o cenho.

— Vamos superar isso, Lúcia. Entendo como se sente. A distância entre Brad e a filha diminuía, pensou Samantha, bocejando. Acariciou Carina, também se sentindo sonolenta.

— Eu fico com ela — falou, bocejando de novo, e se deitou ao lado da menininha. — Vão pescar. Só não peguem o meu peixe gigante... Ah, avisem Norm, por favor!

Na segunda semana de agosto, Brad aspirou o ar fresco da manhã. Lançou a linha e esfregou o estômago revolto. Lidar com duas mulheres tão diferentes deixava-o nervoso.

Samantha andava mal-humorada e arisca.

A tensão se elevava em Elegance, como um bando de trutas famintas prontas a subir à superfície...

Naquela manhã, Norm insistira em que Brad fosse pescar, pois "estava pálido e com cara de exausto".

Lúcia tratava sua nova condição no estilo metódico tradicional dos Remington. Refletia sobre toda a sua vida com calma, fazendo perguntas a Brad quando tinha vontade. Não tinha mais aquelas sombras roxas sob os olhos e o riso vinha mais fácil. As vezes ficava fitando o vazio, e Brad sabia que estava pensando em sua mãe. Descobrir que sua vida fora uma mentira não fora fácil para ela, mas Lúcia enfrentava o desafio.

O modo como ficara encantada com a isca que Brad criara para ela, um inseto amarelo-brilhante de pêlos escuros, o animara.

Brad franziu o cenho para a truta marrom surgindo das profundezas para saltar sobre "Samantha".

Sorriu, deixando a boca aberta da truta passar a um centímetro da isca. Estava certo de que ela jamais havia extravasado sua paixão com nenhum outro homem.

— Mulher teimosa — murmurou, manejando a isca. Não levaria muito tempo até o bebê não ser mais segredo para ninguém.

Samantha dormia muito e corava quando Brad a aconselhava a procurar um médico para ver o que havia de errado com seu estômago.

Brad esfregou a barriga e decidiu parar de comer tanto no café da manhã até as emoções de Samantha se estabilizarem. Fechou os olhos ao se lembrar dos ovos matinais brilhando à sua frente.

Um novo bebê, a filha e a neta... Sorriu, e notou que suas emoções andavam tão instáveis quanto as de Samantha.

Queria que ela viesse até ele de livre e espontânea vontade, e não porque um pequeno milagre estava crescendo dentro dela.

Outro bebê... outro bebê para pegar no colo e embalar. Outro bebê na família, para compartilhar do amor entre Lúcia e ele, que se fortalecia dia a dia.

Lembrou-se do ursinho de pelúcia no armazém e resolveu dá-lo a Samantha...

Em plena hora do café, Samantha olhou para o imenso ursinho peludo em suas mãos e para o sorriso de Carina, sentada sobre os ombros de Brad. Lúcia abraçou o panda que Brad acabara de lhe dar e ficou na ponta dos pés para lhe dar um beijo no rosto. Quando ele passou o braço em torno de seus ombros, Lúcia ficou tensa; então, devagar, passou o braço em torno dele.

Os três ficaram ali, juntos, no Sammy's, pai, filha e neta, com cara de bobos esperando que ela falasse alguma coisa. Ao fundo, Elvis cantava Love Me Tender.

Era a família de seu bebê, os Remington, vindos da Geórgia. O coração dela deu um pulo de alegria.

Agarrou a ponta do balcão com força e ouviu-se anunciando abertamente:

— Brad, vou ter um filho seu!

Os fregueses da hora do café se viraram para encará-la. Tex, sempre levando a sério seus deveres de enfermeiro, desligou a vitrola automática.

Norm foi para o lado de Samantha.

Os dedos dela doíam de segurar o balcão.

Com cuidado, Brad passou Carina para Lúcia, que olhava de Samantha para Brad com ansiedade. Ele respirou fundo e olhou de relance para os fregueses ao redor. Seu olhar encontrou o de Tex, que sacudiu a cabeça com tristeza.

Brad tomou fôlego novamente e se aproximou de Samantha. Observou-a com atenção. Ela deslocou o peso de uma perna para a outra. Norm recuou um passo.

O anúncio ressoou nos ares enquanto Brad chegava diante dela.

— Escolheu uma bela hora, Samantha Jane.

Ela fitou as expressões preocupadas em todo o bar e um rubor começou a afluir-lhe da garganta às faces.

— Ah... Brad... hã... sabe... você anda muito sensível nos últimos tempos...

O indicador dele investiu delicadamente contra ela; ignorou a acusação.

—Não vou tornar as coisas mais fáceis. Não vou lhe perguntar de novo... Quero que venha comigo agora. Precisamos urgentemente conversar em particular — declarou, em tom formal, com seu sotaque de machão sulista.

Samantha agarrou-se ao balcão. Ele estava lhe pedindo que começasse uma nova vida com ele. Que esquecesse a dor e o passado e rumasse para um futuro...

Estremeceu com as lágrimas que rolavam e a vontade de ser abraçada por Brad. Ele a fitava com um ar severo e inabalável.

Deixara que ela escolhesse.

Ficou paralisada, perdida em meio às interrogações.

— Samantha Jane, aconteça o que acontecer — Brad bateu suavemente com o indicador no peito de Samantha, contornou o balcão e colocou a mão sobre o ventre dela —, não se esqueça: essa criança é minha e eu a quero para mim. Amo nosso bebê, vou cuidar dele e fazer o que for preciso. Mas... de você, quero algo mais.

Então ele a reclinou sobre o braço e deu-lhe um beijo de tirar o fôlego. Samantha agarrou-lhe os ombros, esquecendo-se de que os fregueses assistiam a tudo.

Quando se recobrou, pestanejou diante de Norm, que a fitava boquiaberto.

— Garota, você precisa de umas lições — resmungou, vendo Brad colocar Leroy a seu lado no pick-up e se retirar.

Samantha mordeu os lábios, saboreou o beijo estonteante de Brad e olhou para Tex, que sacudia a cabeça com tristeza, conversando com os Brown. Norm espiou pela janela do cozinheiro.

— Entre aqui. Está me deixando embaraçado!

As pernas de Samantha bambearam ao entrar na cozinha. Norm a encarava como se houvesse cometido um crime.

— Eu quero esse bebê — afirmou. — Vou ter o filho de Brad... acho que vou. Então não me venha com outras idéias.

— Não pode jogar isso na cara de um homem na frente de todo mundo! — Norm fechou a janela do cozinheiro, o que significava que os fregueses teriam de esperar até que estivesse pronto. Cruzou os braços. — Escute, moça. Brad tem andado... Ah... sensível. Ele anda pálido como um cadáver. A tensão faz isso com um homem... Bem...

Norm se remexeu, inquieto, e desviou os olhos.

— Bem, suponho que haja outras razões para um cara não dormir regularmente... Quero dizer, se um cara não dorme oito horas por dia...

— Eu o amo. Essa é a questão.

Norm fechou os olhos, depois abriu-os e ergueu-o para o céu.

— Um cara precisa de romance... beijos... e, acima de tudo, estar a sós com sua garota quando ela lhe dá uma notícia dessas. Samantha, você não tem nenhum tato. Arranje algum — falou, antes de abrir a janelinha. — E arranje umas roupas femininas, insinuantes, macias, para usar de vez em quando... E pare de fritar cebola. Uma mudança de perfume não lhe fará mal.

Lúcia abriu a porta da cozinha, entrou e pôs o braço em torno dos ombros de Samantha.

— Papai ficou contente com o bebê. E eu também. Ele caiu fora por alguma outra razão... Ah... talvez você devesse ter lhe contado em particular...

Tex abriu a porta com estardalhaço, cruzou os braços na frente do tórax musculoso e franziu o cenho para Samantha.

— Sam, não pode ir falando essas coisas em público! E algo muito íntimo!

Samantha percebeu que sua reputação como casamenteira e especialista em romances estava indo por água abaixo.

— Pode esquecer o vôlei e o softball, Sam. Assim que eu contar aos seus ex, não vão deixar você jogar. Assim, acho que é melhor você começar a praticar para melhorar o seu desempenho romântico, hein? — sugeriu Tex.

Naquela noite, Samantha sentou-se ao chão com o braço em tomo de Leroy; seu pai sentava-se em sua poltrona favorita. Com o braço livre, agarrou uma almofada. A gravidez lhe acentuava os desejos sexuais, e Brad era o único homem que a fazia sentir-se completa, desejável, amada.

— Criei a maior confusão, papai — lamentou-se.

—Ouvi dizer. Falou a Brad sobre o meu suposto futuro neto como se estivesse anunciando uma alteração no cardápio! Ele te ama, Sam. Mas vai ter trabalho para desfazer a confusão que criou. Ora, o ideal teria sido um jantar romântico, dar ao sujeito a oportunidade de se acostumar com a situação, então preparar o anzol e fisgá-lo.

— Como o meu peixe gigante lá no rio — murmurou Samantha, distraída, desejando haver esperado uma ocasião mais romântica.

O pai deu uma gargalhada.

— Querida, Brad é o seu peixe gigante! Eu soube assim que vi os dois olhando um para o outro. Um cara como Brad tinha de reagir de algum modo. Ele é um lutador, como você. Mas, no fundo, tem coração mole. Você vai ter de experimentar outro tipo de isca — sugeriu.

— Achei que ele devia saber — declarou Samantha em sua defesa. — Não quero obrigá-lo a casar-se comigo por causa do bebê.

— Aposto que não é ele que tem medo da aliança, querida. É melhor refletir sobre isso.

— Ele não pegou nenhum peixe desde que veio para cá. — Samantha alisou a almofada e desejou estar esmagando o tórax largo e coberto de pêlos de Brad contra os seios.

—Ah, eu diria que ele encontrou um peixe difícil de fisgar...

Samantha puxou Leroy para mais perto e perguntou-se desde quando aprendera a abraçar e a confiar no porco.

— "Fique com o meu porco". Foi só o que ele falou antes de amarrar o trailer no pick-up e sumir da cidade... "Fique com o meu porco". Pai, não é nenhum "eu te amo", é?

— Sam, você sabe que ele tinha aquela demonstração em Abstinence, a cem quilômetros daqui. Precisava estar lá à tardinha, no início do torneio de pesca, é o convidado de honra.

Leroy grunhiu, compreendendo tudo, e aninhou-se mais junto a Samantha, encarando-a com olhos espichados.

— "Fique com o meu porco" — repetiu ela. — Ficou ali, na varanda, com aquela cara de durão, de gótico, de jaqueta de couro, jeans e botas. Ficou me olhando uns segundos como se esperasse que eu fizesse alguma coisa. Então me estendeu a correia de Leroy e falou: "Fique com o meu porco". Pai, isso não é nada romântico, principalmente se uma mulher acabou de contar a um homem que vai ter um filho dele.

— Bom, eu diria que é como se ele estivesse lhe pedindo que tomasse conta do filho dele e dizendo que voltava logo. Por que não tira folga amanhã e vai até Abstinence, Sam?

— Bah! De jeito nenhum! Você não estava aqui esta manhã, pai. Ele falou que não ia tornar as coisas fáceis para mim. — Samantha encarou o pai de frente. — Aliás, ele não é nada fácil.

— Ele teve uma vida dura e você feriu seu orgulho. O que eu acho é que tudo o que vale a pena a gente ter, vale a luta. Você nunca teve de lutar para conseguir um homem ou para ficar com ele. Está disposta a demonstrar a Brad que se importa com ele?

Samantha alisou as costas de Leroy, que lhe sorriu, esperançoso.

— Brad é bonito, não é, pai? — murmurou ela, rindo de leve.

— Ah? Bonito? Brad? — O pai a fitou, espantado, depois caiu na gargalhada.

Brad fechou a caixa de iscas e sacudiu a cabeça. Quando pedira a Samantha que saísse do bar com ele, ela agarrara o balcão com as duas mãos, até ficar com os dedos brancos.

Esfregou os olhos, lembrando-se de que não dormira. Às duas da madrugada, tinha tempo para cinco horas de sono antes de abrir o torneio de pesca. Mirou-se no espelhinho do trailer e esfregou a barba que despontava. Com olheiras imensas e o cabelo desalinhado, parecia mesmo um "gótico".

A luz fraca bateu em seus cabelos grisalhos e os lábios de se comprimiram, o rosto se enchendo de rugas.

— Um velho gótico — resmungou, ouvindo uma batida à porta.

— Brad, você está aí?

Ele escancarou a porta e viu Samantha recuar um passo para evitar um golpe.

— O que está fazendo aqui? — perguntou ele, deparando-se com o vestido negro que lhe aderia às curvas. Baixou os olhos até a barra do vestido, que deixava à mostra grande parte das longas pernas.

A luz da luminária sobre o trailer incidiu sobre seu cabelo molhado da chuva. Samantha puxou a alça da bolsa mais para o alto do ombro. O movimento fez com que os seios se erguessem junto ao decote; a chuva brilhava sobre sua pele.

— O que está fazendo aqui vestida desse jeito? Onde está a sua capa? — perguntou Brad, ajudando-a a entrar no trailer. Pegou uma toalha e começou a enxugar-lhe o rosto e o colo. Inclinou-se, tirou-lhe os sapatos e apoiou o pé dela em sua coxa para continuar a enxugá-la. Só então notou que ela estava de meias. — Vai pegar um resfriado.

— Está feliz em me ver ou não, Brad? —. perguntou, tensa, deixando a bolsa cair ao chão.

O peso machucou-lhe os pés descalços, mas Brad estava zangado demais para ligar.

— Mudei de idéia — afirmou, afastando a bolsa para, o lado. — Compromisso não basta. Quero mais.

— O que quer de mim? Quais são as regras?

Brad escolheu as palavras. Propusera casamento e nadadores muito cedo para ela. Agora ela estava desconfiada, mas fora procurá-lo.

— Não vai me ter assim tão fácil. Há um bebê entre nós e quero que ele ou ela saiba que eu posso controlar esse tufão de cabelos ruivos que é sua mãe. Precisamos levar isso em conta e outras coisas, também. Estabelecer um equilíbrio entre nós.

Estava arriscando, com o coração acelerado, de medo que ela fosse embora.

— Quero ter certeza de que não pensa de mim o mesmo que de seu ex-marido, de que sabe que não vou magoá-la. — Engoliu em seco. — Preciso saber que não está se sentindo pressionada... que não acha que precisa gostar de mim porque tem um filho meu na barriga.

Se Samantha o abandonasse agora, ele teria de inventar uma nova tática para fazê-la compreender quão profundos eram seus sentimentos por ela. Que passava o dia pensando nela e que seu coração clamava por ela quando estavam separados. Que quando estavam juntos, sentia-se realizado. Ela precisava saber o quanto a amava.

Era querer demais?

— Mostre-me — murmurou Samantha, jogando-se em seus braços. — Oh, Brad! Mostre-me o que quer!

Segurou-a com força, temendo despertar do sonho e ver que ela se fora. Enterrou o rosto na curva de seu pescoço e respirou fundo. O exótico perfume feminino o envolveu. Estava em casa, ao menos por um instante.

— Veio me seduzir? — perguntou-lhe ao ouvido, inebriado.

— Desculpe por não ter lhe contado sobre o bebê de outro jeito — sussurrou ela. — Desculpe por não ter saído com você quando me pediu. Eu o magoei, não foi?

—Você está aqui agora.

— Tudo é tão novo e tão forte... — sussurrou ela, estremecendo.

Brad fechou os olhos e saboreou o calor dela contra si. De repente, um tremor a percorreu.

— Brad, talvez não haja um bebê! Não fui ao médico. Mas o teste de gravidez deu positivo.

Vamos ver isso. — Brad deu-lhe um beijo no rosto e a embalou. — Se for, logo saberemos. A primeira coisa a fazer é levar você ao médico.

— Tudo isso é novo para mim. — Passou os olhos pelo trailer e viu a cama desarrumada. — Nunca fui atrás de um homem e o encurralei num trailer minúsculo...

— Está com vergonha? — Brad a amou mais ainda por reservar aquela experiência a ele.

Samantha afagou-lhe os cabelos.

— E você?

— Não posso dizer que já tenha sido seduzido num trailer antes... E uma experiência e tanto! — murmurou, olhando para a forma como os seios dela comprimiam-lhe o tórax. Se não se enganava, Samantha estava usando um sutiã de renda negra...

O corpo dele ficou tenso e quente com aquele pensamento.

— Esse vestido é bonito.

— "Bonito"! Só isso? "Bonito"? Tem alguma idéia de quanto trabalho uma mulher tem para entrar numa roupa dessas? Brad Remington, quero que saiba que "fique com o meu porco" não é nada romântico! Deixei Leroy com papai. Ele estava com saudade de você e eu queria trazê-lo, mas...

Brad levantou-lhe a barra do vestido e insinuou os dedos por dentro da meia.

— O que trouxe na bolsa?

—Minha camisola — respondeu Samantha, corando. Olhou para o tórax nu e traçou desenhos com o dedo sobre ele.

— Vai ter de ir lá para fora enquanto eu a visto. Ah... a não ser que prefira que eu vá para um hotel...

Brad riu, cheio de alegria; Samantha franziu a sobrancelha e sacudiu a cabeça.

— Você é um homem estranho, Brad Remington — declarou, pensativa.

CAPITULO DEZ

Quando Brad enfiou o dedo por baixe do corpete e insinuou-o entre os seios, Samantha estremeceu.

— Você tem seios magníficos, minha querida. O contraste do branco cor de leite com os mamilos bem róseos... A cor avermelhada me lembra uma outra parte da sua anatomia, mais ao sul, onde a textura lasciva...

— Que modo indecoroso de falar! — Samantha ficou arrepiada quando o dedo travesso de Brad tocou-lhe os mamilos, que saltaram em sua direção, investindo contra o tecido. Corou e percebeu que o elogio de Brad a havia excitado, apesar da intimidade. Reclinou-se para trás, olhando para o rosto não barbeado de Brad enquanto ele se levantava para pegar duas velas numa prateleira. — O que está fazendo?

Ele colocou as velas em candelabros e ligou o toca-fitas. Um violino romântico preencheu o espaço do trailer e Brad a tomou nos braços. Samantha resistiu.

— Não estou certa de que um homem deva falar a uma mulher sobre as partes de seu corpo.

Brad desceu a mão para cobrir-lhe o traseiro e acariciá-lo.

— Minha querida, você nunca me deu uma chance de empregar minhas técnicas de sedução. Você tem um estilo vapt-vupt que deixa a gente sem fôlego.

Samantha alisou os músculos rígidos do pescoço e dos ombros de Brad.

— Eu queria saber por que... você não teve um... caso... em todos esses anos. Que eu saiba, é um período de tempo longo demais para um homem normal viver em abstinência.

Brad levou os lábios aos dedos dela, beijando-os.

— Estava poupando minhas energias e meu amor para você, Samantha Jane.

Samantha respirou fundo quando ele lhe beijou o rosto, passando depois aos cantos sensíveis de seus lábios.

— Hummm... Você... acha que eu sou... Eu te satisfaço, Brad?

— Mais do que qualquer sonho! — Ele beijou o outro canto dos lábios, passando a língua por eles suavemente. Samantha retribuiu à torturante carícia.

— Brad? Você... sonha comigo? — Samantha ficou excitada com essa idéia. Nenhum homem jamais lhe dissera que sonhava com ela. Reteve a respiração. Sonhava com Brad e se ele não lhe retribuísse o favor, ia desmoronar.

— Sonho com você... às vezes acordo sem você em meus braços e penso que vou morrer — sussurrou Brad em voz sensual, levando a mão ao zíper do vestido dela. Beijou-lhe o ombro nu, dando-lhe pequenas dentadas.

— Morrer? Mesmo? — perguntou Samantha, sem esconder a excitação que a invadia enquanto Brad tirava-lhe o vestido.

Brad fitou-lhe o corpo da cabeça aos pés ao mesmo tempo em que lhe tirava a meia-calça.

— Samantha Jane... Você é demais!

— Brad... estou tão assustada! — admitiu ela, trêmula.

— Venha cá — murmurou ele, puxando-a para si. — Eu também estou com medo.

— Você? — Jamais pensara em Brad como um homem capaz de ter medo.

— Claro! Tenho medo de perder você. As pessoas monogâmicas não vivem muito bem sem a sua outra metade, sabe... Ficam como um pneu murcho numa velha estrada solitária... Tenho medo de perder a alegria que você me dá todos os dias, só de vê-la. Tenho medo de perder o calor que brota dentro de mim sempre que a vejo. Acariciou-lhe os cabelos.

— Você é minha segurança, Samantha. Meu sol.

— Mesmo? — Samantha chegava cada vez mais perto, excitada com aquele novo Brad.

As mãos imensas soltaram-lhe o sutiã; depois, retiraram-lhe a calcinha. Ele a manteve um pouco afastada.

—Mas eu sinto um medo terrível, que me faz suar e tremer cada vez que penso em certa coisa.

— Oh, Brad, que horrível. Que medo é esse? — perguntou, preocupada em que algo pudesse aterrorizar Brad daquela forma.

— Vamos fazer assim: você vai para a cama, eu vou me barbear e depois venho lhe contar tudo — sugeriu, passando as mãos por baixo do traseiro dela e erguendo-a contra si. Apertou-lhe os seios e beijou-os com ternura. Samantha se deitou na cama estreita de Brad e viu-o barbear-se à luz de velas. O cenário a fascinava. O maxilar de Brad reluzia quando, finalmente, retirou os restos de espuma e voltou, soprando as velas.

— Mas, Brad, você nunca me contou desse seu medo. O som do jeans dele deslizando para o chão a paralisou.

O lençol e o cobertor leve se ergueram e o ar frio roçou-lhe no corpo. A cama pequena mas confortável balançou e Samantha se encolheu. Brad, deitando-se a seu lado, segurou-lhe a mão e colocou-a sobre seu coração.

— Samantha Jane, eu tenho um medo profundo e aterrorizante de que jamais façamos amor de modo lento e completo.

Ela engoliu em seco, com o coração disparando.

— Sinto muito que não esteja contente, Brad — começou, trêmula.

— Não é que não esteja contente, Samantha. Eu me sinto amado quando, ao final, você descansa em cima de mim. Apesar disso, espero o dia em que façamos amor de um modo mais lento. Não vou a lugar algum. Temos todo o tempo do mundo.

— Fazer amor mais devagar?

Brad afastou o lençol para beijar-lhe o pescoço, os ombros, os seios. Estudou-a e resistiu à tentativa dela de puxar o lençol de volta.

— Penso que podíamos ter uma noite romântica... Ir ao cinema ou jantar fora, e dançar à luz de velas. Então, quando chegar o momento certo, depois de alguns beijos lentos, poderíamos nos recolher. Não quero que você pense no seu tempo de namoro e diga "o velho Brad precisava de umas lições".

— Namoro? — Foi só o que ela conseguiu falar, a muito custo, com ele chupando-lhe os seios e fazendo um desejo intenso brotar em seu íntimo.

— Você é uma mulher muito passional, Samantha — murmurou Brad, beijando-lhe o umbigo e cobrindo-lhe a feminilidade com a mão. — Convido-a a me tocar, também — sugeriu, em voz rouca, aproximando o rosto de seu ventre.

Samantha agarrou-se aos ombros másculos e acompanhou a saliência dos tendões. Brad beijou-lhe o ventre, fazendo-a arquear os quadris.

— Brad...

— Hummm? — Beijou um ou dois centímetros mais abaixo, então cedeu aos dedos dela que lhe puxavam os cabelos. Descansou sobre ela.

— Leve-me para onde quiser que eu vá — pediu, depois de um longo beijo. — Aqueça-me com o seu fogo, pois sem você eu sou um homem frio e solitário.

Samantha fechou os olhos, encantada com o tom antiquado e romântico de suas palavras, que a aqueciam dos pés à cabeça num turbilhão de emoções. Ele continuou a murmurar-lhe ao ouvido palavras de amor, chocando-a até que ela entendesse o desafio...

Ela o inseriu lenta e timidamente em seu calor, e Brad fechou os olhos, com o corpo estremecendo uma vez ao penetrar mais fundo. Passou as mãos pelos quadris de Samantha e a levantou um pouco mais. Alojado firmemente dentro dela, preenchendo-a até ela temer deixá-lo cedo demais, Brad sussurrou:

— Agora vamos falar sobre o que existe entre nós...

— Falar? — Samantha enlaçou-lhe os quadris com as pernas e cravou os dedos em seus braços. Arqueou-se; seu corpo arremeteu contra ele e Brad recuou um pouco, só para penetrá-la novamente. — Falar? Brad, faça alguma coisa!

— Estamos fazendo alguma coisa, Samantha — lembrou-lhe ele em tom irônico.

Não era hora para piadas. Ela cruzou os braços em torno do pescoço dele e puxou-o para si.

— Fique quieto, Brad Remington.

— Posso lhe dizer o que quero? O quanto eu a desejo e como estou orgulhoso que tenha vindo me procurar? — perguntou Brad, devagar.

— Pode — respondeu ela, chocada com sua vontade de ouvi-lo falar com ela intimamente.

Enquanto falava, Brad esfregava o tórax contra os seios dela devagar, lascivamente. Torturou-lhe os cantos sensíveis da boca até ela erguer os lábios para encontrar os dele. Então se afastou um pouco, parecendo tomado de fúria, e voltou novamente para beijar-lhe o pescoço, localizando-lhe o ponto pulsante e colocando a boca sobre ele. Ela o agarrou, mordeu-lhe o pescoço e entregou-se ao fogo que os consumia.

— Samantha, você é uma mulher quente, cheia de fogo — murmurou Brad enquanto ela lhe mordia o ombro para estancar o prazer... para acompanhar o ritmo dele.

— Inflamável.

A mão dela introduziu-se entre ambos, circulando-o, e Brad ficou paralisado. Ela estremeceu, indagando-se se havia violado as regras masculinas de fazer amor, e afastou a mão.

— Vai me pagar por isso, querida — declarou Brad, trêmulo.

— Eu não devia ter... — Engasgou quando a boca aberta de Brad encontrou-lhe os seios. A mão máscula introduziu-se entre eles e tocou-a em certo lugar, e ela se incendiou toda, retesando-se e arqueando-se contra ele.

— O que pensa que está fazendo, Brad? — indagou, sem fôlego, quando ele a deixou derreter-se toda na cama.

— Penso que estou te amando de um jeito físico e espiritual, meu amor — falou Brad, com a voz embargada e as mãos tremendo ao alisar-lhe os quadris. Penetrou-a lentamente e Samantha percebeu que ele possuía outros planos para ela. - Por favor, não me peça para fazer outra coisa... e, pelo amor de Deus, não me toque como me tocou ainda há pouco.

— Sinto muito, Brad...

— Não é isso, querida — falou Brad por entre os dentes. — É que, se me tocar agora, as conseqüências serão nefastas.

Então Brad entregou-lhe suas forças e ela pediu mais, indo a seu encontro com tudo, sem medo de tocá-lo, de introduzi-lo mais fundo em seu coração e em seu corpo.

Brad se afastou um pouco, respirando rápido, com o coração martelando contra o dela. Ela o fitou e soube que estava esperando por ela. Samantha empurrou-o para a cama e foi para cima dele. Ouviu a chuva retinindo no telhado, a respiração alterada de Brad e o ranger da cama. Quando ele segurou-lhe os seios e a acariciou, Samantha fechou os olhos, sentindo um latejar profundo e delicado em suas entranhas.

Ele a tocou de novo naquele ponto íntimo e ela ardeu em chamas, levando-o consigo. Ali, naquela estreita cama de um trailer, ficou deslumbrada com o peso de Brad quando rolou sobre ela mais uma vez enquanto a tempestade lá fora se aquietava.

— Eu te amo, Samantha, e sempre te amarei — murmurou, abalado, começando a penetrá-la. Pela segunda vez, ela se agarrou a ele e retribuiu-lhe com paixão.

Vários momentos depois, conseguiu reunir forças para levantar a cabeça do peito de Brad. Ele não a deixara, mantinha-a junto a si. Fitava-a com uma expressão terna.

— Quero que me toque como quiser, querida. — Alisou-lhe as costas, depois o traseiro. — Mas existem momentos e momentos. Achei que seria bom irmos num ritmo mais lento.

Samantha sorriu. Brad era tudo o que sempre quisera, terno, exigente; sentiu o amor por ele invadi-la e encolheu-se para dormir. Brad a puxou para perto.

— Brad? Tem certeza de que está bem? — perguntou, lembrando-se do desespero com que o puxara para si, das mordidas que lhe dera no ombro, de...

Samantha ergueu-se e puxou o lençol até o peito.

— Qual é o problema agora? — perguntou Brad.

—Tem certeza de que... de que o que estamos fazendo é normal, Brad?

—Tão normal quanto uma torta de batata doce. Creio que estamos a ponto de partir numa viagem de exploração, diversão e amor. Tremo só de pensar no que nos espera — respondeu ele, apertando-a. — É porque o que sentimos um pelo outro é muito profundo. O fogo só nos aproxima, nos une.

— Você diz coisas estranhas, Brad. Muito estranhas.

— Samantha comprimiu os seios contra ele, o que lhe aliviou um pouco o desejo. Quando Brad quis colocar-lhe a coxa entre as suas, resistiu.

— Venha cá, Samantha. Durma comigo, junto a mim — ordenou, sonolento, e bocejou.

— Podemos dormir assim? — perguntou ela quando Brad depositou a mão sobre seus seios.

— Claro que sim. Será o sono mais doce do mundo. Agora me dê um beijo de boa noite.

Acordou com Brad lhe fazendo amor, tentando-a com beijos. Arqueou, sonolenta, espreguiçando-se embaixo dele, e empurrou os seios contra a sua boca deliciada.

Então a paixão explodiu de novo, ela o agarrou, temendo que se afastasse, temendo haver sonhado aquilo tudo...

O grito abafado de Brad ressoou dentro dela. Ao mesmo tempo, reconheceu o som de seu próprio grito, forte e contido. Ele descansou sobre ela, com os dedos dos pés brincando com os dela, beijando-a sem pressa. Louca para aprender novas delícias, Samantha beijou os cantos dos lábios dele, que gemeu, com relutância.

— Preciso ir. Fui encarregado de abrir o torneio. Você fica dormindo aqui, na minha cama, sonhando comigo, querida. Depois a gente se encontra...

Deu-lhe um beijo longo e cheio de paixão.

— Porque tenho planos para você.

— Não posso ficar aqui! Todo mundo vai saber! — sussurrou Samantha quando Brad se afastou da cama. A luz fraca incidiu-lhe sobre o traseiro e ela não conseguiu desviar os olhos daquele corpo musculoso e rígido.

Ele voltou-se para encará-la. Ela enrubesceu, consciente de que o desejo de Brad não se esgotara.

— Vai ter de decidir o que você quer — declarou Brad.

— Talvez eu fique — replicou Samantha, admitindo o desejo por ele e o forte magnetismo que os ligava. Será que seu filho se pareceria com Brad? Haveria um filho? Teve medo de ir ao médico e saber que não havia um bebê.

— Como sabe que estou grávida? — perguntou Samantha quando ele se retirou ao minúsculo banheiro. O som da água encobriu-lhe a resposta e ela se levantou da cama.

— Como sabe que estou grávida, Brad? — repetiu, abrindo a porta e encontrando Brad com a testa reclinada para o lado. Pálido e trêmulo, ele esfregava o estômago com a mão. — Você está bem? Oh, meu Deus, eu... deixei você esgotado! Oh, Brad, sinto muito...

Ele engoliu devagar e encarou-a com aquela expressão de cachorrinho abandonado.

— Estamos grávidos, sim — disse ele, perturbado, antes de empurrá-la delicadamente para fora e fechar a porta.

Samantha encontrou-o às onze horas. Sentia-se revigorada, pronta a enfrentar os velhos medos.

Quando Brad, o convidado de honra no almoço, a viu entrar no salão, levantou-se e foi ao seu encontro. Ficou arrepiado ao vê-la com a sua camisa e o jeans, com a barra virada. Notou as unhas tingidas de vermelho nas sandálias recém-compradas e teve vontade de chupá-las.

— Bom dia, meu amor — murmurou, beijando-a com ternura.

Ela o empurrou para trás e olhou para a platéia, que sorria como o gato da história de Alice no País das Maravilhas.

— Não pode fazer isso em público, Brad!

— Claro que posso. Quero que todos saibam que você é minha namorada.

A declaração era ingênua, juvenil, e a fez adorá-lo ainda mais.

A tarde, no torneio de pesca, Samantha e Brad dividiram um barco no lago. Brad era um cavalheiro: retirava do anzol os peixes que ela pescava, porque ela não queria saber de tocar naqueles corpos escorregadios. Brad sorriu maliciosamente quando ela falou que estava se guardando para o peixe gigante.

Voltaram para o trailer para trocarem de roupa para o jantar. Samantha conteve a respiração quando Brad abriu a sacola de compras para espiar.

— O que é isso?

— Nada demais. Só uma camisa e umas calças. Fiz umas compras de manhã. Espero que sirvam.

— Obrigado — disse ele, num tom tímido, enquanto fitava a camisa azul de tiras finas e as calças azul-marinho. — Muito obrigado.

Fitou-a com tal intensidade que Samantha estremeceu.

— Suas botas pretas não vão combinar — falou ela, lembrando-se do horror de Jack quando as roupas não combinavam. — Achei que a cor azul iria ressaltar o seu bronzeado e os cabelos escuros. Você sempre usa preto e...

— Uso preto porque combina com tudo e não tinha uma mulher para cuidar de mim e querer que eu ande na moda.

— Você precisa de umas roupas novas, Brad — falou, em tom de defesa. — Remendos com linha de pesca não ficam bem em você.

— Então você se importa comigo.

Havia um tom de triunfo em sua voz que a fez encará-lo com preocupação e recuar um passo.

— Você quer me manter aquecido no inverno, arrumar minhas roupas, cuidar que eu esteja alimentado e feliz e quer criar o meu filho. Você quer formar um lar e ser minha esposa.

— Está levando muito longe as suas deduções, Brad. Brad jogou a sacola em cima da mesa e puxou-a para si. Samantha deixou de respirar ao perceber que ele já estava em ereção.

— É que pensei que... se você usou minhas roupas hoje... e teve tempo de fazer compras... então talvez isso indique que você me queria junto a si o dia todo. Essa idéia me encoraja e... me excita. Já que comprou roupas para mim, vai ter de me vestir — ordenou, arrogante.

— Nem em sonhos... — iniciou, parando no exato instante em que a boca de Brad encontrou-lhe o seio. Então apertou-lhe a cabeça contra si com fúria e gritou de prazer.

Brad a puxou contra si.

— Vai ter até de me fechar a braguilha — afirmou.

— Não tenho medo — respondeu ela, mostrando-se mais ousada do que se sentia.

Brad beijou-a outra vez, e Samantha retribuiu. Q impacto de seu corpo contra o dele empurrou-o contra o closet. Brad agarrou-lhe a parte de trás do pescoço com dedos firmes e delicados e a manteve imóvel enquanto a fitava.

— Sempre compra roupas para os namorados? — perguntou, como se a resposta dela lhe fosse mais vital do que o ar que respirava.

Samantha sacudiu a cabeça.

— Só bonés — respondeu.

— Ótimo! — exclamou, satisfeito. — Do seu ex-marido eu nem quero saber.

Samantha agarrou-o pela camiseta e o encarou.

—Mas vai ter de saber. Nunca comprei roupas para Jack. Ele não confiava em mim. Eu... nunca contei isso a ninguém.

Os olhos dele se iluminaram por baixo das pestanas, incendiando-a com seu calor. Então ele a beijou ávida e possessivamente, não lhe deixando escapatória... Samantha se entregou com toda a paixão.

Possuiu-o ali, contra a parede, e Brad a manteve junto a si ao terminarem. Samantha se perguntou se aquilo era normal. Indagou-se se as mulheres atacam os homens, possuindo-os com violência e gritando alto. Já sabia que nem todos os homens reagiam com igual paixão nem apreciavam a sua força atlética como Brad. Ele parecia maravilhar-se quando ela o agarrava, maravilhar-se com a avidez com que desejava se unir a ele.

— Vou levar você para a cama — sugeriu Brad, em voz rouca.

Samantha se apoiou em Brad, notando que o trailer balançava estranhamente.

— O que é esse terremoto?

Brad esfregou o tórax contra os seios dela, um gesto que lhe dava prazer e que repetia com freqüência.

— Por que o trailer está se inclinando? — perguntou ela, testando o equilíbrio e se afastando um pouco. Brad fitava-a daquele jeito intenso e calmo, como todas as vezes em que falava de amor.

— Porque acho que você me ama, Samantha.

Quando Brad adentrou os limites da cidade de Elegance, no dia seguinte, já era meio-dia. Olhou pelo espelho retrovisor do pick-up. O pick-up amarelo-canário de Samantha ainda o seguia. Forçou os dedos a se firmarem sobre o volante e percebeu que as palmas estavam úmidas.

Olhou para Samantha, respirou fundo e segurou o volante de novo. Passou pela casa dela, sempre observando-a pelo retrovisor. O veículo desacelerou à frente da casa, depois continuou seguindo-o.

Brad acenou para Lúcia, que puxava um carrinho com Carina e uma sacola de produtos do armazém. O rosto dela se iluminou e ela sorriu, levantando o polegar em sinal de positivo e apontando para o pick-up amarelo-canário que o seguia.

Respirou o ar da montanha e avaliou a sua situação até aquele instante: o riso da filha era franco e aberto; Samantha o olhava com um ar intrigado.

Ficou tenso ao passar pelo Sammy's; o pequeno pick-up reduziu novamente a velocidade, mas continuou seguindo-o. Viu quando ela acenou para o pai, ajeitando os óculos sobre o nariz, como se não quisesse perguntas sobre qual era o seu destino.

Brad apertou o volante com força. O destino dela estava nas mãos de Brad Remington.

Acelerou, com o estômago apertado de medo de que Samantha resolvesse não acompanhá-lo. Por fim, estacionou o pick-up e o trailer no passeio da casa que acabara de adquirir. Olhou pelo espelho e viu o pick-up amarelo estacionar atrás dele.

— Essa casa foi construída por um arquiteto famoso, que depois acabou resolvendo que não gostava da vida rural e social de Elegance — comentou Samantha, encontrando-o na calçada em frente à casa.

Brad inalou o delicado perfume dela, grato por não estar cheirando a cebolas naquele instante. Fitou o corpo esguio, vestido com as roupas dele, e percebeu como se orgulhava dela...

Samantha se aproximou da casa de madeira ultra-moderna que, assentada sobre uma colina, pairava sobre Elegance. Cercada de pinheiros, abetos e alamos que logo adquiririam as cores amareladas e marrons do outono, a casa parecia estéril e sombria.

Brad colocou a mão sobre o ombro de Samantha e acenou para Jess Hawkins e um pequeno grupo de moradores locais curiosos. Fechou os olhos quando o braço dela deslizou ao redor de sua cintura e ficou ali, com os dedos levemente enganchados em seu cinto.

— Bom, vamos lá — falou ele, dominando o medo e pegando-a no colo.

Carregou-a pelo passeio e subiu os degraus da varanda.

Quando a porta se fechou atrás deles e viram-se cercados por paredes nuas de madeira e uma enorme lareira de pedra, Brad a recolocou em pé vagarosamente.

Ela afastou os cabelos sedosos ruivo-dourados do rosto em brasas e empurrou-o com as palmas.

— A cidade inteira viu isso! Emily Jackson é a maior fofoqueira e vai se encarregar de contar a todos os que perderam o seu grande ato aqui! Sabe o que parecia, Brad Remington? Sabe? Vou lhe contar! Parecia que estava me trazendo aqui para a noite de núpcias...

Samantha parou, levou a mão aos próprios lábios e encarou-o por trás das lentes espessas. Brad tirou-lhe os óculos.

— Não está longe da verdade. O inverno está chegando, querida. Não podemos continuar derrubando o trailer no chão e com certeza não vou morar com você numa casa que você compartilhou com outro homem. Há um quarto lá em cima que servirá perfeitamente para o bebê. Há vários outros quartos para mais crianças, se você quiser. E tem um bem grande aqui em baixo que será perfeito para alojar seu pai quando ele ficar um pouco mais velho. Se Lúcia quiser morar aqui e você concordar, podemos reformá-lo para que ela tenha privacidade.

Ela colocou as mãos na cintura e encarou-o, zangada.

— Não está tornando as coisas fáceis, Brad.

— Nunca disse que tornaria — respondeu ele com uma firmeza que não soou verdadeira para si próprio. Enfiou as mãos trêmulas nos bolsos e preparou-se para perder a mulher que era sua esposa... ao menos em seu coração.

— Ah-ah. — Samantha ajeitou os óculos sobre o nariz. — Bom... Agora eu tenho de ir.

E seguiu em direção à porta.

CAPITULO ONZE

Brad escutou o murmúrio solitário do vento sibilando entre as montanhas e rodopiando em torno de sua nova casa. Era uma mera concha, esperando Samantha para se transformar num lar.

Dali a duas semanas, setembro surgiria detrás das montanhas e a neve cairia nas regiões mais altas. Quando assinara o contrato de compra da casa, imaginara-a em seu colo, junto à lareira... Iria revelar-lhe tudo o que lhe era mais caro, coisas que jamais compartilhara com outra pessoa...

Passou os olhos por sua nova casa sem Samantha. Notou a falta que lhe fazia e o modo como as sombras que sempre o haviam acompanhado haviam ocupado o seu lugar. Fez uma careta para Leroy, que farejava o pequeno fogo à lareira. Observou o fogo, tentando ler o futuro nas chamas. A casa o cercava, imensa, sombria e gelada.

Os músculos tensos de seu maxilar doeram e Brad passou a mão pelo rosto, percebendo que a barba devia estar densa e negra.

— Gótico — resmungou, taciturno, mirando-se no espelho da janela que ia até o chão.

Com as sombras cercando-lhe o rosto e os olhos e a barba sob a luz do fogo, parecia um personagem de um filme de Stephen King.

As luzes de Elegance se estendiam diante dele. A luz do quintal de Samantha se apagou e Brad fechou os olhos, desejando-a, querendo estar com ela.

O colchão do trailer jazia num canto junto à lareira, lembrando-o do calor de Samantha.

Queria tanto viver com ela que estava disposto a ter paciência e tentar de novo. Da próxima vez que a tivesse perto, não cometeria o erro de enrolar a linha cedo demais...

Fechou os olhos. Puxara com muita força e ela fugira da rede, fugira do laço.

Havia um laço que ela jamais poderia negar. Se havia algo de que Brad tinha certeza era de que seu nenê se abrigava no calor do ventre de Samantha.

Engoliu em seco e percebeu que estivera contendo a respiração. Sendo uma mulher generosa e dedicada por natureza, Samantha não iria tirar a criança dele.

Cansado, esgotado, Brad passou as mãos pelo rosto e se apoiou contra a parede, empurrando-a, querendo afastar as sombras e trazer Samantha para perto de si...

Samantha fora atrás dele; por que ele abusara da sorte? Quem pensava que era, estabelecendo regras para um relacionamento entre eles? Por que precisava dizer-lhe que a amava, quando Samantha fora, evidentemente, tão ferida pelo amor?

Atirou-se numa cadeira de armar, cruzou as mãos sobre a barriga e, à luz da lareira, refletiu sobre seus erros. Pegou o telefone recém instalado na prateleira envernizada a seu lado, começou a discar o número de Samantha. Então recolocou o fone no gancho.

— Santo Deus, Brad! Você é mesmo de meter medo em qualquer mulher — resmungou, melancólico. Leroy grunhiu, sonolento, concordando. Brad sacudiu a cabeça. Depois de duas noites de amor com Samantha, fizera outros planos para aquela noite. Arrancou uma camisa que ela havia usado da mala e colocou-a sobre seu peito nu. Um instante depois, passou as mangas ao redor do pescoço.

Aspirou a fragrância dela e acariciou o tecido sobre o peito; levou um punho aos lábios, beijou-o, depois beijou o outro antes de passá-los por trás do pescoço. Alisou o tecido sobre o peito e ansiou pelas curvas de Samantha. Leroy grunhiu em meio ao sono, movendo as patas como se corresse.

— Bah! Não são exatamente esses os pezinhos que eu queria — murmurou Brad, estendendo a mão para puxar o jeans que Samantha usara para o seu colo.

Enrolou as pernas do jeans em torno dos quadris e ficou ali, de olhos fixos na lareira e acariciando o camisa vazia sobre seu peito.

O que o impedia de procurá-la era tão pouco... Precisava dar-lhe tempo para pensar, para decidir o que queria dele...

O telefone tocou e Brad agarrou rápido o fone. O punho cerrou-se em torno da camisa. Rezou para que a chamada fosse de Samantha.

Ouviu um soluço, alguém assoar o nariz e então a voz rouca de Samantha:

— Você tem muito a aprender, bobão.

— Não está querendo dizer que me ama, está? — perguntou ele, tenso, com o pulso acelerado.

Ela ignorou a pergunta, contra-atacando:

— Meus rendados não combinam com essa casa moderna. Brad respirou devagar, metodicamente, controlando a impaciência antes de falar, com serenidade:

— A gente constrói outra.

— A casa não importa, Brad. Sabe disso.

— Sim... Sei o que é que importa. Eu te amo, Samantha. Houve um longo silêncio, uma fungada. Então Samantha falou:

— Tenho que saber que você me quer por mim mesma. Não porque acha que tem a obrigação.

Brad se levantou, segurando o telefone com uma das mãos e mantendo a camisa no punho cerrado.

— Onde quer que passemos a noite? — perguntou, com cautela. — Porque é lá que vou lhe dizer de novo o quanto eu te amo e te quero.

— Entenda... Não precisa casar comigo, Brad. Encontro você amanhã — falou, antes de desligar. Brad escutou o zumbido do telefone por um longo tempo antes de ir para a frente das amplas janelas.

Compreendia que Samantha quisesse refletir naquela noite, mas não ir procurá-la era uma verdadeira agonia.

Samantha engatou a segunda marcha no pick-up, um acontecimento incomum. No assento a seu lado, a cesta com vinho, copos de haste longa e um romântico jantar balançou. Segurou a cesta com a mão firme e estremeceu.

Às oito horas da noite, as ruas de Elegance estavam desertas. Havia planejado a hora exata, dando aos moradores o tempo suficiente para se instalarem à frente dos aparelhos de televisão; não queria se transformar num espetáculo para eles. Seguia para a casa de Brad com os faróis dianteiros apagados.

A luz vermelha piscante de uma viatura surgiu em seu espelho retrovisor, e Samantha estacionou o pick-up no acostamento da estrada. Roy Marshall, de uniforme e empunhando lanterna, cassetete, algemas e um revólver apareceu diante de sua janela aberta.

Samantha, tensa, sorriu para o policial:

-Roy!

— Samantha! Bela noite, não?

Ele espiou dentro da cabina do pick-up e notou a garrafa de vinho saindo para fora da cesta. Sorriu, observando os cabelos dela, enrolados e presos no topo da cabeça, a sombra nos olhos, o batom e o decote do novo vestido vermelho colante. Ela bateu com os sapatos novos... vermelhos, para combinar... no assoalho do carro enquanto Roy tentava adivinhar qual era o seu destino.

— O que é isso? Chapeuzinho Vermelho a caminho da casa do Lobo? — perguntou Roy, dando uma risadinha.

A lanterna do policial descobriu uma mochila no chão do banco ao lado, depois percorreu a parte de trás do pick-up. O veículo estava cheio de roupas, produtos de limpeza, pequenas peças de mobília antiga e diversas caixas, todas bem vedadas. Passou a mão pelo taco de softball e lançou-lhe um outro sorriso, amplo e cheio de dentes como o do gato de Alice no País das Maravilhas.

— Apareça para o café amanhã, Roy. Vou lhe servir uma torta de merengue especial.

—Prefiro de creme de banana — replicou ele. — Aposto que está indo para o castelo daquele arquiteto louco.

Samantha fuzilou-o com os olhos, fazendo-o rir de novo. Ele deu batidinhas no capo da cabina e fez um gesto de cabeça em direção ao "castelo do arquiteto louco". — Não se preocupe com a minha torta amanhã, Sam. Vou pegá-la quando você retornar à ativa.

— O que quer dizer com isso? Roy sacudiu a cabeça.

— Você é uma mulher bonita, Samantha. E Brad é um bom homem. Ele faz os melhores hambúrgueres que já comi... Faça ele ficar aqui. Em todo o caso, quando o encontrar, diga-lhe que tenho uma porquinha que logo, logo vai precisar de um amigo.

— Você está interferindo numa viagem romântica, Roy — declarou, em tom ameaçador. — Espere até chegar sua vez... — Lançou-lhe um olhar ameaçador. — Sou uma ótima casamenteira, Roy: posso lhe arranjar uma verdadeira bruxa.

Por um instante, Roy ficou estático. Então corou e balbuciou:

— Não se esqueça de que Vênus, minha porquinha, tem um período de cio muito curto.

— Você não é nada romântico, Roy Marshall — afirmou, brejeira, dando partida no motor e continuando seu caminho. Viu, pelo espelho retrovisor, a sirene de Roy disparar, em provocação.

Estacionou atrás do pick-up de Brad.

Samantha desconfiou de suas emoções, que ameaçavam transformar-se em pânico.

Brad não era "bonzinho" ou delicado; era másculo, forte e ameaçador, quando queria... um verdadeiro gótico.

Somou os pontos positivos. Brad parecia apreciar a sua disposição atlética. Dera o seu nome à melhor isca que projetara. Dissera que a amava, e sempre falava a verdade. Confiava nele.

Amava-o e confiava nele, corrigiu-se.

Depois de uma noite em claro, lutando contra os travesseiros, quase correndo para ele, ficara em casa o dia todo, remexendo em lembranças que já lhe haviam sido caras e que agora não lhe significavam mais nada sem Brad. Por volta do meio-dia, começara a empacotar o essencial: produtos de limpeza, cobertores, roupas e produtos de toalete. Dobrara os acolchoados da bisavó e colocara-os numa caixa; os livros de receita da mãe e as toalhas e guardanapos de linho irlandês haviam sido guardados numa caixa especial. Arrumara várias de suas queridas antigüidades na traseira do pick-up.

Às três da tarde, correra à loja de roupas e comprara um vestido de derrubar o queixo de qualquer homem, com lingerie combinando, em vermelho vivo. Para ressaltar suas longas pernas, que Brad parecia apreciar muito, escolhera meias até a altura das coxas.

Remexeu-se, inquieta, passando os dedos pelo vestido para ajustar as tiras. Eliminara o sutiã no último minuto, porque este tornava ainda mais sensíveis os seios já palpitantes.

Sacudiu a cabeça e notou que as mechas altas e encaracoladas de seu novo penteado balançavam. Repetiu o gesto. Um homem de verdade teria de apreciar aquele trabalho todo.

Colocou a mão sobre o coração, que batia acelerado, e fitou a casa às escuras. Queria dizer a Brad do jeito mais romântico possível que o amava.

Que sabia que sempre o amara e que aceitava o que o futuro lhe trouxesse... com ele.

Colocou as palmas sobre a pequena vida que estava certa de abrigar dentro de si.

Respirou fundo e preparou-se.

— Prepare-se, Brad Sebastian Remington. Eu vim buscar o que é meu — murmurou, aspirando o perfume fresco e sensual que passara nos locais apropriados de seu corpo.

Levou a mão à caixinha que trazia no bolso. Namorar um homem num jantar com vinho à luz de velas e dizer-lhe que o amava requeria um toque especial. O bom e velho anel de ouro era importante para ela. Queria que Brad usasse aquele presente todos os dias, para lembrar-se de seu amor.

Sorveu o ar frio da noite e pensou no inverno que se aproximava.

Tinha planos para aquele primeiro inverno com Brad. Ele não iria escapar. Como o trailer ficava tão quente que suas soldas quase derretiam quando faziam amor, teriam de fazer um seguro contra incêndio para a casa de madeira.

Saiu do carro. Contornou o pick-up e pegou, com cuidado, a cesta de piquenique; depois colocou a tira da mochila em torno do ombro.

Começou a aproximar-se da casa, dizendo a si própria para ser paciente, para dar a Brad o romance que ele merecia. Teria calma e, quando chegasse o momento certo, se declararia.

Fechou os olhos e bateu à porta de madeira.

Ao bater, a porta se entreabriu. Temendo por ele, Samantha chamou:

— Brad?

Estremeceu, vasculhando o interior da sala deserta, vendo o fogo da lareira se refletindo no piso encerado e nas paredes revestidas. E se Brad houvesse caído das escadas? E se houvesse decidido partir depois de seu telefonema?

— Brad? — chamou, de novo, tomada de pânico.

— Estou aqui — murmurou ele a seu lado, tirando-lhe a mochila e a cesta e depositando-as ao chão.

Quando se endireitou, fitou-a. O rosto parecia tão duro como quando ela o conhecera, as linhas profundamente marcadas. As sombras sob seus olhos eram recentes e apavorantes, revelando o quanto havia sofrido durante aquele dia e aquela noite. Estava vestido com as roupas que lhe dera. A barba negra reluzia sob o fogo da lareira. Samantha explorou-a com a ponta dos dedos, adorando a textura áspera e quente.

— Eu estava cortando lenha no quintal... aliviando um pouco a tensão... quando vi seu pick-up. Não tive tempo de me barbear.

— Está tão bonito — disse ela, com sinceridade, puxando a boca de Brad para a sua. — Não fique nervoso.

Provou seus sonhos nos lábios dele, descobriu a sua avidez e a segurança de seus braços que a enlaçavam devagar, com ternura.

Sorveu o cheiro de sabonete daqueles cabelos e passou os dedos por sua textura úmida. Colou seu corpo ao dele: dois corações agitados batendo juntos. A barba roçava nas faces de Samantha. Ficaram imóveis, abraçados. Aquilo era o bastante no momento, perceber que seu momento estava próximo, que a entrega de seus corações seria renovada à luz da lareira e nos dias e noites de um futuro juntos.

Alisando-lhe as costas, Samantha percebeu como ele estava tenso. Percebeu o quanto a espera lhe custara...

— Estou em casa, Brad Sebastian — declarou, no estilo pomposo e antiquado que ele empregava quando estava emocionado. — Estou em casa.

O corpo rígido de Brad tremeu contra o dela. Por um instante, seus braços a apertaram com força, como se tivesse medo de perdê-la. Samantha fechou os olhos e admirou-se de sua alegria, então recuou um passo e o encarou.

— Você é meu, Brad, e quero lhe dar uma noite de que jamais se esquecerá.

— Então venha — convidou ele, fitando-a, notando as mechas altas sobre sua cabeça. — Você é um peixe muito bonito — elogiou ele, em voz rouca. Ela o corrigiu, passando a língua sobre os lábios para chamar-lhe a atenção:

— Sou um peixe difícil, Brad.

— Um lindo peixe difícil — concordou ele, tocando-lhe a língua com a ponta do dedo.

—Você também não é nada mau — replicou Samantha, inclinando-se para beija-lo

Brad rolou para cima de Samantha, prendendo-a embaixo de si. Segurou-lhe os pulsos e manteve as mãos dela longe de si.

— Fale de novo — exigiu, com a expressão feroz, primitiva, máscula, sob a luz da lareira. O cabelo denso suavizava-lhe os ossos salientes da face e as sombras em torno dos olhos.

Os corpos estavam tão bem encaixados como os corações, que batiam juntos.

— Eu te amo, Brad Remington... Vou te amar com todo o meu ser por toda a eternidade — declarou.

Ele fechou os olhos e estremeceu, soltando-lhe os pulsos. Ela colocou os dedos sobre as faces dele, desmanchando-lhe as rugas da testa.

— É verdade, não é? — perguntou ele, com cautela, desviando os olhos de seu rosto para fitar os corpos unidos sob o fogo da lareira.

— Tão verdade quanto o céu, o vento e as montanhas... Eu te amo...

— Eu te amo, Samantha — murmurou Brad, inclinando-se para beijar as lágrimas de alegria que escorriam pelas faces dela.

— Prove — Samantha o desafiou.

Mas Brad não estava aceitando ordens... Ainda não, pelo menos. Segurou-lhe o rosto entre as mãos, acariciando-o com os polegares.

— Se houver um bebê... e estou certo de que há... ele só irá aprofundar o que já existe entre nós.

— Eu sei. — Samantha ergueu a cabeça para beijá-lo com ternura. Sabia que Brad iria compartilhar a felicidade ou a tristeza em suas vidas; estaria ali ao amanhecer, à luz do dia e à noite. — Eu sei — sussurrou de novo, beijando o anel que reluzia no dedo dele.

— Eu te amo de verdade, Samantha — afirmou Brad, e desceu a boca para encontrar-lhe os cantos sensíveis dos lábios.

Ela engasgou, arqueou-se contra ele, e estremeceu.

— Como sabe que gosto disso?

— Sou pescador — murmurou ele, movendo-se para o outro lado da boca. — Nossos instintos são infalíveis. Têm de ser. Alguns peixes não são tão fáceis de pegar, você sabe. São ariscos e desconfiados e...

—Vou chamá-lo de sr. Folgado — zombou Samantha, com um sorriso amoroso. Então passou a demonstrar novas formas de desafiar as habilidades dele, e Brad parou de falar.

EPÍLOGO

Papai, o pelotão está chegando — gritou Cindy, de quatro anos de idade, subindo em cima da cama. Brad abriu um olho e viu os raios do sol penetrando pela janela do quarto do casal.

Espreguiçou-se, bocejou e envolveu-se no calor de sua vida. Saboreou os cheiros e os ruídos a seu redor. Cada dia era melhor que o anterior, mais excitante, mais cheio de substância e amor.

Deixara para trás a estrada solitária e escura; à frente, apenas o sol. Cindy cutucou-o suavemente, lembrando-o de sua presença.

Chorara quando ela nascera, incapaz de conter a alegria. Samantha levara sua mão aos lábios, beijando-lhe a palma, fitando-o com olhos cheios de amor.

— Papai? — insistiu a criança, com impaciência, sacudindo-o. — Está acordado?

— E o terrível pelotão rosa? — perguntou ele, fingindo medo. No primeiro dia da temporada de pesca, o pelotão rosa vinha pegá-lo. Precisavam dele para tirar os peixes do anzol e limpá-los.

O pelotão rosa não suportava vísceras de peixe. Faziam "argh" e "irrrk" e olhavam para ele com olhos suplicantes. As mais velhas do pelotão rosa, suas irmãs, também nunca haviam gostado daquela parte da pesca.

Cindy, uma menina travessa de quatro anos de idade, riu-se e puxou o lençol para cima da cabeça do pai.

— Vou esconder você, papai — declarou a versão em miniatura de Samantha. Montou inocentemente sobre suas costas e esperou a chegada do pelotão.

— Acho que mamãe não gosta da camisola, porque ela fica tirando — observou Cindy, levantando o lençol para espiar embaixo. — Está usando a camisa do seu pijama, mas deixou as calças para você. Você devia comprar para ela uma camisola que nem a minha, comprida, macia e com porquinhos cor-de-rosa.

Do pé da escada, Leroy guinchou, concordando. Entrara correndo na casa junto com o pelotão.

— Boa idéia — respondeu Brad, recebendo o beijo molhado de Cindy. A menina tirou uma pétala de rosa de sua barba e pegou outra no ombro, estudando-a e franzindo as sobrancelhas.

— Papai, sabe que tem flores por toda a cama de vocês?

— As fadinhas das flores vieram esta noite — respondeu Samantha.

Cindy cobriu a cabeça dele com o lençol de novo e Brad fechou os olhos, lembrando-se da silhueta de Samantha em seu novo negligée.

Por baixo do lençol, Brad aguardou o pelotão. Cindy se remexia, impaciente, montada em suas costas.

— Não se preocupe, papai — sussurrou, em tom cons-piratório. — Vou esconder você, e aí você pode me ajudar a pegar aquele peixe gigante... Porque eu sou a sua peixinha favorita — declarou, com firmeza, citando o modo carinhoso como ele a chamava.

Brad sentiu o cheiro da esposa nos travesseiros e estendeu a mão sobre o calor que ela deixara no lugar agora vazio. Compartilhando suas vidas e as crianças, os dias bons e ruins, seu amor aumentara a cada minuto.

A família estava aumentando... Havia Lúcia, que se transformara numa mulher forte e vibrante. Estava cursando a faculdade agora e Carina estava no primeiro ano do primeiro grau. Lúcia fizera as pazes com seu passado e reconhecera com tristeza os danos causados pela mãe. Aproximava-se cada vez mais do pai e, recentemente, mudara seu nome para Remington.

Havia Heather, abandonada aos seis anos e começando a amar sua família adotiva... Joey, de cinco, abandonada pela mãe por ser surda... Mary Lynn, que vivera em orfanatos até eles a adotarem, aos dez anos... Haviam adotado recentemente mais duas meninas, Sylvia e Vanessa, de oito anos de idade.

Cindy se remexeu de novo e Brad deu-lhe uma batidinha no bumbum. Samantha atravessara a gravidez com a impaciência que lhe era característica. Com altivez e autoridade, além de muito amor, comandava o pelotão rosa.

Brad adorava, sobretudo, os momentos em que escapavam para a privacidade do trailer, em algum recanto oculto, em meio ao bosque de pinheiros. Nesses momentos, e quando faziam juntos alguma viagem curta, o pai de Samantha ou Lúcia ficava tomando conta da turma. A nova equipe Remington de softball, toda feminina, já ganhava reputação. Os ex-namorados de Samantha, que ajudavam, tinham muito trabalho com as atléticas menininhas.

O Catálogo das Iscas Remington exibia toda uma série de novas iscas com os nomes das filhas, especialmente projetadas por Brad.

Reconheceu a fragrância da mulher a quem amava, sua esposa, Samantha. Sentiu o peso baixar o colchão a seu lado e estendeu a mão para contornar-lhe as curvas cobertas pelo robe. Os dedos dela se juntaram aos seus, entrelaçando-se como suas vidas.

— Quero um beijo — sussurrou ele, em tom dramático.

— Sh! Estamos escondendo você. O pelotão rosa está vasculhando a casa. Leroy é o batedor.

— Grr! — fez ele, imitando sons e rugidos famintos que excitavam Samantha, especialmente quando ele os fazia junto ao seu pescoço.

— Vão começar de novo com esses beijinhos? — perguntou Cindy, impaciente, vendo-os abraçados.

— Te amo — murmurou ele, esfregando o nariz ao dela.

— Eu também — Samantha teve tempo de responder antes que o pelotão rosa invadisse o quarto e se atirasse sobre a cama, dando risadas.

Brad se rendeu, apoiando-se nos travesseiros e nas pétalas de rosa; fez o possível para retribuir aos beijos apressados que as meninas espalharam por todo o seu rosto. Então sorriu para Samantha e piscou:

— Sabe de uma coisa? Estou com vontade de pescar hoje.

— Você é mesmo o sr. Folgado — disse ela, com afeto, segurando a mão que ele lhe estendera.

* * *

CAIT LONDON mora no Estado de Missouri, mas todo verão gosta de viajar para as trilhas de ouro e gado do noroeste dos EUA. Adora viagens de pesquisa, conhecer pessoas e assistir a danças dos nativos americanos. A sra. London é uma ávida leitora. Gosta de pintar, brincar com computadores e cultivar plantas (especialmente gerânios, nos últimos tempos). E autora de best sellers, escritora premiada de romances de "amor e risos", e escreve romances históricos com outro pseudônimo. Três é o seu número da sorte; tem três filhas e os acontecimentos de sua vida sempre vêm de três em três. "Adoro escrever", afirma. "O melhor de todo o trabalho é a sensação calorosa de estar dando aos leitores um presente capaz de diverti-los".

Cait London Forasteiro Sonhador



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